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ATUALIDADE

"Tese da descriminalização da maconha se baseia no direito à intimidade", diz advogado criminalista

28 junho 2024 - 10h30 Por Carlos Guilherme

"A tese da descriminalização da maconha baseia-se no direito à intimidade, previsto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, e na questão da auto lesão, segundo a qual ninguém pode ser punido por se autolesionar", afirmou o advogado criminalista Benedito Figueiredo em entrevista ao Giro Estadual de Notícias na manhã desta sexta-feira (28). Ele destaca que essa fundamentação foi crucial na recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que descreve como um avanço significativo para os direitos individuais no Brasil.

Figueiredo explicou que o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, inicialmente defendeu a descriminalização de todas as drogas, mas depois ajustou sua posição, focando apenas na maconha. "Esse julgamento começou em 2015 e foi retomado em 2023, quando Gilmar Mendes reafirmou sua posição pela descriminalização da maconha. Seu voto foi seguido por outros ministros, formando uma maioria no STF", explicou o advogado.

No entanto, o advogado aponta que a decisão do STF enfrenta resistência significativa do Parlamento, que agora é majoritariamente conservador. "A PEC 45 busca incluir um inciso na Constituição Federal, criminalizando explicitamente o uso de drogas. Isso é uma tentativa de frear a decisão do STF, que se baseia no direito à intimidade e na não punição por auto lesão", disse Figueiredo.

Ele destacou que a proposta de criminalização traz consigo consequências sociais e jurídicas profundas. "Apesar de não prever prisão por posse de drogas, uma pessoa condenada por posse de drogas fica com antecedentes criminais, o que pode ter consequências severas para jovens que estão começando suas vidas", afirmou. "Um jovem de 18 anos que seja pego com um cigarro de maconha pode ser fichado como usuário, comprometendo seu futuro. Lembrando, que a descriminalização não é a mesma coisa que legalização", aponta.

Figueiredo também comentou sobre as possíveis implicações de definir quantidades específicas de maconha para uso pessoal. "A sugestão do ministro Barroso de considerar a posse de 25 a 60 gramas de maconha para uso pessoal e permitir o cultivo de até seis plantas fêmeas gerou divergências. Essa medida pode incentivar traficantes a utilizarem 'aviõezinhos' que carreguem pequenas quantidades, aumentando o número de pessoas vendendo pequenas porções de drogas", alertou.

O advogado criminalista, Benedicto Figueiredo em entrevista ao Giro Estadual de Notícias - (Foto: Lorena Sone)

A subjetividade na interpretação policial sobre quem é usuário e quem é traficante é outra preocupação destacada por Figueiredo. "A partir do momento em que o Poder Judiciário autoriza a posse de uma pequena quantidade de maconha, considerada uma droga recreativa, isso traz consequências sociais significativas. As pessoas podem interpretar essa decisão como uma aceitação social do uso da maconha. Isso cria um paradoxo, pois enquanto o Estado reprime o tráfico de drogas, permite que o usuário possua pequenas quantidades. Isso gera um ciclo vicioso, pois o usuário terá que adquirir a maconha de um traficante", revela.

A decisão do STF tem efeitos amplos e imediatos. "Aqueles que foram condenados por pequenas porções de maconha e têm ficha criminal podem buscar a revisão criminal para retirar a condenação", destacou Figueiredo.

No entanto, ele alertou que a aprovação da PEC 45 poderia complicar essa situação. "Se a PEC for aprovada, ela incluirá o artigo 5º, inciso 80, criminalizando a posse de drogas, o que pode entrar em conflito com o direito à intimidade, uma cláusula pétrea da Constituição", explicou.

"Aqueles que foram condenados por pequenas porções de maconha e têm ficha criminal podem buscar a revisão criminal para retirar a condenação, uma vez que o STF pode considerar que a posse de pequenas quantidades de maconha não é mais crime", opina.

A complexidade legal é significativa. "A decisão do STF prevalece por enquanto, mas o tribunal pode ser desafiado a equilibrar a interpretação das garantias constitucionais com a nova legislação proposta. Se a PEC 45 for contestada, será um desafio jurídico notável para o STF", afirmou Figueiredo.

Para o profissional, a questão é se o STF manterá sua decisão atual ou reverterá em um julgamento de inconstitucionalidade da PEC. Isso poderá colocar o tribunal em uma posição complexa, onde terá que equilibrar a interpretação das garantias constitucionais com a nova legislação proposta.

"Por enquanto, a decisão do STF é o que prevalece. Esta decisão, embora não seja uma lei, tem base em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). A ADI foi proposta pela Defensoria Pública de São Paulo em 2015 no Recurso Extraordinário, que trouxe o caso à atenção do STF. A decisão do STF tem efeito erga omnes, ou seja, aplica-se a todos, e é um ato processual legítimo conforme a Constituição Federal. Portanto, é incorreto afirmar que o STF está legislando; ele está julgando dentro de suas competências constitucionais", diz.

O advogado concluiu ressaltando a importância de agir agora. "Partidos políticos ou outras entidades que desejam contestar a PEC 45 devem agir antes que a emenda seja incorporada à Constituição. Uma vez que a PEC 45 seja aprovada e se torne parte do artigo 5º, contestá-la será muito mais complexo", alertou, sublinhando o potencial impacto jurídico significativo dessa proposta.

Entenda - Após nove anos de sucessivas interrupções, por 6 votos a 3, o STF finalizou na quarta-feira o julgamento que descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal e fixou a quantia de 40 gramas para diferenciar usuários de traficantes.

Com a decisão, não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo até 40 gramas de maconha para consumo pessoal. A decisão deverá ser aplicada em todo o país após a publicação da ata do julgamento, que deve ocorrer nos próximos dias.

A decisão do Supremo não legaliza o porte de maconha. O porte para uso pessoal continua como comportamento ilícito, ou seja, permanece proibido fumar a droga em local público, mas as consequências passam a ter natureza administrativa e não criminal. 

O Supremo julgou a constitucionalidade do Artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). Para diferenciar usuários e traficantes, a norma prevê penas alternativas de prestação de serviços à comunidade, advertência sobre os efeitos das drogas e comparecimento obrigatório a curso educativo.

A lei deixou de prever a pena de prisão, mas manteve a criminalização. Dessa forma, antes da decisão da Corte, usuários de drogas eram alvos de inquérito policial e processos judiciais que buscavam a condenação para o cumprimento dessas penas alternativas.

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