À frente da Superintendência Regional do Trabalho em Mato Grosso do Sul, o advogado trabalhista Alexandre Cantero não mede palavras: combater a informalidade, o trabalho análogo à escravidão e o trabalho infantil é a prioridade absoluta de sua gestão.
“Assim, enfrentamos três frentes prioritárias: combate à informalidade, erradicação do trabalho escravo e eliminação do trabalho infantil — com atenção especial às áreas mais vulneráveis e com políticas que promovam a inclusão social e produtiva.”
Segundo ele, essas práticas ilegais perpetuam ciclos de exclusão e afetam não apenas os trabalhadores diretamente envolvidos, mas toda a sociedade e a economia como um todo.
Informalidade: um risco para todos - A informalidade ainda é uma realidade forte em Mato Grosso do Sul, principalmente nas regiões do interior, e preocupa o superintendente pelos prejuízos que causa ao trabalhador, às empresas e ao Estado.
“Temos uma preocupação muito séria com a informalidade, que traz prejuízos para todos os envolvidos. Para as empresas, ela representa um risco de passivo trabalhista futuro — ou seja, um ganho financeiro momentâneo que pode se tornar um problema grave. Para o trabalhador, significa total desproteção social, sem acesso a direitos básicos como previdência, auxílio-doença ou aposentadoria.”
“Essa desproteção também afeta toda a sociedade. Quando um trabalhador informal sofre um acidente, adoece ou enfrenta qualquer infortúnio, quem acaba arcando com os custos é o sistema público — porque não houve contribuição à Previdência Social. Portanto, a informalidade tem um impacto coletivo que vai além das relações entre empregado e empregador.”
A esperança, segundo Cantero, está na interiorização da agroindústria, que pode promover mais formalização com vínculos regulares e condições de trabalho adequadas.
“No Mato Grosso do Sul, essa prática ainda é bastante comum e se distribui de forma relativamente uniforme pelo Estado, embora seja mais evidente no interior. Acreditamos, contudo, que a chegada da agroindústria a essas regiões pode ajudar a transformar essa cultura, promovendo mais formalização e oportunidades com vínculos regulares.”
Trabalho escravo contemporâneo ainda resiste - Apesar dos avanços no setor produtivo e no desenvolvimento regional, o trabalho análogo à escravidão ainda persiste em áreas remotas, especialmente envolvendo indígenas e migrantes internacionais.
“A inspeção fiscal no Mato Grosso do Sul tem uma trajetória pioneira no combate ao trabalho análogo à escravidão. Há 30 anos, foi criada a unidade móvel de fiscalização, que completou três décadas de atuação agora em maio. Essa unidade percorre diversas regiões do Estado com o objetivo de enfrentar essa grave violação de direitos humanos, que infelizmente ainda persiste.”
“Grande parte das pessoas resgatadas dessas situações são estrangeiros ou indígenas, grupos frequentemente mais vulneráveis. Costumo dizer, que essa realidade não condiz com a pujança do agronegócio e da agroindústria, que têm se expandido fortemente no Estado. Tampouco se alinha à perspectiva promissora da rota oceânica, que projeta ainda mais desenvolvimento para a região.”
A fiscalização, aliada a ações de acolhimento e reinserção no mercado de trabalho, é uma das armas mais eficazes para romper com esse ciclo de exploração.
“Nesse contexto de crescimento, é inaceitável que ainda existam pessoas submetidas a condições análogas à escravidão. Nosso papel é erradicar essa chaga social e promover a transição dessas pessoas para o mercado formal de trabalho, contribuindo com um modelo de desenvolvimento mais justo e sustentável. A unidade móvel é uma ferramenta essencial nesse processo, garantindo direitos e fortalecendo a cidadania.”
Trabalho infantil: proteger a infância é garantir o futuro - Outro ponto sensível apontado por Cantero é o trabalho infantil, frequentemente mal interpretado pela sociedade. Segundo ele, proibir o trabalho de crianças e adolescentes não significa impedir o aprendizado de responsabilidade, mas garantir direitos fundamentais.
“Outro desafio sério é a persistência de situações de trabalho análogo à escravidão, especialmente em áreas remotas, além da exploração do trabalho infantil. Este último é frequentemente mal compreendido. O senso comum às vezes interpreta a proibição do trabalho infantil como uma tentativa de impedir que a criança desenvolva responsabilidade. Mas essa não é a preocupação do Estado.”
“O foco da atuação pública é proteger as crianças de formas de trabalho que comprometam seu direito à educação, saúde e desenvolvimento. Trabalhos que privam as crianças da escola, afetam sua saúde física e emocional, e limitam suas perspectivas de futuro são inaceitáveis. Em casos extremos, colocam até a vida da criança em risco.”
Para o superintendente, é fundamental que a sociedade compreenda que a infância precisa ser protegida e que políticas públicas sejam estruturadas com foco na educação e no desenvolvimento humano.
O cumprimento das leis trabalhistas vai além de uma obrigação moral: é uma exigência econômica e estratégica, especialmente diante dos compromissos internacionais do Brasil com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
“Um dos ODS mais relevantes nesse contexto é o ODS 8, que trata da promoção do trabalho decente. Quando há a identificação de trabalho em condições análogas à escravidão na cadeia produtiva — especialmente em setores como o da carne — isso pode resultar no fechamento de mercados e restrições à exportação. Portanto, cumprir a legislação trabalhista vai além de uma obrigação moral ou legal: é também uma exigência econômica e comercial.”
“Estamos no século XXI, e não é aceitável que ainda se discuta a importância da proteção social como se fosse algo secundário. A questão do trabalho digno é, sim, um tema de direitos humanos, mas também de competitividade. O cumprimento das leis trabalhistas abre portas para os negócios internacionais, fortalece a reputação das empresas e atrai investidores.”
Um Brasil mais justo é possível - Cantero acredita que o Brasil tem avançado, mas reforça que o enfrentamento dessas práticas exige políticas sérias, ações integradas e empatia coletiva.
“Acredito que o Brasil já avançou bastante em diversas áreas, especialmente no que diz respeito à inclusão social e à promoção dos direitos humanos. Um exemplo disso é o projeto da Sala do Migrante, que tive a oportunidade de apresentar no Congresso Latino-Americano de Direito do Trabalho, realizado em Córdoba, na Argentina.”
“Com todos os seus problemas, o Brasil tem algo muito especial: resiliência e empatia. Temos uma capacidade única de acolher o outro. E posso dizer com orgulho que o Mato Grosso do Sul é um verdadeiro exemplo disso. [...] Essa diversidade cultural é a nossa maior riqueza. [...] Precisamos sempre olhar para o futuro com esperança e agir, cada um de nós, para construir um país e um mundo melhores — com inclusão, dignidade e respeito.”
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