Em entrevista ao Giro Estadual de Notícias nesta quarta-feira (25), a presidente da Associação Brasileira de Medicina de Emergência (Abramede), Camila Lunardi, trouxe uma análise preocupante sobre o aumento dos casos de suicídio no Brasil. Segundo a médica, o fenômeno vem afetando todas as faixas etárias, e as razões são multifatoriais. Ela também abordou o papel dos médicos emergencistas no atendimento dessas tentativas, destacando a importância de um acolhimento empático e sem julgamento.
"Nos últimos anos, houve claramente um aumento, que é multifatorial. Provavelmente, a exposição na mídia e as comparações que os jovens fazem constantemente com uma vida muitas vezes imaginária, que não corresponde à realidade vivida, são fatores que contribuem", afirmou. Camila também chamou a atenção para a amplitude etária do problema, que não se restringe aos jovens. "Estamos vendo esse aumento em todas as faixas etárias, inclusive entre pessoas mais novas, que enfrentam situações de bullying e mal-estar na escola. Além disso, há um aumento na população idosa, que muitas vezes se sente mais deprimida, especialmente após a pandemia, quando o isolamento se intensificou."
Desafios no atendimento emergencial - Camila Lunardi ressaltou que os médicos emergencistas são, na maioria das vezes, acionados quando o paciente já realizou uma tentativa de suicídio, e não na fase de prevenção. "O contato que temos com o paciente ocorre quando ele já tentou o autoextermínio. Não participamos dessa fase anterior de conhecimento ou reconhecimento dos sinais. Quando o paciente chega até nós, ele já tentou a autolesão", explicou.
Camila Lunardi é a presidente da Abramede
Nesse momento crítico, a função dos médicos é minimizar os danos e impedir que o pior aconteça. "O nosso papel, como médicos emergencistas, é minimizar ao máximo os danos e evitar que o pior aconteça naquele momento", afirmou a presidente da Abramede. Entretanto, ela também ressaltou que o acolhimento emocional é tão importante quanto o atendimento físico. "Quando o paciente chega a esse ponto extremo de atentar contra a própria vida, ele precisa ser acolhido."
Além disso, Camila apontou para a necessidade de identificar se o paciente ainda apresenta ideação suicida ou risco de uma nova tentativa, para que seja encaminhado rapidamente a um tratamento especializado. "O médico de emergência precisa identificar se o paciente ainda apresenta ideação suicida ou risco de tentar novamente, e, se for o caso, encaminhá-lo rapidamente para tratamento psiquiátrico ou psicológico."
Outro ponto crucial levantado pela médica foi a postura que os profissionais de saúde devem adotar ao lidar com pacientes que tentaram o suicídio. Para ela, o julgamento deve ser completamente excluído do atendimento médico, que precisa ser focado em acolher e tratar a pessoa com o mesmo cuidado que se tem com outras doenças graves.
"O mais importante que o médico precisa aprender é o não julgamento. É essencial tratar o paciente como alguém doente, muitas vezes com uma condição até mais grave do que outras já conhecidas, como um hipertenso que não segue o tratamento adequado", comentou. Lunardi reforçou que o tratamento físico inicial é crucial, mas as causas que levaram à tentativa serão tratadas posteriormente por psiquiatras. "O foco inicial é tratar a situação física, enquanto as causas que levaram a isso serão avaliadas posteriormente pelo psiquiatra."
Em casos mais raros, quando o paciente ainda não realizou a tentativa de suicídio, mas está em situação de risco, como uma ameaça de autolesão com arma de fogo, faca ou em cima de uma ponte, o médico emergencista pode ser acionado para tentar evitar o pior. "Nesses momentos, o médico precisa demonstrar acolhimento e empatia para tentar evitar que o pior aconteça", explicou Lunardi. Embora essa não seja a rotina mais comum no atendimento emergencial, essas situações exigem uma abordagem muito sensível e humanizada por parte dos profissionais de saúde.
Ela ainda destacou a importância da medicina de emergência nesse cenário, apontando para a necessidade de treinamento constante dos profissionais para que saibam como agir com rapidez e eficiência nesses casos delicados.
O papel da formação no enfrentamento ao suicídio - Camila Lunardi também comentou sobre a importância de eventos e congressos na preparação dos profissionais de saúde para atender emergências, incluindo as tentativas de suicídio. Segundo ela, o congresso da Abramede, que ocorreu recentemente, foi crucial para capacitar médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos e assistentes sociais.
"Ontem foi o dia pré-congresso, com cursos específicos que duraram o dia todo, abordando temas como entubação, ultrassonografia para diagnóstico em sala de emergência e gestão em medicina de emergência", disse. O evento incluiu palestras sobre emergências em diversas especialidades, como clínica, cirurgia, psiquiatria e pediatria. "A medicina de emergência envolve todas as especialidades relacionadas ao paciente grave", explicou a médica.
Ela ainda destacou a interiorização do conhecimento da medicina de emergência, que antes se concentrava em grandes centros, como São Paulo e as regiões litorâneas, e agora está sendo levado para áreas mais distantes, onde o conceito ainda é pouco difundido. "Agora, há uma preocupação em interiorizar esse conhecimento, levando para estados onde muitas vezes é preciso até explicar o que é a medicina de emergência, já que ainda é uma especialidade nova e em crescimento."
Projetos contínuos e prevenção ao longo do ano - A Abramede também mantém diversos projetos e comissões dedicados a áreas específicas da medicina de emergência, como trauma, cardiologia e emergências psiquiátricas. "Estamos também com projetos voltados para toxicologia, pois o médico emergencista lida diretamente com pacientes que sofrem qualquer tipo de intoxicação, não apenas as tentativas de suicídio, mas também as intoxicações involuntárias", explicou Lunardi.
Esses esforços são importantes, especialmente em regiões do interior do Brasil, onde a população lida com altos índices de intoxicação agrícola e acidentes domésticos envolvendo agrotóxicos e plantas. "Em áreas do interior, por exemplo, temos muitos casos de intoxicação agrícola, além de intoxicações acidentais com plantas e agrotóxicos, principalmente em crianças", pontuou.
Para Lunardi, o trabalho de prevenção e capacitação deve ser contínuo, com foco na saúde mental e em intervenções emergenciais. "Esse esforço de prevenção continua ao longo do ano", concluiu a presidente da Abramede.
O tema está sendo discutido no Congresso Brasileiro de Medicina de Emergência (CBMEDE 2024), que está acontecendo em Campo Grande entre os dias 24 e 29 de setembro, no Centro de Convenções Arquiteto Rubens Gil de Camillo.
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