Redação O Estado de S. Paulo | 29 de dezembro de 2025 - 07h40

Brigitte Bardot deixa legado de ousadia e controvérsia

Atriz francesa marcou gerações com papéis libertários, ativismo pela causa animal e uma trajetória cercada de controvérsias

LUTO
Brigitte Bardot, um dos maiores ícones do cinema mundial, morreu aos 91 anos. - Foto: Divulgação

Brigitte Bardot, um dos maiores ícones do cinema do século 20, morreu neste sábado, 28, aos 91 anos. A informação foi confirmada pela Fundação Brigitte Bardot à imprensa francesa. Nos últimos meses, a atriz enfrentava problemas de saúde e esteve internada em novembro em um hospital de Toulon, no sul da França, onde passou por uma cirurgia.

Nascida em Paris, em 28 de setembro de 1934, Brigitte Anne-Marie Bardot tornou-se símbolo internacional de glamour, sensualidade e libertação feminina a partir da década de 1950. Sua imagem redefiniu padrões estéticos e comportamentais no cinema, especialmente ao interpretar personagens femininas independentes, intensas e desafiadoras das convenções morais da época.

Criada em uma família conservadora da alta burguesia francesa, Bardot teve educação rígida e católica. Iniciou-se ainda criança no balé clássico e, aos 15 anos, chamou atenção ao estampar a capa da revista Elle. Foi nesse contexto que conheceu o jovem cineasta Roger Vadim, responsável por impulsionar sua carreira e com quem se casou em 1952, pouco após completar 18 anos.

A estreia no cinema ocorreu em 1952, no filme Le Trou Normand, experiência que ela própria descreveu como difícil, marcada por críticas à sua inexperiência. A virada veio quatro anos depois, com E Deus Criou a Mulher (1956), dirigido por Vadim. No papel de Juliette, uma jovem de comportamento sexual livre, Bardot protagonizou um dos maiores choques culturais do cinema da época.

O filme foi condenado pela Igreja Católica, sofreu cortes por censura e enfrentou resistência nos Estados Unidos por violar os padrões do Código Hays. Ainda assim, tornou-se um enorme sucesso comercial e crítico, projetando Bardot como estrela mundial. A imagem da atriz dançando descalça sobre uma mesa permanece como uma das cenas mais icônicas e sensuais da história do cinema.

As frequentes aparições usando biquíni ajudaram a transformar a peça em símbolo de rebeldia e glamour, influenciando moda, comportamento e a percepção da mulher no audiovisual.

Ao longo de uma carreira meteórica, Brigitte Bardot atuou em mais de 40 filmes. Entre os títulos mais marcantes estão A Verdade (1960), indicado ao Oscar; Vida Privada (1962); O Desprezo (1963), de Jean-Luc Godard; e Viva Maria! (1965). Contracenou com nomes como Alain Delon, Jeanne Moreau e Marcello Mastroianni, consolidando-se como uma das grandes musas do cinema europeu.

Apesar do sucesso, Bardot decidiu abandonar a atuação em 1973, aos 39 anos, no auge da fama. Desiludida com a exposição constante, a objetificação e a perseguição da imprensa, optou por uma vida mais reclusa, longe dos holofotes.

Ativismo e nova fase
Após deixar o cinema, passou a se dedicar integralmente à defesa da causa animal. Em 1986, fundou a Fundação Brigitte Bardot, voltada à proteção dos animais. Tornou-se uma ativista reconhecida internacionalmente, engajando-se contra a caça de focas e baleias, testes laboratoriais, uso de peles, touradas e rinhas de cães.

Essa fase reforçou sua imagem pública, agora associada à militância ambiental e ao ativismo radical em defesa dos animais, área à qual se dedicou até o fim da vida.

A partir dos anos 2000, no entanto, Bardot passou a se envolver em diversas controvérsias. Em livros e entrevistas, manifestou opiniões conservadoras sobre imigração, identidade cultural e diversidade. Em 2003, lançou Un Cri dans le Silence, obra que gerou críticas por declarações consideradas racistas e homofóbicas.

Ao longo das décadas seguintes, foi alvo de vários processos judiciais por injúria racial e incitação ao ódio. Em 2021, foi condenada por um tribunal francês a pagar multa de 20 mil euros após declarações ofensivas contra moradores de uma ilha francesa.

Em 2018, durante o auge do movimento Me Too, também causou repercussão negativa ao minimizar denúncias de assédio sexual feitas por atrizes, classificando-as como exageradas.

Entre luzes e sombras, Brigitte Bardot construiu uma trajetória marcada por contrastes. Musa do cinema, símbolo de liberdade feminina, ativista da causa animal e figura pública controversa, deixa um legado complexo, mas incontestável, que atravessa gerações e continua a provocar debates sobre arte, comportamento e sociedade.

Ícone do cinema, símbolo do glamour e da libertação feminina, ativista da causa animal, Brigitte Bardot morreu ontem, dia 28, aos 91 anos. Polêmica em seus últimos anos, a atriz esteve internada em novembro em um hospital em Toulon, no sul da França, e passou por uma cirurgia. A informação foi confirmada à imprensa francesa pela Fundação Brigitte Bardot.

Nascida em Paris, na França, em 28 de setembro de 1934, Brigitte Anne-Marie Bardot ficou conhecida por se tornar um dos maiores ícones culturais do século 20. Sua beleza ajudou a redefinir os padrões de estética e visão feminina no cinema a partir da década de 1950, quando se tornou um símbolo da mulher moderna por normalmente interpretar personagens emancipadas, libertárias e incontroláveis.

Brigitte foi iniciada no mundo das artes cedo. Filha de um industrial da alta burguesia francesa e de uma ex-artista frustrada que passou anos tentando se tornar uma bailarina, ela teve educação rigorosa e católica na juventude, criada em uma família conservadora e rígida.

Começou a fazer aulas de balé clássico ainda na infância, e aos 15 anos foi contratada pela revista francesa Elle para ser modelo de uma coleção juvenil. A capa chamou a atenção do então jovem cineasta Roger Vadim, de 22 anos, que imediatamente se apaixonou por ela e provocou seu interesse na carreira de atriz. Alguns anos mais tarde, meses após ela completar 18 anos, em 1952, ela e Vadim se casaram. A união, que durou cinco anos, deu origem ao filme que projetou Bardot ao cinema mundial e transformou sua história radicalmente: E Deus Criou a Mulher (1956).

Seu primeiro projeto como atriz, no entanto, veio quando um amigo de seu pai a indicou para uma comédia em que ela poderia ter um papel de destaque. O longa, Le Trou Normand (1952), se tornou uma lembrança amarga, já que sua falta de experiência foi motivo de zombaria entre as equipes de produção. Mesmo assim, ela continuou tentando novos trabalhos, e aos poucos começou a chamar atenção da sociedade e da imprensa da época.

Descontente com o pouco sucesso dos primeiros filmes da esposa, Vadim a escalou para o papel principal de sua nova produção, um flerte com a então insurgente nouvelle vague. Em E Deus Criou a Mulher, Bardot interpreta Juliette, uma adolescente com desejos sexuais à flor da pele e que chama a atenção de todos os tipos de homens ao seu redor. Considerado escandaloso pela abordagem dos temas sexuais, o filme chegou a ser condenado pela Igreja Católica e ter cópias censuradas para atender aos padrões do Código Hays.

As aparições frequentes da atriz usando biquíni em seus primeiros filmes, aliás, são consideradas parte instrumental para a transformação da vestimenta em símbolo de glamour e rebelião. Quando chegou às telas nos Estados Unidos, apesar do choque inicial, o filme foi um estouro de receita. Uma das cenas do longa, em que Brigitte dança descalça sobre uma mesa, é referenciada até hoje entre as mais sensuais da história do cinema.

No ano seguinte ao lançamento do filme, em 1957, ela e Vadim se separaram. Mais tarde, em 1959, casou-se com o segundo marido, Jacques Charrier, com quem teve seu único filho, Nicolas-Jacques Charrier, uma criança que ela não queria e da qual não teve custódia. Mais tarde, casou-se com o alemão Gunter Sachs, uma união que durou de 1966 a 1969.

Livre do moralismo velado natural às estrelas do cinema americano, a nova sensação francesa chamava atenção pela aparente liberdade natural com que se portava. Durante sua carreira meteórica, atuou em mais de 40 filmes, incluindo clássicos como A Verdade (1960), indicado ao Oscar; Vida Privada (1962); O Desprezo (1963), de Jean-Luc Godard; e a comédia de faroeste Viva Maria! (1965). Atuou ao lado de nomes como Alain Delon, Jeanne Moreau e Marcello Mastroianni.

Brigitte Bardot decidiu se retirar das telas no auge do sucesso, em 1973, aos 39 anos, após atuar em Se Don Juan Fosse Mulher, de Vadim, e protagonizar uma cena de sexo lésbico ao lado da amiga Jane Birkin.

Desiludida com a constante atenção, objetificação e perseguição de paparazzi, passou a desejar uma vida mais privada e longe dos escândalos sentimentais e da atenção da mídia.

A partir da aposentadoria, resolveu se dedicar ao ativismo e à luta pela causa animal, criando a Fundação Brigitte Bardot, em 1986. Lutou contra a caça das focas e das baleias, experimentos laboratoriais com animais, contra brigas autorizadas de cães, uso de casaco de peles e touradas.

O ativismo, no entanto, não veio sem sua parcela de polêmicas. Ao longo das décadas seguintes, publicou livros e concedeu entrevistas em que compartilhou opiniões conservadoras, especialmente sobre temas como migração, cultura francesa e pluralidade racial.

Em 2003, publicou o livro Un Cri dans le Silence (Um Grito de Silêncio), em que aborda de forma controversa temas como imigração, islamismo e impacto da cultura árabe na Europa. A obra também foi considerada homofóbica, já que a atriz julgava prejudicial a adoção de crianças por casais LGBTQIA+.

Desde então, Brigitte Bardot passou a acumular dezenas de processos por racismo e injúria racial, movidos sobretudo por entidades muçulmanas, e foi acusada mais de uma vez por suposto incitamento racial contra imigrantes na França.

Em 2018, durante o auge do movimento Me Too, chegou a afirmar que as denúncias feitas por algumas atrizes eram "na maioria dos casos, hipócritas, ridículas, sem interesse".

"Há muitas atrizes que vão provocando os produtores para conseguir um papel. Depois, para que se fale delas, dizem que sofreram assédio... Na realidade, mais do que beneficiá-las, isso as prejudica", disse à revista francesa Paris Match.

Em 2021, a atriz foi condenada por um tribunal de Saint-Tropez a pagar uma multa de € 20 mil (cerca de R$ 130 mil) por insultos racistas, após chamar os habitantes de uma ilha francesa de nativos que "preservaram seus genes selvagens".

Em sua trajetória marcada por contrastes, Bardot foi musa de cineastas, símbolo sexual, ativista radical e retrato do conservadorismo. Deixa um legado controverso, mas incontestável.