21 de dezembro de 2025 - 12h00

Corte de incentivos fiscais e alta de impostos atinge bets e fintechs

Projeto aprovado pelo Congresso reduz benefícios, eleva cobrança sobre apostas, bancos digitais e JCP e mira reforço de R$ 22,4 bi em 2026

ORÇAMENTO 2026
Congresso Nacional - (Foto: Carlos Moura/Agência Senado)

Principal aposta do governo para evitar cortes no Orçamento de 2026, o projeto que reduz incentivos fiscais e aumenta tributos sobre alguns setores foi aprovado pelo Congresso nesta semana. A estimativa é de que as medidas ampliem a arrecadação em cerca de R$ 22,4 bilhões no próximo ano, com impacto direto sobre casas de apostas on-line (bets), fintechs e grandes empresas que remuneram sócios por meio de juros sobre capital próprio (JCP).

O texto passou pela Câmara na madrugada de quarta-feira (17) e, horas depois, foi aprovado também pelo Senado. Agora, segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o pacote é essencial para evitar um corte da ordem de R$ 20 bilhões nas despesas previstas para 2026.

O que muda com o projeto - O projeto combina duas frentes:

  • reduz em 10% parte dos incentivos e benefícios fiscais federais;

  • aumenta tributos sobre bets, fintechs, outras instituições financeiras e sobre o JCP pago por empresas.

Além disso, estabelece regras mais rígidas de controle, transparência e limites para a concessão de novos benefícios tributários, numa tentativa de colocar freio no avanço das renúncias fiscais.

Quais tributos terão benefícios reduzidos - A redução de 10% incide sobre gastos tributários listados no Orçamento de 2026 e em regimes especiais ligados a tributos como:

  • PIS, Pasep e PIS/Pasep-Importação;

  • Cofins e Cofins-Importação;

  • IPI, IRPJ e CSLL;

  • Imposto de Importação;

  • contribuição previdenciária patronal.

Na prática, setores que hoje contam com créditos presumidos, alíquotas diferenciadas ou isenções parciais terão uma “poda” nesses benefícios, respeitadas as exceções previstas em lei.

No caso das empresas enquadradas no regime de lucro presumido, o texto permite elevar em 10% a base de cálculo do imposto sobre a parcela da receita bruta anual que ultrapassar R$ 5 milhões.

Setores e regimes que podem ser afetados - Entre os benefícios sujeitos à redução estão:

  • Regime Especial da Indústria Química (Reiq);

  • créditos presumidos de IPI para exportadoras;

  • créditos presumidos de PIS/Cofins para setores como farmacêutico, agropecuário, de alimentos, transporte rodoviário de passageiros e exportações de café e cítricos;

  • alíquota zero de PIS/Cofins para importadores de fertilizantes, agrotóxicos e nafta petroquímica.

Esses segmentos devem sentir impacto direto na carga tributária, com efeito na estrutura de custos e, em alguns casos, nos preços finais.

Quem fica de fora do corte - Alguns benefícios foram preservados pelo projeto e não sofrerão redução. Entre as principais exceções estão:

  • imunidades constitucionais (como templos religiosos, partidos políticos e livros);

  • Zona Franca de Manaus e áreas de livre comércio;

  • produtos da cesta básica nacional;

  • entidades filantrópicas sem fins lucrativos;

  • empresas optantes do Simples Nacional;

  • programas Minha Casa, Minha Vida e Prouni;

  • Lei Aldir Blanc;

  • desoneração da folha de pagamentos;

  • incentivos para os setores de tecnologia da informação, comunicação e semicondutores.

Também permanecem intactos benefícios tributários concedidos por prazo determinado a empresas que já cumpriram as contrapartidas previstas em lei.

Aumento da tributação sobre as bets - As casas de apostas esportivas on-line terão aumento gradual de carga tributária. A alíquota, hoje em 12%, sobe para:

  • 13% em 2026;

  • 14% em 2027;

  • 15% em 2028.

Metade dessa arrecadação adicional será destinada à seguridade social, e a outra metade, para ações na área de saúde.

O texto também endurece a fiscalização sobre o setor, prevendo responsabilização solidária para quem fizer publicidade ou mantiver operações com plataformas não autorizadas.

Mais impostos para fintechs e instituições financeiras - O projeto eleva a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) de empresas do sistema financeiro, com foco especial nas fintechs:

  • fintechs e sociedades de capitalização passam de 15% para 17,5% até 2027 e para 20% a partir de 2028;

  • outras instituições financeiras, como bolsas de valores e entidades de liquidação, terão alíquotas elevadas de 9% para 12% até 2027 e para 15% a partir de 2028.

A medida aumenta a fatia de contribuição desses segmentos para o caixa da União, num cenário de crescimento acelerado de bancos digitais e plataformas financeiras.

Mudanças nos juros sobre capital próprio - Outra frente relevante do projeto é o JCP, mecanismo usado por grandes empresas para remunerar sócios e acionistas com vantagens tributárias em relação aos dividendos.

O Imposto de Renda retido na fonte sobre o JCP sobe de 15% para 17,5%. A alteração torna esse instrumento um pouco menos vantajoso e busca reduzir a perda de arrecadação provocada pelo modelo atual.

Teto para novos benefícios - Para tentar conter o avanço das renúncias fiscais, o texto prevê um gatilho: se o volume de incentivos tributários superar 2% do Produto Interno Bruto (PIB), fica proibida a concessão, ampliação ou prorrogação de novos benefícios, salvo se forem adotadas medidas de compensação fiscal.

De acordo com estimativas do governo, os benefícios tributários no país podem chegar a R$ 800 bilhões por ano, o que pressiona as contas públicas e reduz o espaço para investimentos.

Crimes tributários e restos a pagar - O projeto também trata de temas ligados à fiscalização e ao uso de recursos públicos. Entre os pontos previstos estão:

  • agravamento de penas para crimes tributários envolvendo bens protegidos por imunidade constitucional, como livros e templos religiosos;

  • permissão para revalidar “restos a pagar” — despesas empenhadas, mas não pagas e que haviam sido canceladas a partir de 2023.

Esses valores poderão ser quitados até o fim de 2026, inclusive emendas parlamentares. A estimativa de impacto é de cerca de R$ 3 bilhões.

Quando as medidas começam a valer - A maior parte das mudanças está prevista para entrar em vigor em 1º de janeiro de 2026.

No entanto, as regras que envolvem aumento de tributos ou redução de benefícios precisam obedecer à chamada “noventena”: um prazo mínimo de 90 dias após a sanção presidencial para começarem a valer.

Na prática, isso significa que o governo precisará sancionar o projeto com antecedência para garantir o efeito cheio das medidas ao longo de 2026 e cumprir a meta de reforçar a arrecadação sem recorrer a cortes mais profundos no Orçamento.