Debate político perde espaço em grupos de WhatsApp mesmo em ano eleitoral
Pesquisa aponta queda no compartilhamento de notícias e aumento do cansaço dos usuários
POLÍTICACirculação de notícias e discussões sobre política em grupos de WhatsApp de família, amigos e trabalho diminuiu em 2024, mesmo com a realização das eleições municipais. Levantamento do InternetLab mostra que esse tipo de conteúdo apareceu com menos frequência nesses espaços em comparação com anos anteriores.
Segundo a pesquisa, apenas 23% dos entrevistados afirmaram que debates sobre questões da sociedade aparecem com frequência em grupos de família, enquanto 24% citaram os grupos de amigos. Em 2023, esses percentuais eram maiores, de 30% e 27%, respectivamente. Nos grupos de trabalho, o índice se manteve estável em 11%.
O compartilhamento direto de notícias políticas também recuou. Em grupos de família, a proporção caiu de 31% em 2023 para 27% em 2024. Entre amigos, a queda foi de 29% para 24%, e, nos grupos de trabalho, de 13% para 11%.
Para a diretora de Pesquisa e Operações do InternetLab, Heloisa Massaro, os dados refletem um sentimento crescente de saturação entre os usuários. Segundo ela, relatos qualitativos indicam que as pessoas estão menos ativas nos grupos, independentemente do tema.
“Em anos anteriores, muitas pessoas criavam grupos paralelos menores para discutir política depois de conflitos em grupos maiores. O que vemos agora é diferente: há um cansaço geral. As pessoas estão menos ativas nos grupos”, afirmou.
Depoimentos colhidos pela pesquisa reforçam essa percepção. Uma entrevistada de São Paulo relatou sentir-se exausta diante do volume de informações e da necessidade constante de se manter informada.
Apesar disso, Heloisa ressalta que o debate político não desapareceu completamente, mas mudou de lugar. “Muitas vezes, a discussão migra para conversas individuais no WhatsApp ou para outros espaços”, explicou.
Mais da metade dos entrevistados (56%) disse sentir medo de expressar opiniões políticas devido ao ambiente considerado agressivo. O índice, porém, permanece estável desde 2022, dentro da margem de erro.
Além disso, 52% afirmaram se policiar cada vez mais ao falar nos grupos, e cerca da metade disse evitar o tema política para fugir de brigas. Para o InternetLab, o dado é coerente com o fato de eleições municipais gerarem menos polarização do que disputas presidenciais.
“A percepção é de que os ataques estão mais acalorados. Muitas vezes, as pessoas não querem debater, mas partir para a briga”, relatou uma entrevistada.
O levantamento também aponta diferenças de comportamento entre homens e mulheres. Segundo a pesquisa, mulheres relatam mais medo de se posicionar politicamente, se autocensuram com maior frequência e evitam conteúdos que possam gerar conflitos.
“Em quase todos os indicadores de segurança para falar de política, as mulheres aparecem com percentuais mais baixos. Os homens são maioria entre os mais ativos e entre aqueles dispostos a compartilhar conteúdo mesmo com risco de conflito”, explicou Heloisa.
Entre 2020 e 2024, a participação em grupos exclusivamente voltados ao debate político caiu de 10% para 6% dos usuários. Para o InternetLab, a redução faz parte de uma tendência mais ampla de diminuição do número de grupos em geral dos quais as pessoas participam.
“É uma queda gradual, que acompanha a redução da média de grupos por pessoa. Não vemos como um recuo abrupto do debate político, mas como parte de um movimento mais amplo”, afirmou a pesquisadora.
Apesar da queda nos grupos tradicionais, houve aumento da inserção em grupos de campanha eleitoral em 2024. A proporção de usuários que receberam links e ingressaram nesses grupos chegou a 36%, nove pontos percentuais acima de 2023.
Segundo o estudo, as campanhas adotaram estratégias mais segmentadas, com grupos ligados a bairros, comunidades e ações específicas, característica das eleições municipais.
“Isso mostra que o debate político continua existindo, mas de forma mais direcionada e estratégica, fora dos grupos de família, amigos e trabalho”, concluiu Heloisa.