Prisão de generais por tentativa de golpe marca amadurecimento da democracia, avalia historiador
Para Mateus Gamba Torres, punição histórica reforça compromisso do país com a legalidade e a justiça
POLÍTICAA prisão de oficiais-generais condenados por envolvimento na tentativa de golpe de Estado representa um marco inédito na história do Brasil e, segundo o professor de história Mateus Gamba Torres, da Universidade de Brasília (UnB), é reflexo de um processo de amadurecimento democrático. A avaliação foi feita durante entrevista ao telejornal Repórter Brasil, da TV Brasil, exibida na quarta-feira (26).
Além do ex-presidente Jair Bolsonaro — capitão da reserva do Exército —, também foram presos nesta semana os generais Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto, além do almirante Almir Garnier. Todos estão entre os principais articuladores da trama golpista desbaratada pela Justiça e, agora, cumprem pena por crimes contra o Estado democrático de direito.
É a primeira vez que oficiais de tão alta patente são presos por participação direta em uma tentativa de ruptura institucional. O professor Mateus Torres destaca o caráter simbólico e histórico do momento. “Mesmo que os militares resolvessem fazer uma tentativa de golpe, como houve várias vezes na República, isso agora não é mais aceito pela nossa democracia”, afirmou.
Com a condenação, os militares também poderão ser alvo de processos para perda do oficialato, o que será julgado pelo Superior Tribunal Militar (STM). O especialista considera essa possibilidade um passo importante para afirmar que nenhum agente público está acima da Constituição. “Não existe nada mais indigno do que se colocar contra a nossa democracia”, completou.
Ao comentar as propostas de anistia aos envolvidos nos atos golpistas, o historiador foi enfático: “A anistia não apazigua nada. Ela varre a sujeira para debaixo do tapete”. Para ele, perdoar os golpistas seria repetir erros do passado, como ocorreu com a anistia de 1979, que livrou torturadores da ditadura militar de responsabilização judicial.
Segundo Torres, até hoje o Brasil carrega as consequências dessa decisão, com a falta de uma justiça de transição plena. Ele afirma que o julgamento e punição dos golpistas são necessários para que a democracia se consolide, com memória, justiça e verdade.
O professor da UnB também destacou que o rigor da Justiça nesses casos contribui positivamente para a imagem internacional do Brasil. “A decisão judicial fortalece a visão que os outros países têm do nosso compromisso com a democracia”, disse.
Apesar de reconhecer que ainda há forte corporativismo nas Forças Armadas, Torres acredita que o atual momento político cria um ambiente propício para que o STM confirme a perda das patentes dos militares condenados.
A série de prisões e desdobramentos judiciais acontece cerca de 40 anos após o processo de redemocratização e serve, segundo o especialista, como prova de que o Brasil está mais preparado para reagir institucionalmente contra qualquer ameaça autoritária.