Agência Einstein/E+ | 24 de novembro de 2025 - 08h15

Entenda como o colesterol afeta o cérebro

Estudos apontam que o 'bom' colesterol ajuda na proteção do cérebro, enquanto o 'ruim' está ligado a danos e doenças neurológicas

SAÚDE
Colesterol tem impacto direto no cérebro - Foto: Teeradej/Adobe Stock

A divisão entre colesterol “bom” e “ruim” ganha contornos ainda mais claros quando o assunto é o cérebro. Estudos recentes mostram que a qualidade dessa gordura pode tanto preservar a cognição quanto acelerar seu declínio. Isso porque o órgão, composto em cerca de 60% por gordura, depende de lipídios específicos para manter a integridade das células nervosas e a transmissão de sinais. Mais do que níveis altos ou baixos, é a composição desse colesterol que determina seus efeitos.

“O impacto depende da qualidade dessa gordura”, explica o neurologista Marco Túlio Pedatella, do Hospital Israelita Albert Einstein, em Goiânia. Sob a ótica da neuroproteção, o HDL aparece como aliado, enquanto acúmulos de LDL dentro do cérebro estão associados a inflamação e prejuízo cognitivo.

Pesquisas aprofundam esse contraste. Um estudo da Universidade do Texas, publicado no Journal of Clinical Medicine em outubro de 2024, analisou exames de imagem de 1.800 adultos e identificou maior volume de matéria cinzenta entre aqueles com níveis mais altos de HDL — resultado que se manteve até em pessoas com o gene ApoE4, ligado ao Alzheimer.

No extremo oposto, um trabalho divulgado na revista Immunity em julho de 2025 evidenciou os riscos do LDL. Cientistas da Universidade de Purdue observaram que níveis elevados dessa gordura entre os 40 e 65 anos aumentam significativamente o risco de Alzheimer nas décadas seguintes. O excesso lipídico paralisa as microglias, células de defesa do cérebro, ao estimular o acúmulo da enzima DGAT2, que reduz a capacidade de eliminar placas amiloides — estruturas associadas ao desenvolvimento da doença. Em testes celulares, a remoção dessa enzima restabeleceu a função dessas “faxineiras” do sistema nervoso.

“Esses achados reforçam a importância de manter um metabolismo lipídico equilibrado ao longo da vida”, destaca a cardiologista Fabiana Hanna Rached, especialista em aterosclerose do Einstein. Segundo ela, o desequilíbrio prejudica a comunicação entre neurônios, afeta a função sináptica e favorece o declínio cognitivo.

A boa notícia é que controlar o colesterol — especialmente o LDL — também protege o cérebro. Estudos mostram que estatinas e ajustes na dieta ajudam a retardar ou mesmo prevenir demências.

O colesterol cerebral, porém, tem particularidades. Ele é produzido diretamente no cérebro e não atravessa com facilidade a barreira hematoencefálica, o que faz com que seu metabolismo seja independente do restante do corpo.

“Apenas derivados como o 24S-hidroxicolesterol conseguem cruzá-la”, explica Pedatella. Mesmo assim, condições sistêmicas como síndrome metabólica e obesidade abdominal interferem indiretamente nesse equilíbrio. Pessoas com hipertensão, acúmulo de gordura abdominal e baixos níveis de HDL no sangue tendem a apresentar volume cerebral reduzido e pior desempenho em testes cognitivos.

Além disso, o momento da vida em que o colesterol se eleva influencia o risco futuro de demência. “A exposição na meia-idade é a que mais pesa”, acrescenta o neurologista. Em idosos acima de 70 anos, a associação tende a enfraquecer, e níveis mais altos podem até se ligar a melhores prognósticos em alguns estudos.

As diferenças entre pesquisas indicam que ainda há lacunas importantes. “Precisamos de estudos longitudinais que distingam causa e efeito e avaliem se intervenções precoces podem preservar o cérebro”, afirma Rached.

Até lá, a orientação permanece sólida: manter o colesterol em equilíbrio por meio de alimentação adequada, atividade física e, quando necessário, tratamento medicamentoso.