Juliana Prado | 23 de novembro de 2025 - 22h00

Como agem pregabalina e sertralina, que Bolsonaro diz terem causado alucinação

Ex-presidente afirma ter tido confusão mental após uso dos remédios; médicos suspenderam medicação e especialistas dizem que efeito é raro, mas possível

ENTENDA
Ex-presidente Bolsonaro. - (Foto: Valter Campanato/ABrasil)

Durante audiência de custódia realizada neste domingo (23), o ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou que sofreu uma “alucinação” e uma “certa paranoia” antes de tentar romper sua tornozeleira eletrônica com um ferro de solda, na última sexta-feira (21). Segundo Bolsonaro, a confusão mental teria sido causada pela combinação dos medicamentos pregabalina e sertralina, prescritos para quadros de ansiedade e depressão.

A medicação, segundo boletim médico divulgado por sua equipe, foi suspensa após o episódio. Os médicos Leandro Echenique (cardiologista) e Claudio Birolini (cirurgião geral) informaram que o fármaco em questão foi indicado por uma outra profissional de saúde, sem o conhecimento da equipe responsável. O objetivo seria “otimizar o tratamento”, mas o remédio apresentou interação com medicamentos de uso contínuo do ex-presidente, como clorpromazina e gabapentina, usados para crises de soluço.

“O medicamento foi suspenso imediatamente, sem sintomas residuais neste momento. Foram realizados os ajustes necessários na medicação, restabelecendo a orientação anterior”, afirmaram os médicos, acrescentando que Bolsonaro segue estável e sob reavaliações periódicas.

Quadro é raro, mas pode ocorrer, dizem especialistas

A psiquiatra Flávia Zuccolotto, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, explicou que, embora os medicamentos não sejam normalmente associados a alucinações, efeitos desse tipo podem ocorrer em situações específicas. “A combinação entre pregabalina e sertralina é comum na prática clínica e, em geral, é segura quando monitorada. Mas pode provocar sonolência, lentidão psicomotora e, raramente, confusão mental e alterações sensoperceptivas, especialmente em pacientes vulneráveis”, afirmou.

A especialista destacou que essas reações são incomuns, mas podem aparecer em pessoas com histórico psiquiátrico, em início de tratamento, sob altas doses ou em uso concomitante de outras substâncias que deprimem o sistema nervoso central.

Segundo a médica, alucinações podem se manifestar de diferentes formas: auditivas, visuais, táteis, olfativas. “A pessoa pode parecer distraída, falar sozinha, reagir a estímulos inexistentes ou apresentar comportamento desorganizado”, explicou.

Como agem os medicamentos

A pregabalina é um anticonvulsivante que atua regulando a transmissão entre células nervosas, sendo indicada para ansiedade e dores crônicas. Já a sertralina é um antidepressivo da classe dos inibidores seletivos da recaptação de serotonina, amplamente usado em quadros depressivos e ansiosos.

Embora os efeitos adversos listados nas bulas incluam sintomas como tontura, sonolência, visão turva, perda de apetite, tremores e agitação, alucinações são citadas como reações raras. A psiquiatra reforça que, mesmo quando ocorrem, tais sintomas não caracterizam um surto psicótico clássico.

Próximos passos clínicos

De acordo com a equipe médica de Bolsonaro, ele “passou a noite sem intercorrências” após a suspensão da medicação, e segue sob observação clínica. A tentativa de violar a tornozeleira motivou a decretação de sua prisão preventiva por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sob alegação de risco de fuga.

O episódio abriu discussão pública sobre os efeitos adversos de medicamentos psicoativos, bem como a importância da prescrição e acompanhamento médicos rigorosos em pacientes com histórico delicado de saúde.