ONG critica asilo a ex-primeira-dama do Peru e diz que FAB virou 'piloto de fuga'
Transparência Internacional condena operação brasileira que trouxe Nadine Heredia ao país após sua condenação por corrupção
POLÍTICA EXTERNAA Transparência Internacional criticou duramente o uso de um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) na operação que trouxe ao Brasil a ex-primeira-dama do Peru, Nadine Heredia, condenada por corrupção e lavagem de dinheiro. Em nota publicada nesta segunda-feira (17), a ONG afirmou que a FAB atuou como “piloto de fuga” e classificou o episódio como “um dos mais infames da história latino-americana”.
A operação custou R$ 345 mil aos cofres públicos e foi realizada a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após o governo brasileiro conceder asilo humanitário a Heredia. Segundo o Planalto, a autorização se deu por razões humanitárias, com base no tratamento de câncer enfrentado por ela. A justificativa foi baseada na Convenção de Caracas de 1954, que regula o asilo diplomático na América Latina.
“FAB se prestando ao papel de piloto de fuga da primeira-dama peruana condenada por corrupção, a mando do próprio chanceler Mauro Vieira e do presidente Lula, será lembrado como um dos episódios mais infames da história latino-americana. Desonra que o povo brasileiro não merecia”, afirmou a entidade no X (antigo Twitter).
Rota e custos da operação - Os detalhes da missão foram revelados por meio de um requerimento de informação feito pelo deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS) ao Ministério da Defesa. A aeronave envolvida na operação foi um jato E-135 Shuttle (VC-99C), que partiu de Brasília com destino a Lima, no Peru, realizando escalas técnicas.
Foram gastos R$ 318 mil em despesas logísticas, R$ 19 mil em taxas aeroportuárias e R$ 7,5 mil em diárias para a tripulação. Nadine Heredia embarcou com o filho mais novo e foi levada diretamente a Brasília.
Antes do transporte, ela havia buscado refúgio na Embaixada do Brasil em Lima, logo após ser condenada pela Justiça peruana. O salvo-conduto para sua saída foi concedido pelo governo peruano após coordenação diplomática com Brasília.
Nadine Heredia e seu marido, o ex-presidente Ollanta Humala, foram condenados pela Justiça peruana por envolvimento em um esquema de corrupção ligado à empreiteira brasileira Odebrecht (atualmente Novonor), incluindo financiamento ilegal de campanhas eleitorais. O Ministério Público do Peru classificou os crimes como de natureza comum, e não política — o que gerou críticas ao asilo concedido pelo Brasil.
No entanto, a defesa de Heredia alegou que há motivações políticas no processo, traçando paralelos com a Operação Lava Jato no Brasil, que também envolveu delações da empreiteira em vários países latino-americanos. A solicitação de asilo foi baseada no entendimento de que ela estaria sob risco de perseguição política.
Repercussão política - A operação provocou críticas dentro e fora do país. Parlamentares da oposição questionaram o uso de recursos públicos e o envolvimento direto do presidente Lula na decisão. “É inaceitável que o Brasil use recursos da FAB para proteger condenados por corrupção de outros países”, disse Van Hattem.
Por outro lado, o Itamaraty afirmou que o Brasil cumpriu obrigações legais previstas na Convenção de Caracas, e que a decisão de conceder asilo cabe exclusivamente ao Estado solicitante. “Cabe ao Brasil avaliar a urgência e necessidade do asilo; ao Peru, a concessão do salvo-conduto”, afirmou nota da chancelaria.