O Estado de S. Paulo. | 16 de novembro de 2025 - 08h30

Crise do arroz contrasta com boa safra de grãos no País

Com custo acima do preço pago pela saca, Rio Grande do Sul reduz plantio do cereal e enfrenta a pior relação de troca dos últimos anos

ECONOMIA
Com custo elevado e preços em queda, produtores gaúchos reduzem plantio do arroz. - (Foto: REPRODUÇÃO)

A recuperação do agronegócio brasileiro não alcança o arroz. Enquanto outras culturas caminham para novas safras recordes, o cereal enfrenta retração no Estado que responde por mais de 70% da produção nacional. No Rio Grande do Sul, a área plantada deve cair 10% em 2025/26, reflexo direto da pior relação entre custo e preço já registrada pelos produtores.

O presidente da Associação dos Agricultores de Dom Pedrito, Edinho Fontoura, resume a frustrante matemática que cerca a lavoura. A saca é negociada na faixa de R$ 50, enquanto produzir custa cerca de R$ 90. Ele afirma que muitos seguem plantando por persistência, mesmo sabendo que trabalham no prejuízo.

Levantamento do Instituto Riograndense do Arroz (Irga) mostra que pouco mais de 70% das áreas previstas foram semeadas, cobrindo 640 mil hectares. A estimativa inicial era de 920 mil hectares, volume que não será alcançado. Na safra anterior, o Estado chegou a 970 mil hectares. Além da redução do cultivo, a descapitalização tem levado produtores a reduzir investimentos em adubação, encarecida pelos insumos.

A dificuldade soma-se a cinco anos agrícolas adversos, marcados por quatro estiagens severas e pelo menos uma grande enchente. O resultado aparece no preço recebido. Dados do Cepea indicam que a saca de 50 quilos teve média de R$ 58 em outubro, queda de 6,2% em relação ao mês anterior e 51,4% abaixo do valor registrado um ano antes. No acumulado de 2025, o recuo nominal chega a 43,2%.

O agricultor Arno Walter Lausch, que concluiu o plantio de 1,2 mil hectares na Fazenda Celeiro, em Maçambará, espera por uma reação nos preços até a colheita. Ele lembra que o arroz é peça-chave na rotação de culturas, favorecendo áreas que depois recebem milho e soja. O grupo Lausch, referência regional, investiu alto em irrigação nos anos de preços mais altos. Agora, segundo Cristiano Lausch, administrador do grupo, o retorno é insuficiente para quitar o investimento.

Importações

Mesmo sendo o segundo maior exportador de arroz fora da Ásia, o Brasil segue dependente da importação para equilibrar o abastecimento. A safra passada rendeu 12,8 milhões de toneladas, acima do consumo interno, estimado em 11 milhões. Para a próxima, a Conab prevê queda para 11,4 milhões de toneladas.

Com o excesso no mercado diante da queda dos preços, o País deve exportar mais. A Conab projeta aumento de 31% no envio ao exterior, alcançando 2,1 milhões de toneladas neste ano. Os principais destinos são países africanos, como Senegal e Gâmbia, além de Cuba e Peru. As importações permanecem estáveis, em 1,4 milhão de toneladas, com origem na Argentina, Paraguai e Uruguai.

Para evitar desabastecimento ou oscilações bruscas, o governo mantém leilões de compra. Neste ano, foram destinados R$ 300 milhões para adquirir 200 mil toneladas a preços superiores aos de mercado, reforçando os estoques públicos e garantindo algum alívio ao produtor.

Tentivas

Presença fixa na cesta básica, o alimento também tem recebido campanhas para estimular seu consumo. No fim de outubro, a Abiarroz lançou a campanha Arroz Combina, focada na valorização do produto e na tentativa de reduzir o desequilíbrio entre produção e demanda.

Em paralelo, a indústria amplia ações de exportação por meio do projeto Brazilian Rice, em parceria com a ApexBrasil. Missões comerciais recentes ocorreram em México e Nigéria, e importadores mexicanos visitaram o Rio Grande do Sul. O arroz brasileiro também marcou presença na Foodex Saudi Expo, na Arábia Saudita, e participa ainda neste ano da US Private Label Trade Show, nos Estados Unidos.

Função em cadeias industriais

Segundo o presidente do Irga, Eduardo Bonotto, o cereal tem potencial para integrar a produção de etanol de cereais, junto a milho e trigo, especialmente com o uso do arroz quebrado, de menor valor comercial.

Subprodutos também têm novas rotas. A casca já é usada como biomassa em caldeiras e o farelo pode ser convertido em biodiesel. Bonotto destaca que várias plantas de biocombustíveis operam no Rio Grande do Sul e outras estão em implantação, ampliando o mercado sustentável para quem produz arroz.