STF julga se recreio deve contar como hora de trabalho para professores
Corte analisa se intervalo entre aulas configura tempo à disposição do empregador e impacta jornada docente
STF DECIDEO Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar nesta quarta-feira (12) uma questão que pode gerar impacto direto na jornada de trabalho de professores do ensino médio e superior em todo o Brasil: a inclusão do recreio como parte integrante do tempo de serviço. O debate gira em torno da constitucionalidade de decisões da Justiça do Trabalho que reconheceram o intervalo entre aulas como período à disposição do empregador.
A discussão ocorre no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1058, apresentada pela Associação Brasileira das Mantenedoras de Faculdades (Abrafi), que contesta o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Para a entidade, há uma "presunção absoluta" criada pela Justiça do Trabalho de que o recreio é automaticamente considerado hora de trabalho, independentemente das particularidades de cada instituição ou situação.
"A questão é que não importa o caso concreto, não importa o que aconteceu", argumentou o advogado Diego Felipe Munhoz, representante da Abrafi, durante a sustentação oral. Ele defendeu que o tempo de recreio seja visto como intervalo de descanso, e não como obrigação laboral.
Em contraponto, o advogado Rafael Mesquita, representante da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino, sustentou que o recreio representa sim um momento de trabalho para muitos docentes, e que o reconhecimento desse tempo é uma medida de justiça.
"O STF tem a oportunidade de resgatar a dignidade dos professores", afirmou Mesquita. Ele citou dados de uma pesquisa que apontam que os docentes brasileiros estão entre os que mais trabalham e menos recebem, com salários em média 47% inferiores aos dos professores de países da OCDE.
O relator do processo, ministro Gilmar Mendes, foi o primeiro a votar e se posicionou contra o reconhecimento automático do recreio como parte da jornada de trabalho. Para ele, o tempo de intervalo só deve ser computado como hora trabalhada se preencher requisitos específicos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
"A princípio, o período denominado recreio escolar se enquadraria como intervalo de descanso intrajornada, desde que verificados os demais requisitos previstos nos artigos 71 e 72 da CLT. Trata-se de lapso temporal que não integra a jornada de trabalho", defendeu.
Já o ministro Edson Fachin abriu divergência ao entender que o intervalo deve, sim, ser considerado tempo à disposição da escola. Segundo Fachin, o papel do professor vai além da aula em si e envolve a permanência na escola em atividades pedagógicas contínuas.
A ministra Cármen Lúcia também se posicionou favoravelmente ao reconhecimento do recreio como parte da jornada. Ela destacou que, nesse período, os professores não estão, necessariamente, descansando.
"A escola não é só a sala de aula. É a convivência, é o recreio, é a cantina. Isso tudo compõe o ambiente escolar. A presença de professores e estudantes é de interação permanente, e não de um período isolado", ressaltou.
O julgamento será retomado nesta quinta-feira (13), com a expectativa do voto do ministro Flávio Dino. Enquanto isso, todos os processos trabalhistas sobre o tema permanecem suspensos em todo o território nacional, por decisão do próprio Gilmar Mendes em março do ano passado.
Pela legislação atual, a CLT prevê que jornadas entre quatro e seis horas devem ter, no mínimo, 15 minutos de intervalo. Para cargas entre seis e oito horas, o intervalo pode variar de uma a duas horas — com possibilidade de ajustes por meio de acordos coletivos.
O resultado do julgamento tem potencial para afetar contratos de milhares de professores em escolas e faculdades de todo o país, tanto no setor público quanto no privado.