Italianos são investigados por pagar para atirar em civis durante guerra na Bósnia
Turistas teriam desembolsado até R$ 611 mil para participar de "safaris humanos" em Sarajevo, entre 1993 e 1995
CRIMES DE GUERRAA Procuradoria de Milão abriu uma investigação sobre um grupo de turistas italianos acusados de pagar até € 100 mil (cerca de R$ 611 mil) para atirar em civis e crianças durante viagens de “safari humano” em Sarajevo, no auge da Guerra da Bósnia.
De acordo com o jornal La Repubblica, as excursões teriam ocorrido entre 1993 e 1995, durante o cerco da capital bósnia. Todas as sextas-feiras, os chamados “turistas de guerra” saíam de Trieste, no nordeste da Itália, viajavam até Belgrado, na Sérvia, e seguiam por helicóptero ou por terra até as colinas de Sarajevo. Lá, recebiam armas e eram posicionados para atirar em pessoas inocentes, incluindo crianças.
As viagens custavam entre € 80 mil e € 100 mil por pessoa — com valores mais altos para quem queria atirar em crianças, segundo a reportagem. O dinheiro era repassado a milícias sérvias por meio de intermediários.
Perfil dos atiradores - As investigações apontam que os participantes eram, em sua maioria, homens entre 40 e 50 anos, empresários, médicos e mercenários de regiões como Lombardia, Piemonte e Triveneto. Todos tinham em comum a paixão por armas e a busca por experiências violentas.
Um ex-funcionário da agência de inteligência da Bósnia relatou que o Serviço de Inteligência e Segurança Militar da Itália (Sismi) foi alertado sobre o caso em 1994. À época, a corporação teria respondido: “Descobrimos que o safari partiu de Trieste. Interrompemos e o safari não acontecerá mais.”
O caso é apurado pelo Esquadrão de Operações Especiais (ROS) dos Carabinieri, e diversas testemunhas serão convocadas — entre elas, um oficial da Eslovênia, um bombeiro e os pais de uma bebê de um ano morta no chamado “beco dos atiradores”.
O bombeiro já havia mencionado a presença de “turistas atiradores” durante o julgamento do ex-presidente da Sérvia, Slobodan Milosevic, destacando que eles usavam roupas e armas incompatíveis com o cenário da guerra.
Alguns dos suspeitos já foram identificados, incluindo um médico dono de clínica particular em Milão. Eles podem ser julgados por homicídio doloso agravado por crueldade e motivos torpes.
Documentário trouxe o caso à tona - O escândalo ganhou força após o lançamento do documentário “Sarajevo Safari”, dirigido pelo esloveno Miran Zupanic, que expôs relatos e evidências sobre o caso. As denúncias também foram reforçadas pelo escritor Ezio Gavazzeni, com apoio do advogado Nicola Brigida e do ex-juiz Guido Salvini.
O cerco de Sarajevo, entre 1992 e 1995, é considerado um dos episódios mais sangrentos da Guerra da Bósnia. Estima-se que mais de 11 mil civis foram mortos, sendo 1.601 crianças, e cerca de 60 mil pessoas ficaram feridas.