Redação O Estado de S. Paulo | 30 de outubro de 2025 - 17h15

MP-RJ aponta 'BMW' como chefe do grupo Sombra em denúncia contra o Comando Vermelho

Denúncia lista 69 nomes entre líderes, gerentes e soldados; operação na Penha e no Alemão deixou 121 mortos, incluindo quatro policiais

ALTA PERICULOSIDADE
Juan Breno, conhecido como BMW, aparece em zona de mata utilizando roupa camuflada específica de guerrilha e portanddo um fuzil. - Foto: Reprodução/Ministério Público do Rio

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) apresentou à Justiça denúncia contra integrantes do Comando Vermelho (CV) que identifica 69 pessoas como as principais lideranças, além de seus gerentes e soldados, responsabilizados por atuação no Complexo da Penha. Conforme o documento, os complexos da Penha e do Alemão foram alvos de uma megaoperação das polícias Civil e Militar na terça-feira, 28, que resultou em 121 mortos, entre eles quatro agentes de segurança.

A denúncia organiza os investigados em três níveis hierárquicos: as “principais lideranças”, com atuação centrais no Complexo da Penha; os gerentes do tráfico local e de áreas vinculadas; e os soldados do tráfico e membros de menor hierarquia. Entre os nomes considerados de maior relevância, o MP cita Juan Breno Malta Ramos — apelidado de "BMW" — apontado como chefe do grupo denominado Sombra. A reportagem não localizou a defesa de Ramos.

Quem é o 'BMW' e qual o papel atribuído a ele - O documento do MP descreve Juan Breno Malta Ramos Rodrigues como um indivíduo natural de Belo Horizonte, com atuação apontada na Gardênia Azul, na zona oeste do Rio. O órgão o classifica como gerente do tráfico nessa localidade e líder do grupo Sombra, que seria responsável por ações ofensivas da facção na região da grande Jacarepaguá.

Segundo a peça acusatória, por exercer “a função de ampliar os domínios da facção, BMW controla grandes quantias de dinheiro”. Com esses recursos, diz o MP, o denunciado teria adquirido armamento pesado e implantado estrutura de vigilância: “diversas câmeras de monitoramento no Complexo da Penha e na comunidade Gardênia, algumas com sensor de movimentação”.

O teor da denúncia destaca ainda o caráter bélico da atuação atribuída ao suspeito: “o denunciado JUAN BRENO, vulgo 'BMW', atualmente, goza de prestígio e alta posição hierárquica dentro do Comando Vermelho. Ele atua na área operacional, na liderança de um grupo violento que emprega armas de fogo de grosso calibre em suas ações e atua com violência extrema contra rivais”.

No entendimento do MP, BMW exibe e ostenta “armamento de uso restrito militar de alta letalidade e bastante variado”, condição que lhe conferiria predomínio bélico sobre adversários e comunidades onde atua. Ainda conforme a denúncia, o suspeito teria desempenhado função de instrutor de “soldados” do tráfico, “usando de sua larga experiência no emprego de armas de grosso calibre para instruir mais criminosos a serviço do Comando Vermelho”.

Essas afirmações fazem parte do conjunto de imputações que buscam caracterizar não apenas a liderança, mas também a capacidade operacional da facção na expansão territorial e na manutenção de um aparato armado sofisticado, segundo a peça ministerial.

A denúncia também atribui a Ramos a coordenação de práticas de punição e tortura contra moradores, com organização de “tribunais do tráfico” nos quais teria autonomia para determinar a execução de rivais de menor expressão. Os promotores relatam ter acesso a vídeo que, segundo o MP, mostra um homem “arrastado por um carro, amordaçado e algemado, por alguns minutos, supostamente para confessar participação em uma delação a um grupo rival.”

No material citado, o alvo das agressões teria, “em meio a gritos implorando por perdão”, mencionado o nome de BMW diversas vezes, enquanto o acusador “faz piada do sofrimento alheio, debochando da vítima agonizante”. A peça inclui ainda imagem que, segundo os promotores, demonstra que o episódio era transmitido ao vivo em vídeo.

Estrutura da denúncia e divisão de responsabilidades - Ao delimitar 69 nomes entre principais lideranças, gerentes e soldados, o MP busca atribuir responsabilidades específicas conforme a hierarquia e as funções dentro da facção. A diferenciação entre os três grupos — líderes, gerentes e soldados — serve para fundamentar pedidos de prisão, medidas cautelares e eventual desarticulação das redes de apoio logístico e financeiro apontadas pela investigação.

A peça ministerial associa condutas que vão desde a coordenação operacional e o financiamento de armamentos até crimes de tortura, intimidação e extorsão, sustentando que há elementos suficientes para cada qualificação criminal apresentada na denúncia.

A megaoperação realizada no dia 28 teve como palco principal os complexos da Penha e do Alemão, na zona norte do Rio. Segundo as informações divulgadas no contexto da ação, houve um total de 121 mortos — número que inclui quatro policiais. A mobilização envolveu a atuação conjunta das polícias Civil e Militar e foi descrita pelos órgãos oficiais como uma ação de envergadura contra o crime organizado nas áreas atingidas.

A denúncia do MP sobre as lideranças do CV chega no mesmo momento em que as forças de segurança concentram esforços para investigar e responsabilizar integrantes apontados como operadores e financiadores de práticas criminosas nas comunidades.

Do texto disponível, não constam declarações de defesa do apontado como BMW — a reportagem informou não ter localizado representação do acusado até o fechamento desta edição. Também não há registros públicos no conteúdo encaminhado pelo usuário sobre respostas formais de outros denunciados listados pelo MP.

A denúncia, como peça inicial, deverá tramitar na Justiça competente e pode ensejar diligências complementares, produção de provas e audiências. Cabe ao Judiciário analisar a suficiência do conjunto probatório e decidir sobre medidas cautelares e eventuais prisões temporárias ou preventivas, conforme o caso.

Impacto nas comunidades e repercussão - As acusações e a operação que as antecedeu trazem novamente à cena pública temas sensíveis: a presença de grupos armados com alto poder de fogo, a utilização de violência extrema contra moradores e rivais, e a complexa relação entre território, controle e estruturas de financiamento do crime. A transmissão em vídeo de episódios de tortura, apontada pelos promotores, também realça o caráter audiovisual e simbólico que o crime moderno tem assumido — servindo tanto para intimidação local quanto para exibição de força.

A amplitud e a gravidade das imputações podem influenciar decisões sobre o emprego de recursos policiais, a interlocução entre esferas federal e estadual e o debate público sobre estratégias de segurança e políticas de prevenção nas comunidades afetadas.

Com a denúncia formalizada, os réus citados terão suas defesas constituídas nos prazos legais, e o Judiciário deverá avaliar pedidos de medidas cautelares e a necessidade de investigação complementar. A tramitação incluirá, conforme o caso, análise de provas técnicas, periciais e testemunhais anexadas pelo MP.

Até que haja decisão final, a denúncia representa uma fase processual importante que, se acolhida em suas partes, poderá levar a denúncias criminais individuais, decretação de prisões e outras providências judiciais.