Gabriel Damasceno | 14 de outubro de 2025 - 16h45

OMS alerta que só 1 em 4 países oferece cuidados adequados para doenças neurológicas

Condições como AVC, Alzheimer e enxaqueca afetam mais de 40% da população mundial, mas maioria dos países carece de estrutura para atendimento

SAÚDE GLOBAL
OMS alerta que maioria dos países não está preparada para enfrentar avanço de doenças neurológicas - Foto: AdobeStock

Um novo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgado nesta terça-feira, 14 de outubro, revela que menos de um em cada três países no mundo está preparado para enfrentar o avanço das doenças neurológicas, que hoje afetam mais de 40% da população global e causam mais de 11 milhões de mortes por ano.

O documento, intitulado Global status report on neurology, expõe uma crise silenciosa: a maioria dos países não possui estrutura adequada para oferecer tratamento, suporte e políticas públicas eficazes para enfrentar doenças que vão desde dores de cabeça até demência e cânceres do sistema nervoso.

Condições mais comuns e falta de acesso - Entre as principais doenças neurológicas listadas estão acidente vascular cerebral (AVC), enxaqueca, Alzheimer, neuropatia diabética, epilepsia e complicações associadas ao parto prematuro. Também aparecem encefalopatia neonatal, meningite, transtornos do espectro autista e tumores no sistema nervoso.

Apesar do impacto global, apenas 49 dos 194 países membros da OMS incluem o tratamento de distúrbios neurológicos em seus pacotes de cobertura universal de saúde. Em regiões mais pobres, o acesso a neurologistas é mais de 80 vezes menor que em países ricos, revelando um abismo na oferta de cuidados especializados.

“A maioria dos serviços ainda está fora do alcance da população, principalmente nas áreas rurais e de baixa renda”, afirmou Jeremy Farrar, diretor-geral assistente da OMS para Promoção da Saúde. “Muitas dessas condições podem ser prevenidas ou tratadas, mas exigem políticas sólidas e investimento consistente.”

De acordo com Diogo Haddad, neurologista do Hospital Nove de Julho e coordenador do núcleo de Memória do laboratório Alta Diagnósticos, vivemos uma “epidemia neurológica”. Ele destaca que boa parte das principais doenças atuais possui causas ou manifestações neurológicas.

“Nós estamos vendo uma epidemia neurológica. Desde dores de cabeça e tonturas até AVCs e Alzheimer, essas condições estão cada vez mais presentes no dia a dia da população. O aumento das doenças vem acompanhado do aumento do diagnóstico, e precisamos tratar essas pessoas com qualidade”, afirma.

Brasil é citado como exemplo, mas ainda enfrenta desafios - O relatório da OMS cita o Brasil como exemplo positivo por desenvolver políticas integradas voltadas à saúde neurológica. No entanto, especialistas apontam que ainda faltam profissionais e centros especializados no País.

Haddad ressalta a necessidade de mais investimentos em capacitação, pesquisa e infraestrutura. “É preciso ampliar o envolvimento público e privado para acompanhar essa realidade crescente.”

O estudo da OMS também aponta para a falta de apoio aos cuidadores de pacientes neurológicos, que geralmente são familiares — e, na maioria das vezes, mulheres. Apenas 46 países oferecem programas de suporte para cuidadores e 44 possuem alguma forma de proteção legal para eles.

“A ausência de políticas de apoio sobrecarrega essas pessoas, que muitas vezes enfrentam a jornada de cuidado sozinhas, sem suporte financeiro, emocional ou jurídico”, pontua Farrar.

O que a OMS recomenda

O relatório conclui que, sem políticas robustas, os sistemas de saúde permanecem fragmentados, subfinanciados e ineficazes. Para reverter esse cenário, a OMS propõe:

Ampliação da cobertura universal de saúde para incluir distúrbios neurológicos;

Criação de planos nacionais específicos e orçamentos adequados;

Apoio legal e estrutural aos cuidadores informais;

Aumento da coleta e análise de dados sobre doenças neurológicas;

Promoção da saúde cerebral ao longo da vida, com políticas intersetoriais.

Atualmente, apenas 53% dos países contribuem com dados completos para os levantamentos da OMS, o que compromete a formulação de políticas baseadas em evidências.