Antonio Perez | 10 de outubro de 2025 - 18h00

Dólar dispara e fecha acima de R$ 5,50 com tensão fiscal e atrito entre EUA e China

Moeda americana sobe 2,39% e tem maior valor de fechamento desde agosto; incertezas internas e cenário externo pressionam o real

DÓLAR
Dólar. - (Foto: Estadão)

O dólar teve forte alta nesta sexta-feira (10) e encerrou o dia cotado a R$ 5,5037, com avanço de 2,39%, no maior valor de fechamento desde 5 de agosto. A disparada foi impulsionada pela combinação de tensões comerciais entre Estados Unidos e China e preocupações com o quadro fiscal brasileiro, em meio a temores de medidas de cunho populista no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

No início do pregão, a moeda chegou a recuar pontualmente para R$ 5,3622, mas rapidamente inverteu o sinal e operou em alta ao longo de todo o dia, atingindo a máxima de R$ 5,5187 à tarde. Com o resultado, o dólar acumulou alta semanal de 3,13% e já soma valorização de 3,39% em outubro. No ano, a desvalorização do real frente à moeda americana, que chegou a superar 14% em períodos anteriores, agora está em 10,95%.

O real teve o pior desempenho entre as moedas emergentes e de países exportadores de commodities, em um dia de forte queda nas cotações do petróleo, que recuaram cerca de 4%. Investidores buscaram refúgio em ativos considerados seguros, como títulos do Tesouro dos EUA (Treasuries) e ouro.

O índice DXY, que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis moedas fortes, recuou 0,50%, voltando a operar abaixo dos 99 mil pontos, após ter atingido na quinta-feira seu maior nível em dois meses.

De acordo com o economista-sênior do Banco Inter, André Valério, o dia foi marcado por uma “fuga para a qualidade”, com investidores migrando para ativos mais seguros diante do aumento da incerteza global. Ele também destacou a piora da percepção fiscal no Brasil após novas sinalizações do governo.

“O dia é ruim para moedas emergentes e de países exportadores de commodities. No caso do real, já víamos mais volatilidade no câmbio local com a questão da MP. E hoje veio a nova política de crédito imobiliário e as notícias de que o governo está se movimentando para tomar medidas com vistas à eleição, o que coloca em risco a meta fiscal do ano que vem”, afirmou Valério.

A moeda acelerou a alta após as 10h30, quando o Estadão noticiou que o governo prepara um pacote de R$ 100 bilhões para 2025. As medidas incluem isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, distribuição de gás de cozinha gratuito, bolsas do programa Pé-de-Meia e isenção na conta de luz para cerca de 17 milhões de famílias. O plano, porém, enfrenta resistências no Congresso Nacional.

“O mercado estava surfando um ambiente externo favorável e deixando os problemas fiscais de lado. Parece claro que o governo vai adotar uma postura ainda mais populista e recorrer a manobras para cumprir a meta fiscal”, disse Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio da Treviso Corretora.

No exterior, o clima ficou ainda mais tenso após declarações do ex-presidente americano Donald Trump, que afirmou que os EUA “calculam um grande aumento de tarifas sobre produtos chineses”, em resposta à decisão de Pequim de restringir exportações de terras-raras, insumos estratégicos para a indústria tecnológica.

A China reagiu dizendo que o controle sobre as exportações tem como objetivo proteger seus “interesses e segurança nacional”, o que intensificou o sentimento de aversão ao risco e provocou novas quedas nas bolsas internacionais.

Para o economista André Valério, parte da alta do dólar também reflete ajustes de posição e realização de lucros, já que o real vinha registrando ganhos expressivos nos últimos meses, liderando o desempenho entre moedas emergentes em 2025.

Mesmo com as preocupações fiscais e a tradicional piora sazonal do fluxo cambial no fim do ano, Valério avalia que a tendência de manutenção da Selic em 15% e a expectativa de novos cortes de juros nos Estados Unidos podem limitar o impacto negativo sobre o real nos próximos meses.

“A diferença entre os juros internos e externos continua atraente. Isso pode segurar parte da pressão, mesmo com o cenário fiscal desafiador”, afirmou o economista.