Estados falham na transparência de emendas e obras públicas, aponta relatório
Apenas três unidades da federação divulgam integralmente informações sobre emendas; maioria omite dados ou presta contas de forma incompleta
GESTÃO PÚBLICAUm levantamento da Transparência Internacional revelou deficiências sérias na divulgação de dados por parte dos governos estaduais sobre a destinação de emendas parlamentares e a execução de obras públicas. A análise, presente na edição 2025 do Índice de Transparência e Governança Pública (ITGP), indica que apenas Acre, Minas Gerais e Distrito Federal prestam contas completas sobre o uso de recursos via emendas estaduais.
A falta de clareza sobre essas informações preocupa, especialmente com o avanço das emendas parlamentares como instrumento de repasse de verbas públicas. No governo federal, esse modelo já representa metade dos gastos discricionários, com valores que chegam a R$ 50 bilhões.
A média nacional ficou em 69,8 pontos, considerada “boa”. No entanto, os dados revelam que 23 estados ainda falham em apresentar informações completas sobre as emendas estaduais. No caso das chamadas “emendas Pix” — transferências diretas aos caixas de estados e municípios — 13 governos estaduais não divulgam sequer os planos de trabalho, contrariando normas legais e decisões do Supremo Tribunal Federal.
O Espírito Santo lidera o ranking com 95 pontos, seguido por Goiás (93), Minas Gerais (89), Ceará (89) e o Distrito Federal (85). Esses estados foram classificados como “ótimos” no índice.
Entre os 10 primeiros colocados, também estão Alagoas, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Amazonas e São Paulo, todos com desempenho considerado entre bom e ótimo.
Na outra ponta, os estados com avaliação mais baixa foram Amapá (47), Roraima (48), Acre (50), Piauí (51) e Sergipe (51). Esses receberam avaliação “regular” e concentram os piores indicadores de transparência e governança.
Procurado, o governo de Sergipe foi o único a se manifestar. Admitiu o desempenho fraco, mas ressaltou avanços desde 2022. Naquele ano, o estado pontuou 36,2. Em 2025, chegou a 51,5 após recursos, o que representa um crescimento superior a 40%. Segundo o governo, o progresso decorre de ações estruturantes lideradas pela Secretaria de Estado da Transparência e Controle (SETC), com foco em acesso à informação e integridade institucional.
A ausência de informações detalhadas sobre emendas estaduais é hoje um dos principais gargalos de transparência. O levantamento mostra que o Pará, por exemplo, não disponibiliza qualquer dado sobre o tema. Já no caso das emendas federais, 12 estados não divulgam nenhuma informação, apesar da crescente relevância dessas transferências no orçamento público.
O modelo das chamadas “emendas Pix” tem se espalhado: 20 estados já incorporaram esse formato em seus próprios orçamentos. No entanto, a falta de controle sobre o destino do dinheiro levou o ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, a suspender repasses desse tipo em determinados casos, cobrando o cumprimento do princípio da rastreabilidade do gasto público.
A gestão de obras públicas é outro ponto crítico identificado. Apenas três estados divulgam o nível de execução física dos projetos, e apenas cinco informam os dados financeiros. A maioria não informa localização, percentual de conclusão, atrasos ou paralisações — e muito menos imagens que comprovem o andamento das obras.
Para Renato Morgado, gerente de Programas da Transparência Internacional, a baixa transparência amplia o risco de corrupção. “A ausência de dados reduz o debate público e fragiliza o controle social. Além disso, as emendas têm fragmentado a capacidade do Estado de implementar políticas públicas com foco em resultados”, afirma.
Apesar das falhas, houve avanços em relação ao levantamento anterior, de 2022. O estudo atual avaliou 106 critérios, contra 84 da edição anterior. Dos 47 critérios comparáveis, 30 apresentaram melhora. O número de estados que divulgam dados sobre benefícios fiscais, por exemplo, subiu de 10 para 22.
Outros avanços ocorreram na regulamentação da Lei Anticorrupção (de 20 para 23 estados), na criação de regras contra nepotismo (de 16 para 20) e na proteção a denunciantes (de 2 para 9). Houve também aumento no número de estados com normas para gestão de conflitos de interesse (de 14 para 18) e na divulgação de interações com grupos de interesse (de 2 para 7).
Mesmo com esses avanços, a entidade aponta que apenas seis estados mantêm conselhos ativos de combate à corrupção com participação da sociedade civil. E só nove possuem mecanismos que garantem anonimato aos denunciantes.
O estudo também monitorou a adoção de medidas previstas na nova Lei de Licitações, como a exigência de programas de integridade em obras públicas acima de R$ 200 milhões — ponto que segue com baixa adesão nos estados.