Hidrogênio verde pode revolucionar produção de aço e reduzir emissões no Brasil
Pesquisa da USP mostra que uso do H pode substituir o carvão nas siderúrgicas; tecnologia já avança em países como Suécia e Alemanha
TRANSIÇÃO ENERGÉTICADo alto de pontes, arranha-céus, navios e carros, há uma herança escondida: toneladas de dióxido de carbono (CO) emitidas na produção do aço que sustenta essas estruturas. A siderurgia é responsável por cerca de 7% das emissões globais de gases de efeito estufa, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA).
Uma pesquisa desenvolvida na USP oferece alternativa para mudar esse cenário. A engenheira química Patrícia Metolina propõe o uso do hidrogênio verde no processo de transformação do minério de ferro em aço, substituindo o coque de carvão. Nesse modelo, o subproduto deixa de ser CO para ser apenas vapor d’água.
A tese rendeu a Patrícia o prêmio de melhores pesquisas da universidade e coloca o Brasil em uma rota estratégica para a transição energética. “O país tem vantagens naturais, como o potencial de geração solar e eólica, que permitem a produção de hidrogênio em grande escala e a custos mais baixos”, explica.
Enquanto no Brasil a tecnologia ainda não chegou às siderúrgicas, a Suécia já validou projetos-piloto de “aço verde” em escala industrial. Grandes companhias do setor têm direcionado bilhões em investimentos para reduzir suas emissões e atender à crescente demanda por soluções sustentáveis.
No Brasil, o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) lançaram recentemente o Portal Brasileiro de Hidrogênio, plataforma que reúne dados estratégicos e busca atrair investidores.
De acordo com o Hydrogen Council, a demanda por hidrogênio deve multiplicar por cinco até 2050. Hoje, existem mais de 1.500 projetos em andamento no mundo, com destaque para Alemanha, Arábia Saudita, Austrália, China, Chile, Espanha e Holanda.
Na América Latina, o Brasil concentra iniciativas de peso. Apenas no Complexo de Pecém (CE) estão previstos bilhões em projetos ligados à produção de amônia, metanol e fertilizantes nitrogenados. Minas Gerais e Pernambuco também abrigam investimentos relevantes.
Apesar do otimismo, especialistas apontam entraves como custos elevados de eletrolisadores, falta de infraestrutura de transporte e armazenamento, além de necessidade de marco regulatório claro.
Na UFRJ, uma planta-piloto inaugurada em 2023 enfrenta dificuldades para manter eletrolisadores importados em funcionamento e obter água adequada ao processo. “Qualquer tecnologia no início custa caro, mas a urgência climática não permite adiar. Com investimento, os preços caem e o hidrogênio se torna competitivo”, afirma a professora Andrea Santos, da Coppe/UFRJ.
Se consolidado, o uso do hidrogênio verde poderá transformar a siderurgia em um dos setores mais sustentáveis do mundo, além de abrir novas frentes de negócios para o Brasil. O país reúne recursos naturais, experiência em energias renováveis e uma indústria que pode se reposicionar globalmente.
“Cada tonelada de aço verde produzida é menos CO lançado na atmosfera. É nisso que está o verdadeiro valor dessa transição”, resume Patrícia Metolina.