'PEC da Blindagem' avança na Câmara e reforça proteção a parlamentares contra ações penais
Proposta aprovada por ampla maioria exige aval da Câmara e do Senado para prisões e processos contra deputados e senadores
POLÍTICAA Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (16), em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita a possibilidade de prisão e abertura de processos criminais contra parlamentares sem o aval do Congresso. Apelidada de "PEC da Blindagem", o texto recebeu apoio expressivo em plenário: foram 353 votos a favor no primeiro turno e 344 no segundo.
A proposta determina que deputados e senadores só poderão ser presos em flagrante por crimes inafiançáveis e que qualquer ação penal contra eles deverá ser autorizada previamente pela respectiva Casa Legislativa. A votação provocou forte reação de parte da oposição, que vê na medida uma tentativa de proteger políticos de investigações e processos judiciais.
Durante a votação dos destaques no segundo turno, já na madrugada de quarta-feira (17), um ponto polêmico do texto foi derrubado: o trecho que previa votação secreta para autorizar processos contra parlamentares. Com isso, qualquer decisão nesse sentido deverá ocorrer de forma aberta.
Após a retirada desse trecho, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), decidiu suspender a sessão, deixando para concluir a análise dos destaques restantes ainda nesta quarta-feira. Com a votação finalizada, a PEC seguirá para o Senado.
Hugo Motta justificou a inclusão da proposta na pauta como uma forma de reafirmar a autonomia do Poder Legislativo. "Diante de muitos atropelos e abusos contra colegas em diversas situações, a Câmara tem hoje a oportunidade de retomar esse texto constitucional", afirmou durante a sessão.
A decisão de votar a PEC foi tomada após uma reunião com líderes partidários, apesar da tentativa de retirada de pauta ter sido rejeitada com poucos votos. Segundo um interlocutor ouvido pela imprensa, havia expectativa de aprovação com até 360 votos.
O uso do registro de presença remota por parte de deputados também gerou questionamentos. Parlamentares do PSOL acusaram a Mesa Diretora de fazer uma "manobra" ao permitir participação semipresencial sem a devida antecedência, o que teria inflado o quórum da votação.
Equilíbrio entre os poderes
O deputado Cláudio Cajado (PP-BA), relator da proposta, defendeu o texto como uma medida para reequilibrar as relações entre os poderes. Ele argumenta que a mudança visa garantir que apenas denúncias com indícios concretos avancem contra parlamentares, evitando, segundo ele, ações motivadas por pressões externas.
"O modelo que estamos propondo é o mais democrático, pois permite à Casa Legislativa avaliar se há elementos mínimos para justificar uma ação penal", disse Cajado.
Segundo ele, a alteração feita em 2001 que retirou do Congresso o poder de autorizar a abertura de processos teria enfraquecido o Legislativo. "É necessário garantir aos congressistas, no exercício de seus mandatos, plena liberdade, resguardando a separação dos poderes e a democracia", afirmou.
Mudanças previstas pela PEC
Entre os principais pontos da proposta, destacam-se:
- Parlamentares só poderão ser presos em flagrante por crimes inafiançáveis.
- A abertura de processos criminais dependerá de autorização da Câmara ou do Senado.
- O Congresso terá até 90 dias para decidir sobre o pedido de autorização.
- Em caso de prisão em flagrante, o caso deve ser comunicado ao Legislativo em até 24 horas.
- A recusa em autorizar o processo suspende o prazo de prescrição do crime enquanto durar o mandato.
A PEC também estende foro por prerrogativa de função aos presidentes nacionais de partidos com representação no Congresso, o que beneficiaria diretamente nomes como Valdemar da Costa Neto (PL), Gilberto Kassab (PSD) e Antônio Rueda (União Brasil).
Outro ponto do texto limita a aplicação de medidas cautelares, como bloqueio de bens, a decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), impedindo que instâncias inferiores determinem essas ações contra deputados e senadores.
Apesar das críticas que classificam a medida como tentativa de blindagem, Cajado afirmou que o objetivo não é criar privilégios individuais, mas proteger o funcionamento do Poder Legislativo. "Trata-se de uma prerrogativa institucional, não de um benefício pessoal. A independência entre os Poderes depende do respeito mútuo", declarou.
Com a aprovação da PEC, o debate agora se desloca para o Senado, onde a proposta também precisará passar por dois turnos de votação para ser promulgada.