Anna Muylaert finaliza 'Geni e o Zepelim', filme inspirado em canção de Chico Buarque
Longa estrelado por Ayla Gabriela traz nova versão da personagem 'Geni' e aposta em uma narrativa simbólica com desfecho diferente da canção
CINEMAA diretora Anna Muylaert, conhecida por obras que questionam padrões sociais como Que horas ela volta?, está na fase de pós-produção de seu novo longa, Geni e o Zepelim. O filme parte da canção homônima de Chico Buarque, lançada em 1978, mas não adapta a peça Ópera do Malandro. Em vez disso, constrói uma narrativa própria baseada apenas na letra da música.
“Diferentemente da música, a nossa Geni terá um final feliz”, adianta Muylaert. Para a cineasta, o longa é “uma fábula de guerra”, com forte carga simbólica e dramática, mas sem cair no panfletarismo. “Assim como a música e o conto Bola de Sebo, não é panfletária, é dramaturgia”, explica.
A personagem central será interpretada pela atriz trans Ayla Gabriela. Inicialmente, uma atriz cis havia sido escalada, mas a decisão gerou críticas e levou à mudança. Muylaert reconhece a importância da presença de Ayla para o novo rumo do projeto. “O cinema é essa coisa múltipla, são os atores, e a Ayla contribuiu tremendamente. A câmera, o elenco, futuramente a trilha. Ele é tudo isso junto”, afirma.
As gravações aconteceram entre abril e junho em Cruzeiro do Sul, no Acre, em plena floresta amazônica. A escolha surpreendeu até a equipe. “Quando a Anna falou que queria fazer na floresta, eu levei um susto. Mas ela disse: ‘tem que ser floresta, a Geni é floresta’. E trouxe um novo lugar de debate para a personagem”, conta a produtora Iafa Britz.
Ayla Gabriela, protagonista de 'Geni e o Zepelim', durante as filmagens que aconteceram entre abril e junho na floresta amazônica (Foto: Migdal Filmes/Divulgação)
O ambiente acabou conquistando todos. “É uma floresta encantada, muito afastada, de difícil acesso. Mas, uma vez que colocamos o pé lá, não cogitamos mais outro lugar. Foi ali que o filme nasceu de verdade”, completa.
Muylaert também escreveu o roteiro a partir das experiências vividas durante a estadia no local. Parte da equipe chegou a passar três semanas em um barco, em um processo de imersão total. Mesmo com dificuldades, como uma gripe que atingiu quase todos e a torção no pé da protagonista, a diretora classifica a vivência como mágica. “Foram 24 horas cercados por belezas — o pôr do sol, a bruma, as borboletas. Foi encantado”, relembra.
Apesar de ter como ponto de partida uma canção, o filme não será um musical. A trilha sonora terá papel central, utilizando trechos originais da música de Chico Buarque e sons regionais, mas sem números cantados pelos atores. Seu Jorge interpreta o Comandante do Zepelim, personagem que terá destaque na trama.
A montagem da equipe técnica seguiu critérios que priorizaram tanto a experiência quanto a generosidade. “Queríamos profissionais acima de 40 anos e acabamos reunindo pessoas acima de 50 e até de 60. Além disso, buscamos gente colaborativa. Às vezes não era o currículo mais impressionante, mas era a melhor pessoa, e isso fez toda a diferença”, conta Muylaert.
Para a produtora Iafa Britz, esse espírito coletivo remeteu a um tempo em que o cinema brasileiro se fazia de forma mais integrada. “Estávamos confinados, imersos, e a floresta nos uniu. Foi um reencontro raro com a essência do cinema brasileiro”, avalia.
Ainda sem data de estreia definida, Geni e o Zepelim revisita uma das personagens mais icônicas da música popular brasileira, mas agora sob um olhar inédito. Longe da dor que marcou a canção, a Geni de Muylaert ganha voz, cenário amazônico e a possibilidade de finalmente ser amada.