Câmara aprova urgência de projeto que trata de proteção de crianças em plataformas digitais
Texto deve ser votado nesta quarta; oposição critica celeridade e aponta risco de censura
NACIONALA Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira, 19, o regime de urgência para a tramitação do Projeto de Lei 2628/2022, que trata da proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital. A proposta, que ganhou força nas últimas semanas com apoio direto do presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), deverá ser votada novamente no plenário nesta quarta-feira, 20.
O projeto, de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), tem como objetivo central criar mecanismos para prevenir e combater a exposição precoce de crianças e adolescentes a conteúdos inadequados ou de caráter sexual em plataformas digitais, incluindo redes sociais e jogos online. O texto também propõe novas responsabilidades às empresas de tecnologia e prevê a criação de um órgão regulador para fiscalizar e aplicar sanções a quem violar os direitos do público infantojuvenil na internet.
A aprovação do regime de urgência — que permite acelerar a votação e dispensar etapas como o debate em comissões — ocorreu por votação simbólica, com oposição apenas de alguns parlamentares da ala conservadora, como Nikolas Ferreira (PL-MG) e Giovani Cherini (PL-RS).
Para Hugo Motta, o projeto representa uma atualização do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para o ambiente virtual. “Estamos diante de uma nova realidade e precisamos garantir proteção às crianças também no universo digital”, afirmou. O deputado se envolveu pessoalmente na pauta após uma reunião com representantes da sociedade civil e autoridades do Judiciário, incluindo a juíza da Vara da Infância do Rio de Janeiro, Vanessa Cavalieri. Ela relatou casos graves de violência sexual e exposição digital precoce que ocorrem diariamente, o que teria sensibilizado o presidente da Câmara.
Apesar do apoio do governo e de parte significativa da base parlamentar, a proposta enfrenta resistência entre membros da oposição. O deputado Nikolas Ferreira se opõe, especialmente, ao trecho que obriga as plataformas a remover conteúdos ofensivos a crianças e adolescentes imediatamente após a notificação, mesmo sem decisão judicial. Ele argumenta que isso pode abrir espaço para censura.
Outro ponto criticado é a possibilidade de criação de uma nova autoridade nacional para fiscalizar e aplicar penalidades. Para Giovani Cherini, isso abre caminho para um controle excessivo das redes sociais. “Parece bom, mas não é. Quem vai julgar? Quais serão os critérios? Isso é uma tentativa de regular as redes sociais pela porta dos fundos”, disse o deputado.
Em resposta às críticas, o relator do projeto na Câmara, deputado Jadyel Alencar (Republicanos-PI), tem sinalizado abertura ao diálogo. Segundo ele, o texto está em constante revisão e pode ser ajustado conforme as sugestões de diferentes bancadas, inclusive da oposição. “Até agora não recebemos nenhuma sugestão de alteração de algum artigo do texto”, declarou Alencar, reforçando que o debate está aberto.
Na tentativa de construir consenso, o relator já promoveu alterações importantes no texto original enviado pelo Senado. Um dos principais recuos foi a retirada da expressão “dever de cuidado” atribuída às plataformas digitais — um conceito que incomodava os críticos por supostamente estimular a censura prévia de conteúdos.
O governo federal apoia o projeto nas duas Casas do Congresso. No Senado, o texto foi aprovado com ampla maioria, inclusive com votos de parlamentares da oposição, como Damares Alves (Republicanos-DF). Agora, o foco do Planalto é garantir que a versão aprovada na Câmara não sofra alterações substanciais, o que poderia forçar o retorno da proposta ao Senado e atrasar a sanção presidencial.
Para deputados da base governista, o texto busca estabelecer um novo equilíbrio entre as responsabilidades das famílias, do Estado e das plataformas digitais no cuidado com a infância. “O projeto é importante porque toma uma responsabilidade entre família, Estado e sociedade nesse âmbito das redes sociais”, afirmou a deputada Maria do Rosário (PT-RS), uma das principais defensoras da proposta dentro da Câmara.
Além de estabelecer critérios mais claros para a atuação das plataformas, o projeto também propõe a ampliação de campanhas de conscientização sobre os riscos da exposição digital precoce e do consumo de conteúdo impróprio por crianças.
O que muda, na prática
O PL 2628 traz obrigações diretas às empresas de tecnologia e plataformas digitais, incluindo:
Remoção imediata de conteúdos nocivos a crianças e adolescentes, após notificação;
Regras específicas para jogos online acessados por menores;
Mecanismos de verificação de idade;
Responsabilidade legal por omissão em casos de violação dos direitos infantojuvenis;
Criação de um órgão regulador para fiscalização e aplicação de sanções.
A medida vem em meio a crescentes denúncias sobre a chamada “adultização infantil”, fenômeno que envolve a exposição precoce de crianças a conteúdos, linguagens e comportamentos típicos da vida adulta, muitas vezes de forma sexualizada.
A proposta tem apoio de diversas entidades da sociedade civil que lidam com o combate à violência sexual e à exploração infantojuvenil. Em nota, essas organizações afirmam que o projeto representa um avanço na proteção de crianças em um ambiente digital cada vez mais acessível e desregulado.