Dow Jones | 27 de julho de 2025 - 17h15

Dependência da China em terras raras expõe fragilidade do Japão e acende alerta nos EUA

Mesmo após investimentos bilionários, Japão ainda importa 70% das terras raras da China; cenário serve de lição para os americanos

GEOPOLITICA E ECONOMIA GLOBAL
No início deste século, foi a China, não o Japão, que passou a dominar o suprimento dos 17 elementos de terras raras - Foto: Reprodução

A recente decisão da China de impor restrições às exportações de terras raras em abril reacendeu um alerta já conhecido no Japão — e que agora também chama a atenção dos Estados Unidos. Os dois países, grandes consumidores desses metais estratégicos, enfrentam dilemas semelhantes: como reduzir a dependência de Pequim sem comprometer a viabilidade econômica de suas indústrias.

Para os americanos, a movimentação chinesa em 2024 foi uma surpresa geopolítica com potencial de impacto direto sobre cadeias produtivas sensíveis. Para os japoneses, no entanto, foi um déjà vu. Em 2010, o Japão viveu uma crise parecida quando a China usou seu domínio no setor como instrumento de pressão diplomática durante um impasse territorial. Apesar de promessas de mudança desde então, Tóquio ainda depende da China para cerca de 70% de suas importações de terras raras, segundo a Organização Japonesa para Segurança de Metais e Energia (Jogmec).

As chamadas terras raras — um grupo de 17 elementos químicos utilizados em eletrônicos, baterias, turbinas e armamentos — tornaram-se peças-chave da disputa econômica entre potências. A China domina não apenas a extração desses metais, mas também o refino e a produção de ímãs à base de neodímio, térbio e disprósio, itens críticos para carros elétricos, equipamentos militares e tecnologia de ponta.

A crise de 2010 e a resposta tardia

O estopim da crise em 2010 foi a colisão entre um barco de pesca chinês e navios de patrulha japoneses perto de ilhas disputadas no Mar da China Oriental. Após a detenção do capitão chinês, o fornecimento de terras raras ao Japão foi interrompido — uma ação não oficialmente reconhecida por Pequim, mas relatada amplamente por empresas japonesas como represália.

Desde então, o Japão reconheceu sua vulnerabilidade, mas demorou mais de uma década para reagir de forma estrutural. "As pessoas aqui entenderam o problema, mas ainda assim continuaram dependendo da China porque não havia outras opções viáveis", afirmou Kazuto Suzuki, professor da Escola de Políticas Públicas da Universidade de Tóquio.

Avanços recentes e limitações

Somente em 2023, o governo japonês avançou com investimentos estratégicos no setor. A Jogmec e a gigante comercial Sojitz injetaram 200 milhões de dólares australianos (cerca de US$ 130 milhões) na mineradora australiana Lynas, que iniciou a produção de disprósio e térbio — metais dos quais até 65% serão destinados ao Japão.

Além disso, a Jogmec e a empresa de energia Iwatani anunciaram em março de 2024 um aporte de €110 milhões (cerca de US$ 129 milhões) na francesa Carester, que desenvolve uma planta de refino capaz de suprir até 20% da demanda japonesa por disprósio e térbio.

Mesmo com esses movimentos, os números mostram que a dependência ainda é alta: cerca de 70% das terras raras consumidas no Japão em 2023 vieram da China, conforme dados da Jogmec. Há esforços também para aumentar a produção local de ímãs, reduzir a quantidade de terras raras utilizada nas ligas metálicas e investir em reciclagem, mas essas soluções têm impacto limitado no curto prazo.

Lição para os EUA

O cenário japonês serve como alerta aos Estados Unidos, que também foram impactados pelas restrições chinesas em 2024. Embora Washington tenha conseguido, por ora, convencer Pequim a aliviar as medidas dentro de um acordo comercial, analistas apontam para a vulnerabilidade estrutural do Ocidente nesse setor.

"Se os custos não forem levados em conta, reduzir a dependência da China é viável. Mas as empresas não conseguem absorver essas despesas", explica Suzuki. A declaração expõe o desafio de países que, apesar da consciência do risco, têm dificuldades em investir em cadeias de fornecimento mais caras ou menos eficientes fora da China.

No início dos anos 2000, a China passou de exportadora limitada a controladora quase absoluta do mercado global de terras raras, processo que incluiu barreiras ambientais mais brandas, subsídios estatais e integração vertical da produção — do minério ao produto final.

Nova corrida estratégica

Hoje, o Japão busca acelerar sua transição para um modelo mais independente. Mas, como indica o histórico recente, a construção de uma cadeia alternativa confiável exige tempo, dinheiro e apoio coordenado entre governos e setor privado.

Ao mesmo tempo, cresce o debate internacional sobre diversificação de fornecedores, com países como Austrália, Canadá, Malásia e Estados Unidos tentando viabilizar projetos de exploração e refino em larga escala.

A União Europeia e os Estados Unidos também começaram a considerar estoques estratégicos de terras raras e a criação de fundos públicos para subsidiar indústrias que dependem desses elementos.

Mas se o Japão, pioneiro nas advertências, ainda sofre com gargalos mais de uma década depois, os países que começam agora a trilhar esse caminho terão que agir com mais rapidez e visão de longo prazo, sob o risco de ver suas indústrias vulneráveis à pressão geopolítica.