Utopia do possível: o que a Faculdade Sírio-Libanês ensina sobre os rumos da saúde no Brasil?
Enquanto o SUS enfrenta apagões de profissionais e infraestrutura precária, novo curso de Medicina do Sírio-Libanês propõe uma formação de excelência com olhar para o futuro e um alerta para o presente
SAÚDE DO FUTUROImagine um hospital de excelência, onde a formação médica não começa com decorebas de livros, mas com o toque, o escuta e a dignidade humana.
Agora imagine esse mesmo modelo sendo aplicado em um curso de Medicina, estruturado desde o 1º dia para formar profissionais capacitados, éticos e inovadores. Essa é a proposta da nova graduação em Medicina da Faculdade Sírio-Libanês, e que já desperta debates sobre o futuro da saúde brasileira.
O jornal A Crítica foi convidado a visitar as instalações do curso e participou do debate, “Os desafios da formação médica no Brasil”, que reuniu Christian Morinaga, coordenador da graduação em Medicina da Faculdade Sírio-Libanês; Luiz Fernando Lima Reis, diretor de Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês; e Denizar Vianna, professor titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e ex-secretário do Ministério da Saúde. A mediação ficou a cargo de Denise Greff Machado, gerente de Ensino da Faculdade.
“O desafio é garantir uma formação que dialogue com a realidade social brasileira. Não se trata apenas de formar médicos competentes do ponto de vista técnico, mas profissionais que compreendam a complexidade do SUS, que saibam atuar em diferentes níveis de atenção à saúde e que estejam preparados para lidar com desigualdades sociais extremas”, afirmou Denizar. Ele acrescentou: “Precisamos superar o modelo hospitalocêntrico e avançar para uma formação que valorize a atenção primária, a medicina de família, e o cuidado longitudinal.”
Por sua vez, Christian Morinaga, destacou que a proposta curricular foi desenhada para provocar uma ruptura positiva. “Nosso modelo curricular se apoia na interdisciplinaridade, na integração precoce com a prática clínica e em metodologias ativas de aprendizagem. O estudante não vai esperar o internato para ter contato com pacientes - desde o início, ele estará inserido em contextos reais, aprendendo a escutar, a observar, a agir com empatia.”
E completou: “Acreditamos em um médico que não seja apenas excelente na técnica, mas que compreenda o sofrimento humano. Isso só se aprende com vivência, com escuta ativa, com compromisso ético", reforça.
O curso de Medicina do Sírio-Libanês contará com 100 vagas anuais, divididas em 12 semestres e uma carga horária robusta de 8.600 horas. Quase a totalidade do corpo docente é formada por doutores, com média de 17 anos de experiência clínica e nove anos no ensino. O que o modelo do Sírio-Libanês mostra é que é possível, sim, investir em uma formação médica de ponta, com foco humanizado, e profundamente conectada à ciência e à realidade social. Mas a pergunta que resta é: por que esse modelo ainda é exceção?
Uma medicina que escuta antes de prescrever - A gerente de Ensino da Faculdade Sírio-Libanês e moderadora do debate, Denise Greff Machado, reforçou que o diferencial da formação está no equilíbrio entre ciência e sensibilidade.
“Mais do que formar técnicos com domínio de protocolos e procedimentos, queremos formar médicos que saibam olhar nos olhos de seus pacientes, que compreendam o contexto onde essas pessoas vivem, que tenham repertório para tomar decisões difíceis em situações de vulnerabilidade. A medicina do futuro não será apenas tecnológica, será profundamente humana", diz.
Ela continuou: “Não adianta sabermos tudo sobre o tratamento mais moderno para uma doença se não conseguimos ouvir o que o paciente tem a dizer. Essa é uma mudança profunda que estamos propondo, e que precisa ser levada para todo o país", explica.
Outro ponto abordado no debate foi o papel da tecnologia. O diretor de Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, Luiz Fernando Lima Reis, lembrou que inovações como a inteligência artificial e a telemedicina já são parte do cotidiano dos grandes centros, mas que seu uso deve sempre preservar o vínculo médico-paciente.
“A tecnologia pode, e deve, ser usada para ampliar o acesso e a eficiência do sistema. Mas ela jamais poderá substituir o elemento humano da medicina. A empatia, o toque, a escuta, o acolhimento... isso nenhuma máquina faz. O grande desafio é equilibrar os avanços tecnológicos com uma formação médica que mantenha o vínculo com o paciente no centro.”
Nas salas de aula da nova faculdade, essa filosofia será incorporada desde o primeiro módulo. Mas em muitos postos de saúde do país, inclusive, no interior do MS, o que falta não é tecnologia de ponta, e sim luvas, soro, e tempo de consulta.
Mais do que formar médicos: formar transformadores - A expectativa é de que os estudantes da Faculdade Sírio-Libanês não apenas atuem nos hospitais de referência, mas que sejam agentes ativos de mudança no sistema de saúde como um todo. Para isso, o curso investe pesado em disciplinas ligadas à saúde pública, políticas de saúde, e ética médica.
Morinaga reforçou esse ponto: “Não queremos apenas formar médicos que tenham bons currículos. Queremos formar lideranças que entendam o sistema de saúde brasileiro e queiram atuar ativamente para transformá-lo. A medicina precisa voltar a ser vocação, precisa ser um projeto de vida com propósito coletivo", reforça.
A graduação em Medicina chega para integrar o portfólio acadêmico da Faculdade Sírio-Libanês, que já conta com outros quatro cursos autorizados pelo MEC: Enfermagem, Psicologia, Fisioterapia e, mais recentemente, Biomedicina.
Somente nas últimas duas décadas, foram mais de 3.800 estudos publicados e mais de 100 mil citações em revistas científicas nacionais e internacionais, um diferencial que fortalece a formação acadêmica e o compromisso com a inovação em saúde.
*O jornalista Carlos Guilherme, representando o jornal A Crítica, foi convidado pela Faculdade Sírio-Libanês para acompanhar presencialmente o Workshop de Jornalismo em Saúde: Experiência Sírio-Libanês e conhecer, as instalações e propostas pedagógicas da instituição.