Rafael Rodrigues | 11 de maio de 2025 - 14h00

Empresário morre em cirurgia capilar, mãe e filhas vencem luto e aprendem a tocar negócio milionário

Conheça a história de superação da família que enfrentou a ausência do fundador do negócio e manteve ativa a distribuidora de produtos de multinacionais como Kraft Heinz e SC Johnson

SUPERAÇÃO
Carolyne (à esquerda), Luciana (no centro) e Rafaela Dal Berto, donas do Grupo Disdal. - (Foto: Divulgação/Grupo Disdal)

Do dia para a noite, a vida da família Dal Berto mudou completamente em 2022. Os donos da Disdal Distribuidora, de Brasília, perderam o fundador da empresa, Clair Dal Berto, que morreu em uma cirurgia de transplante capilar, aos 50 anos. A Disdal atua na distribuição de alimentos, produtos de limpeza e higiene pessoal de gigantes multinacionais como Kraft Heinz, Mondelez e SC Johnson.

A viúva do empresário, Luciana Dal Berto, de 48 anos, e as filhas, Carolyne, de 32, e Rafaela, de 28, precisaram lidar com o luto e, ao mesmo tempo, decidir se venderiam ou aprenderiam a tocar o negócio. Escolheram manter a empresa na família e enfrentar o desafio de assumir uma operação com mais de 1,7 mil funcionários em plena expansão.

Juntas, conseguiram manter a empresa no ritmo de crescimento sonhado por Clair: entre 2020 e 2024, o Grupo Disdal - que inclui a distribuidora e outras quatro empresas -, registrou um aumento de 41% no faturamento e chegou a R$ 810 milhões.

Disdal nasceu em 2006 e atua no Centro-Oeste e Norte do Brasil

Luciana casou com Clair na década de 1990, aos 15 anos. Menos de um ano depois, eles tiveram a primeira filha. Na época, o empresário tinha fundado um atacado de doces em Francisco Beltrão (PR) e tinha dois irmãos como sócios. Antes, eles vendiam os produtos pela cidade com uma van que haviam ganhado do pai.

O negócio cresceu e, no início dos anos 2000, eles já atendiam toda a região Sul do País e administravam alguns supermercados. Em 2004, a família Dal Berto recebeu uma proposta para se tornar sócia de uma distribuidora de alimentos que atuava no Centro-Oeste e no Norte do Brasil.

Os irmãos aceitaram a proposta e Clair saiu de Curitiba (PR) para Cuiabá (MT) com a esposa e as filhas. Um ano depois, eles encerraram a parceria. “A sociedade não deu certo, porque tínhamos objetivos e visões de mercado diferentes”, afirma Luciana.

Clair e os irmãos ficaram com as unidades do Acre, Distrito Federal, Goiás e Rondônia.

Luciana, que é formada em Direito, participou de todas as fases e se mudou para Brasília com o fim da sociedade. “Antes, a matriz da distribuidora era em Cuiabá. A filial de Brasília era pequena e não tinha processos definidos. Estava abandonada”, conta. “Ela faturava R$ 1 milhão, mas dava 10% de prejuízo todo os meses”.

Eles reestruturam a empresa e mudaram o nome para Disdal, em 2006. Três anos depois, os irmãos resolveram dividir o negócio: Clair e Luciana ficaram com a distribuidora, um dos irmãos ficou com o atacado e o outro com os supermercados.

Filhas do casal sempre quiseram trabalhar no negócio

Hoje a Disdal trabalha com a distribuição de marcas como Kraft Heinz, Mondelez, Nissin, Red Bull e SC Johnson e atende a mais de 19 mil pontos de venda no Acre, no Distrito Federal, em Goiás e em Rondônia. Até 2022, Clair ocupava o cargo de CEO da empresa e Luciana era a responsável pelo financeiro e operação.

Os filhos do casal cresceram junto com a Disdal. Além de Carolyne e Rafaela, há outro filho, Lucas, de 15 anos. As duas irmãs mais velhas são administradoras por formação.

Carolyne chegou a abrir um salão de beleza na época da faculdade, mas fechou o negócio aos 21 anos para ser trainee na Disdal.

“Meus pais perguntavam se eu não queria ter qualquer outra profissão que não envolvesse a empresa, mas eu nunca quis, sempre quis trabalhar aqui”, comenta.

Ela passou por todas as áreas do setor administrativo até se tornar o braço direito da mãe e chefiar o departamento financeiro.

Rafaela começou a trabalhar na Disdal aos 18 anos: “Eu fazia faculdade de manhã e trabalhava à tarde como vendedora”. Ela fez o trainee, assim como a irmã, mas no setor comercial da empresa. Em 2017, a filha do meio fundou o Armazém da Rafa, negócio focado na venda de produtos próximos ao vencimento. Dois anos depois, a jovem passou a acumular a função de diretora de marketing do Grupo Disdal.

Morte de Clair transformou o trio em líderes do dia para a noite

As irmãs contam que sempre foram preparadas para uma sucessão e sabiam que esse dia chegaria. Elas só não imaginavam que seria de forma tão repentina. Clair morreu por complicações em uma cirurgia de transplante capilar em abril de 2022.

“Foi uma sensação de pânico. Ele sempre falava que a vida empresarial é uma passagem de bastão, mas, no nosso caso, não foi algo natural”, diz Luciana. “O bastão foi jogado para o ar e nós só tínhamos duas opções: pegar e continuar correndo ou deixar cair e desmoronar tudo.”

Carolyne afirma que a família chegou a pensar em vender o negócio, mas que não conseguia se imaginar fora do dia a dia da distribuidora.

Em pé, Luciana e Clair com o filho Lucas; embaixo, Carolyne (à esquerda) e Rafaela - (Foto: Divulgação/Grupo Disdal)

O que manteve a Disdal de pé no primeiro ano sem o fundador foi o apoio da equipe. “No começo, todo mundo tinha medo de que a gente não fosse dar sequência na empresa”, conta Luciana. “Mas todos, do menor cargo até os diretores, trabalharam um pouco mais para segurar as pontas enquanto estávamos imobilizadas pelo luto.”

Aos poucos, elas retomaram o trabalho e se dividiram: Luciana assumiu a posição de CEO do Grupo Disdal, Carolyne passou a ser diretora do financeiro e operacional, cargo que era da mãe, e Rafaela se tornou diretora comercial da Max Distribuidora, empresa adquirida por Clair poucos meses antes da sua morte, além de manter a função de diretora de marketing do grupo.

Para as irmãs, um dos principais desafios foi lidar com o poder repentino nas decisões da empresa. “Nós deixamos de ser filhas do dono para ser donas, passamos a ter a palavra final. A responsabilidade foi grande, e a gente não teve muito tempo para pensar”, comenta Carolyne.

Elas contam que, no início, não queriam ir a eventos, por receio de como seria falar sobre a morte de Clair, mas, aos poucos, entenderam que era importante apresentar para o mercado a nova formação das lideranças da Disdal.

A família também contratou um profissional para ajudar a lidar com a pressão emocional. “Nós tivemos reuniões com ele por um ano, para alinhar o momento e o espaço de cada uma no negócio. Antes, quem mediava esses problemas era o meu pai, mas, sem ele, precisamos de ajuda para nos entender”, afirma Rafaela.

As três concordam que, em um setor dominado por homens, ter uma empresa com apenas mulheres na liderança foi um desafio. “Sinto que nos davam menos credibilidade, não sabiam se aguentaríamos a pressão. A gente precisa provar que é competente a todo momento”, diz a CEO do Grupo Disdal.

Empresa cresceu 41% nos últimos quatro anos

Rafaela diz que a família cogitou abrir mão da Max Distribuidora, mas decidiu manter todos os planos deixados pelo pai. “A gente tinha vários projetos quando ele faleceu. Em vez de voltar atrás, reagimos de um jeito que o mercado não esperava: continuamos com todas as metas”, pontua a diretora de marketing.

Além das duas distribuidoras e do Armazém da Rafa, o Grupo Disdal também opera outros dois negócios: a Mônaco Patrimonial, uma holding imobiliária, e a Ferrari Transportes, que gerencia os ativos imobilizados, com locação de empilhadeiras e prateleiras.

Empresa quer se expandir no Centro-Oeste e no Norte do País - (Foto: Divulgação/Disdal)

Entre 2020 e 2024, o Grupo Disdal teve alta de 41% no faturamento. No ano passado, a empresa teve uma receita de R$ 810 milhões. As donas atribuem o crescimento em meio à crise pessoal à estrutura do negócio, que já era sólida, e ao planejamento, que foi seguido à risca.

Uma das estratégias utilizadas para alavancar os números foi a conquista de parceiros relevantes, com valor agregado maior. Atrair novas marcas está nos planos para atingir a meta de faturamento de R$ 1 bilhão nos próximos anos, mas elas não pretendem ir para outros Estados.

A família também quer investir no desenvolvimento de executivos entre os funcionários do Grupo Disdal, para que o negócio não dependa apenas delas para sobreviver.

“É um choque reconhecer que não somos imortais, mas a empresa é feita para durar. Então a gente precisa de profissionais competentes e aderentes à nossa cultura para seguir com o nosso propósito”, conclui Luciana.

Avaliação de consumidores

A Disdal Distribuidora de Brasília recebeu uma classificação média de 4,4 de 5 estrelas no Google, com 548 avaliações até a publicação desta matéria. Os comentários positivos elogiam a qualidade e variedade dos itens comercializados e a estrutura para carga e descarga de caminhões. Já os negativos abordam atrasos no descarregamento dos produtos.

Os autores das notas concedidas não podem ser verificados. Eventualmente, avaliações positivas ou negativas podem ser uma ação a favor ou contra a empresa.

A marca não tem um perfil verificado no site Reclame Aqui.

Investir em sucessão é indispensável, diz especialista

A sucessão é um dos principais desafios para a sobrevivência das empresas, diz a professora da Fundação Dom Cabral (FDC) Elismar Álvares da Silva Campos, especialista em governança corporativa e curadora do projeto Family Business.

Ela explica que investir no desenvolvimento de um novo líder é o que faz com que a troca não tenha que acontecer de forma improvisada. “Se a pessoa assume por necessidade, sem estar de fato preparada, gera insegurança perante os acionistas e o mercado”, afirma.

Elismar aponta que a sucessão precisa estar no topo da lista de riscos para a longevidade da empresa. O único caminho para minimizar as incertezas é investir em um plano de sucessão, para desenvolver não só o futuro CEO, mas toda a equipe que atua com ele.

“Se a família deseja ter um sucessor entre os familiares, deve dar os primeiros passos desde muito cedo”, diz. Não há uma idade para iniciar esse processo, mas a professora aponta que algumas empresas familiares optam por definir o plano de transição antes mesmo de os sucessores começarem a trabalhar.

Não tratar esse processo como algo traumático também é um passo importante, segundo Elismar. A troca de lideranças precisa ser vista como uma chance de renovação e inovação, mas, é necessário que o candidato tenha as características, como disciplina e liderança, para fazer isso acontecer.

Se o negócio conta com um conselho, essa etapa de análise do perfil é responsabilidade dos membros. “Os conselheiros também deveriam ser avaliados por sua capacidade na escolha do CEO certo”, conclui.