Iury de Oliveira | 10 de maio de 2025 - 08h38

'As várias faces de Lídia Baís' celebra legado da artista no MIS em Campo Grande

Mostra integra a Semana Nacional de Museus e revisita a trajetória da artista que desafiou os padrões de sua época e marcou a cultura sul-mato-grossense

CULTURA
Exposição no MIS homenageia Lídia Baís e destaca seu legado artístico e resistência cultural em Campo Grande. - (Foto: acervo MARCO)

Será inaugurada nesta segunda-feira (12), às 19h, no Museu da Imagem e do Som (MIS), em Campo Grande, a exposição As várias faces de Lídia Baís, em comemoração aos 125 anos de nascimento da artista que desafiou as convenções sociais e transformou sua vivência íntima em arte. A mostra faz parte da programação da Semana Nacional de Museus de 2025, promovida pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), que ocorre de 12 a 18 de maio com o tema O futuro dos museus em comunidades em rápida transformação.

Sob curadoria do Museu de Arte Contemporânea (MARCO), a exposição apresenta obras emblemáticas de Lídia Baís, reconhecida como uma das maiores figuras femininas das artes visuais de Mato Grosso do Sul. A proposta é não apenas reverenciar sua produção artística, mas também revelar a complexidade de sua trajetória pessoal e espiritual.

Vida e obra marcadas por resistência e sensibilidade - Lídia Baís nasceu em 1900, em Campo Grande, então um pequeno vilarejo. De ascendência italiana, iniciou seus estudos em pintura no Rio de Janeiro, orientada por mestres como Henrique Bernardelli. Suas primeiras obras carregavam traços acadêmicos, mas já antecipavam a liberdade criativa influenciada pela Semana de Arte Moderna de 1922.

Em 1927, durante uma viagem à Europa, teve contato com o artista Ismael Nery, cuja amizade marcou sua visão artística. De volta ao Brasil, continuou seus estudos com os irmãos Bernardelli e Oswaldo Teixeira, chegando a realizar uma exposição individual no Rio de Janeiro em 1929. No entanto, a incompreensão e a pressão familiar a fizeram retornar a Campo Grande, onde sua arte encontrou pouca ressonância.

Apesar do isolamento cultural da época e do conservadorismo que limitava o papel feminino à esfera doméstica, Lídia resistiu. Pintava nas paredes do sobrado da família, encontrando forças em sua espiritualidade e numa incessante busca por sentido. Sua arte se tornou uma expressão íntima e simbólica, carregada de alegorias e questões existenciais.

Um museu sonhado antes mesmo da eletricidade - Nos anos 1950, quando Campo Grande sequer tinha energia elétrica em muitas áreas, Lídia ousou sonhar com a criação de um museu de arte. Embora o projeto do Museu Baís não tenha se concretizado em sua vida, o gesto carrega uma dimensão política e visionária sobre o papel transformador da cultura.

Lídia faleceu em 1985, vítima de esclerose múltipla, sozinha, cercada de animais e de um acervo artístico ainda não compreendido por sua cidade. Sua sobrinha, Nelly Martins, teve papel fundamental na preservação da memória da artista, organizando exposições e doando seu acervo à Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul.

Desde 1991, o Museu de Arte Contemporânea abriga esse valioso conjunto de obras, testemunho do talento e da resistência de Lídia.

Exposição convida à reflexão sobre arte e pertencimento - Segundo o diretor-presidente da Fundação de Cultura, Eduardo Mendes, "essa mostra oferece ao público a oportunidade de se aproximar da produção de Lídia Baís de maneira sensível e educativa, promovendo experiências que estimulam o olhar crítico, a reflexão sobre pertencimento e o reconhecimento de narrativas que, muitas vezes, foram invisibilizadas na história da arte brasileira".

A coordenadora do MARCO, Vera Bento, reforça que a mostra é também uma afirmação do papel dos museus como espaços vivos de memória, criação e formação crítica. "Lídia Baís é figura central na história da arte sul-mato-grossense. Com uma trajetória marcada por ousadia estética, inquietação espiritual e profunda consciência de seu tempo, construiu uma obra singular que articula elementos do sagrado, do feminino e da ancestralidade em composições densas e simbólicas", pontua.

Serviço: onde e quando visitar - A exposição As várias faces de Lídia Baís fica aberta à visitação até o dia 30 de junho, de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 17h30, no MIS Museu da Imagem e do Som. O MIS está localizado no 3º andar do Memorial da Cultura e da Cidadania, na Avenida Fernando Corrêa da Costa, 559, Centro de Campo Grande.

A entrada é gratuita e a visitação é recomendada para todos os públicos, com especial atenção para estudantes, pesquisadores e amantes da arte brasileira.