Ataque de onça em MS reacende debate sobre turismo e conservação no Pantanal
Especialistas alertam para risco de represálias contra a espécie e destacam que incidentes como esse são raríssimos e quase sempre provocados por ação humana
FAUNACaso do caseiro atacado e morto por uma onça-pintada em Aquidauana, no Pantanal sul-mato-grossense, provocou uma onda de comoção e preocupação entre ambientalistas e pesquisadores da fauna brasileira. Mais do que um evento trágico e isolado, o episódio reacende o debate sobre os impactos do turismo desordenado e da interação humana indevida com animais silvestres em regiões de rica biodiversidade.
Jorge Ávalo, de 60 anos, desapareceu no dia 21 de abril. No dia seguinte, seu corpo foi encontrado às margens do Rio Miranda com sinais de ataque por felino de grande porte. Ele trabalhava como caseiro em um pesqueiro na região do Touro Morto, conhecida pela presença de turistas e proximidade de áreas de mata nativa.
Especialistas alertam para risco de retaliação contra a espécie - Organizações ambientais temem que o ataque possa levar a caçadas ilegais contra a onça-pintada, animal símbolo da biodiversidade brasileira e essencial ao equilíbrio ecológico do Pantanal. O Instituto Homem Pantaneiro (IHP), que atua com a proteção de grandes felinos, destacou que a morte de um ser humano, embora grave, não deve ser usada como justificativa para ações de represália contra a espécie.
"A presença das onças é vital para o ecossistema e também movimenta a economia local por meio do turismo de observação", ressaltou o biólogo Gustavo Figueiroa, da ONG SOS Pantanal. "A onça-pintada é um animal reservado. Evita contato com humanos e, quando atacou, provavelmente foi atraída por fatores antrópicos, como restos de alimento ou cheiro de mel."
Pesquisadores apontam que a interferência humana pode ter sido decisiva. No local do ataque, há suspeita de ceva prática ilegal de deixar alimentos para atrair animais para visualização turística. Além de contrariar legislações federais e estaduais, essa prática altera o comportamento natural da fauna e aumenta o risco de conflitos.
A Semadesc (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação) confirmou que um grupo da Polícia Militar Ambiental e um especialista da UFMS foram deslocados à região para identificar a onça responsável. Em nota, a pasta ressaltou que as fortes chuvas recentes elevaram o nível dos rios Miranda e Aquidauana, dificultando os trabalhos de rastreamento.
Ataques são extremamente raros, dizem estudiosos - Embora fatal, o ataque a Jorge Ávalo é classificado por especialistas como raro. Figueiroa relata que já teve vários encontros com onças-pintadas a pé e que, na maioria dos casos, o animal apenas se afasta. "Não é da natureza delas atacar pessoas. Esse tipo de incidente só ocorre quando há perturbação, escassez de alimentos ou interferência humana direta."
A recomendação de segurança é clara: não correr, não se aproximar, fazer barulho e gestos para espantar o animal. Em regiões turísticas, a presença de restos de comida aumenta a frequência de encontros e interfere na dinâmica natural.
Um dia antes do ataque em Aquidauana, uma onça-pintada foi encontrada boiando no Rio Paraguai, próximo a Corumbá. O IHP, que acompanha ambos os casos, afirma que os episódios não estão relacionados, mas ressaltou que cada indivíduo perdido representa uma baixa relevante na conservação da espécie.
"As mortes de onças-pintadas têm impacto direto no equilíbrio do bioma. Precisamos mais do que nunca apostar na ciência, inclusive na ciência cidadã, para aprender a conviver com esses animais e proteger o Pantanal como um todo", concluiu o instituto em nota.