'Ela seguiu todos os passos, mas foi assassinada', diz delegada sobre jornalista morta por ex-noivo
Vítima solicitou medida protetiva um dia antes do crime, mas agressor ainda não havia sido notificado
FEMINICÍDIO"Ela seguiu todos os procedimentos corretos". Essa foi a fala da delegada titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), Elaine Benicasa, nesta quinta-feira (13) sobre o feminicídio da jornalista Vanessa Ricarte, 42, cometido ontem (12), em Campo Grande. A profissional que iria completar 43 anos neste domingo (16), foi a primeira mulher assassinada na Capital.
Mesmo seguindo todos os procedimentos corretos – registrando boletim de ocorrência, solicitando medida protetiva e buscando apoio policial –, Vanessa foi assassinada pelo ex-noivo, Caio Nascimento Pereira, 35, dentro de casa.
"Ela seguiu todos os procedimentos corretos. Vanessa compareceu à delegacia, solicitou a medida protetiva, e a medida foi deferida rapidamente, ainda durante o plantão, antes mesmo do prazo estipulado pelo juiz", disse. No entanto, a intimação formal do agressor ainda não havia ocorrido, o que comprometeu a eficácia imediata da proteção concedida.
Na madrugada anterior ao crime, Vanessa chegou a procurar a delegacia para denunciar o então companheiro, com quem mantinha um relacionamento há quatro meses. O homem, que morava na casa da vítima, era usuário de cocaína e possuía um histórico de crimes e violência doméstica contra a mãe e a irmã.
Na denúncia, a jornalista relatou que vinha sendo ameaçada e solicitou uma medida protetiva, prontamente deferida pelo Poder Judiciário. No dia seguinte, preocupada com a situação, retornou à delegacia para verificar o andamento do processo e recebeu a confirmação da medida.
"Foi sugerido que ela permanecesse no abrigo até que a intimação fosse realizada. No entanto, por ser proprietária da casa e entender que ele não tinha o direito de estar ali, Vanessa recusou o abrigo. Ela acreditava que estaria segura dormindo na casa de um conhecido e decidiu apenas retornar à residência para buscar seus pertences", diz.
No entanto, ao chegar em casa acompanhada de um amigo, encontrou o agressor no local, visivelmente alterado. A partir desse momento, o cenário de violência escalou rapidamente. Ao ser confrontado por Vanessa, o agressor inicialmente pareceu concordar em sair, mas, enquanto o amigo da vítima fazia uma ligação pedindo ajuda, ele pegou uma faca na cozinha e desferiu três golpes no tórax da jornalista.
O amigo conseguiu puxá-la para um cômodo e trancar a porta enquanto o agressor tentava arrombá-la e proferia ameaças. Depois de algum tempo, percebendo a gravidade do que havia feito, o criminoso se acalmou e, de forma fria, chegou a pedir um cigarro e uma bebida.
Foi nesse momento que o amigo acionou a Polícia Militar (PM). Quando os agentes chegaram ao local, encontraram o suspeito trancado no andar superior da casa. Ele foi preso em flagrante. Vanessa, ainda com vida, foi socorrida, mas não resistiu aos ferimentos e morreu no hospital.
Intimação não realizada - O caso de Vanessa evidencia um problema grave e recorrente no combate à violência contra a mulher: a demora na intimação do agressor. A medida protetiva foi deferida rapidamente, mas, para ter eficácia, o acusado precisa ser formalmente notificado – algo que não aconteceu antes do crime.
"O processo funciona da seguinte forma: assim que a medida protetiva é solicitada, ela é encaminhada imediatamente para a 3ª Vara, que analisa e concede a decisão", explicou Benicasa. "Neste caso, o Judiciário agiu com rapidez e a medida foi deferida prontamente. No entanto, a intimação do agressor depende de um oficial de justiça, que precisa localizá-lo e garantir que ele tenha ciência das restrições impostas."
Sem essa notificação formal, o agressor não poderia ser preso caso descumprisse a medida. Ou seja, mesmo com a decisão judicial em mãos, Vanessa continuava desprotegida. A delegada reforça que essa falha no sistema pode ser fatal. "Infelizmente, o tempo necessário para essa intimação pode variar, o que compromete a efetividade imediata da proteção concedida", finaliza.