Ricardo Eugênio | 25 de dezembro de 2024 - 13h09

IR até R$ 5 mil: quem ganha e quem paga a conta

Isenção do IR até R$ 5 mil pode beneficiar 26 milhões de brasileiros, mas exigirá compensação para cobrir um rombo de R$ 51 bilhões anuais.

IMPACTO FISCAL
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante reunião com o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad - (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

A proposta de isentar do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) quem ganha até R$ 5 mil mensais parece uma ideia simples e irresistível. Popular, justa e direta. Um alívio para a classe média, que há anos vê seu salário ser corroído por impostos desatualizados. Mas, por trás do número redondo e da promessa enfática de campanha de Luiz Inácio Lula da Silva, há uma matemática complexa e um desafio fiscal de proporções bilionárias.

A conta é direta: R$ 51 bilhões por ano. Esse é o tamanho do buraco que a medida abrirá no orçamento público, segundo estimativas da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco). Para efeito de comparação, esse valor é o equivalente ao orçamento anual de um estado de médio porte como Pernambuco.

Hoje, quem ganha até R$ 2.824 por mês está isento do IRPF, fruto de um ajuste parcial na tabela feito pelo atual governo. A nova proposta, que eleva o teto para R$ 5 mil, beneficiaria 26 milhões de brasileiros. Em números, isso significa que metade dos contribuintes do país deixariam de pagar Imposto de Renda. Uma vitória política inegável para Lula, mas um nó fiscal para Fernando Haddad, o ministro da Fazenda.

A promessa, porém, é condicionada ao Congresso Nacional. O projeto de lei deve ser enviado ao Legislativo em 2025, mas sua aprovação exigirá habilidade política, paciência e, sobretudo, uma resposta convincente para a pergunta que ressoa entre economistas e investidores: quem vai pagar essa conta?

O plano do governo é taxar os mais ricos. A estratégia envolve criar uma alíquota mínima de 10% para rendimentos acima de R$ 50 mil mensais, abrangendo lucros, dividendos, bônus, aluguéis e outras formas de renda atualmente isentas ou pouco tributadas. O problema é que essa proposta bate de frente com setores poderosos e influentes, que têm no Congresso uma bancada fiel e ruidosa.

Além disso, há a questão dos dividendos pagos no exterior. O secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, já sinalizou que o projeto incluirá mecanismos para evitar que grandes fortunas sejam escoadas para paraísos fiscais, mas não deu muitos detalhes sobre como isso será feito.

Enquanto o debate acontece nos bastidores de Brasília, a tabela do Imposto de Renda segue defasada. De acordo com a Unafisco, se a tabela fosse corrigida integralmente pela inflação acumulada desde 1996, o limite de isenção hoje seria de R$ 5.109,55. Isso colocaria mais de 28 milhões de brasileiros fora da base tributária, mas também ampliaria o rombo para R$ 234,97 bilhões anuais — um número que, na prática, inviabilizaria a proposta sem medidas adicionais de compensação fiscal.

No centro desse impasse está uma velha disputa brasileira entre justiça tributária e responsabilidade fiscal. De um lado, a necessidade urgente de aliviar o peso do imposto sobre a classe média. De outro, a obrigação de manter as contas públicas equilibradas para evitar novos sustos econômicos.

Para Lula, o ajuste da tabela do IRPF é mais do que uma promessa de campanha — é um compromisso simbólico com o eleitorado que o trouxe de volta ao poder. Para Haddad, é uma prova de fogo que pode definir o sucesso ou o fracasso de sua gestão na Fazenda. No Congresso, será um campo de batalha político e econômico, onde cada voto será disputado até o último minuto.

Por enquanto, a proposta de isenção para rendimentos até R$ 5 mil segue como um sonho distante para milhões de brasileiros. Um sonho que, como quase tudo no Brasil, depende mais de articulação política do que de boas intenções.