Ricardo Eugenio | 23 de dezembro de 2024 - 16h47

Segurança pública no MS: avanços, desafios e o peso das fronteiras

Entrevista com o secretário Antônio Carlos Videira revela o esforço constante para conter o crime transfronteiriço, os altos custos do sistema prisional e as nuances políticas da segurança pública

SEGURANÇA PÚBLICA
Secretário Antônio Carlos Videira fala sobre segurança pública no MS no Giro Estadual de Notícias. - (Foto: Lorena Sone)

No coração do Brasil, entre as fronteiras com Paraguai e Bolívia, Mato Grosso do Sul é muito mais do que um estado agrícola em expansão. É também uma muralha invisível que tenta conter toneladas de drogas, armas e contrabando que atravessam as fronteiras diariamente. O secretário de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, Antônio Carlos Videira, concedeu uma entrevista ao Giro Estadual de Notícias, oferecendo um panorama sobre os desafios e avanços da segurança pública no estado em 2024.

“A atuação integrada entre as polícias estaduais, federais e as Forças Armadas tem sido determinante. O Mato Grosso do Sul não é apenas um corredor logístico para o tráfico; é também um muro de contenção para o restante do país”, disse o secretário, ajustando os óculos e falando pausadamente.


Antônio Carlos Videira apresenta balanço da segurança pública de MS em entrevista ao Grupo Feitosa.

Tráfico, toneladas e números colossais - No decorrer do ano, mais de 560 toneladas de drogas foram apreendidas no estado. Um número que, por si só, dispensa adjetivos. Só na região de Amambai, em uma única operação, foram apreendidas 19 toneladas de maconha. Em outra ação, a Polícia Rodoviária Estadual apreendeu 700 quilos de cocaína pura.

— "Cada apreensão desse porte não é só um golpe contra o crime organizado, mas um recado. Um recado que é ouvido do outro lado da fronteira", afirmou Videira.

Além do impacto direto no crime organizado, as apreensões têm um peso financeiro significativo. Droga apreendida significa receita perdida para os cartéis, prejuízo que não é facilmente absorvido.

Investimento, viaturas e tecnologia - Desde o início do programa MS Mais Seguro, lançado em 2017, Mato Grosso do Sul tem buscado um equilíbrio entre força policial e inteligência. Viaturas, equipamentos modernos e treinamentos são parte de uma estratégia que vai além do óbvio.

— "Segurança pública não pode ser vista como gasto. Ela é investimento. Quando um investidor pensa em Mato Grosso do Sul, ele precisa saber que seu patrimônio está seguro”, pontuou.

Em 2024, o estado recebeu 77 novas viaturas, que foram distribuídas entre a Polícia Militar, Polícia Civil, Corpo de Bombeiros e Polícia Científica. “Essas viaturas não são apenas veículos. Elas são a garantia de que o policial chegará onde precisa, quando precisa”, complementou.

Prisões: uma conta cara e pouco compartilhada - O sistema prisional do estado é uma bomba-relógio orçamentária. Atualmente, Mato Grosso do Sul possui 23 mil presos, o que representa uma das maiores populações carcerárias per capita do Brasil.

— "Cada preso custa meio bilhão de reais por ano para o estado. E o detalhe: 40% deles estão aqui por tráfico de drogas e mais da metade são de outros estados", explicou o secretário.

Ele também destacou que o custo não é apenas financeiro, mas estrutural. Água, alimentação, segurança, ressocialização e infraestrutura consomem uma fatia substancial do orçamento.

— "A verdade é que o problema do tráfico é nacional, mas a conta cai no nosso colo. E essa conta é salgada”, afirmou com franqueza.

Câmeras em policiais: um debate caro e necessário - Um dos temas mais polêmicos abordados na entrevista foi o uso de câmeras corporais em policiais. Enquanto outros estados já implementaram a medida, Mato Grosso do Sul adota uma postura cautelosa.

— "A câmera é uma ferramenta, não a solução. Antes de termos câmeras nos policiais, precisamos garantir que eles tenham viaturas, equipamentos e treinamento. Uma câmera sem todo esse suporte é apenas uma ilusão cara", argumentou. O secretário revelou que câmeras estão nos planos, mas com uso direcionado. Programas como o Mulher Segura e operações ambientais têm prioridade no uso dessa tecnologia.

— "Vamos usar onde realmente for necessário, com estratégia. Segurança pública não pode ser uma brincadeira cara”, disse em tom pragmático.

Rua 14 de Julho: entre o lazer e o caos - Outro ponto sensível abordado foi a situação da Rua 14 de Julho, em Campo Grande, onde moradores, comerciantes e frequentadores estão em conflito constante.

— "De um lado, temos moradores que querem sossego. De outro, comerciantes que dependem do movimento noturno para sobreviver. No meio, a Polícia Militar tentando equilibrar os pratos", explicou Videira.

O episódio recente envolvendo uma deputada federal e policiais militares na região foi mencionado. O secretário foi cauteloso, mas firme.

— "A lei deve ser respeitada por todos. É um conflito legítimo, mas precisa ser mediado com responsabilidade e sem transformar a Polícia Militar em bode expiatório”, afirmou.


Movimento noturno em uma das esquinas da Rua 14 de Julho, em Campo Grande, evidencia o contraste entre lazer, comércio e demandas por segurança e ordem pública.

Prevenção: a verdadeira chave da segurança - No fim da entrevista, quando questionado sobre políticas preventivas, Videira foi direto: “A educação é a resposta mais barata e eficiente para a segurança pública”.

Ele defendeu investimentos em escolas de tempo integral e programas de inclusão social para jovens vulneráveis.

— "Se queremos um Mato Grosso do Sul mais seguro daqui a 10 ou 15 anos, precisamos plantar as sementes agora. E essas sementes são educação, oportunidade e políticas sociais efetivas", concluiu.


Policiais militares patrulham escola estadual, reforçando a educação como chave para a prevenção da violência.

Um futuro em construção - O horizonte para Mato Grosso do Sul é desafiador, mas otimista. A combinação de tecnologia, integração entre forças de segurança e investimentos estruturados parece estar construindo um estado mais resiliente.

“A segurança pública é um esforço coletivo. Envolve desde o policial na linha de frente até o cidadão que denuncia um crime. É assim que construímos um Mato Grosso do Sul mais seguro”, finalizou o secretário.

Confira na íntegra como foi a entrevista: