Lavínia Kaucz, Pepita Ortega, Rayssa Motta, Weslley Galzo, Gustavo Côrtes, Gabriel Hira | 15 de novembro de 2024 - 06h15

Após atentado, STF ataca proposta de anistia; PF vê Grupos extremistas ativos

Explosão em Brasília liga sinal de alerta no STF e reabre debate sobre anistia

POLÍTICA
STF relaciona explosão em Brasília aos atos antidemocráticos e ao "gabinete do ódio" de Bolsonaro, reforçando a necessidade de punição.

Na última quarta-feira, 13 de novembro, Brasília testemunhou mais um episódio de violência política. Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, carregava explosivos e intenções sombrias quando foi interrompido pela própria arma. A explosão, que se somou ao ruído constante de um país em frangalhos emocionais, causou sua morte. Na quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) reagiu: não era só um incidente. Era um eco de janeiro. E de todos os meses de uma longa temporada de ódio, mentiras e ressentimento.

Os ministros, reunidos em plenário, ligaram o ataque aos atos de 8 de janeiro, quando multidões invadiram o Congresso e o próprio STF em nome de uma raiva difusa e mal contida. Mas não pararam por aí. Sob o peso de suas togas e de suas palavras cuidadosamente escolhidas, fizeram questão de apontar o dedo para o que chamam de “gabinete do ódio” — aquele núcleo obscuro de comunicação digital que teria sido alimentado durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Para eles, o ataque de Wanderley é o sinal de que as faíscas de extremismo ainda rondam as instituições brasileiras, inflamadas por um discurso que insiste em sobreviver mesmo sem plateia oficial.

O ministro Alexandre de Moraes, habituado a trocas duras no plenário, foi direto: “O que ocorreu ontem não é um fato isolado. Queira Deus que seja apenas um ato isolado, mas o contexto é o mesmo de antes. E não existe possibilidade de pacificar o país com anistia a criminosos”, afirmou, num recado claro aos defensores de uma anistia aos golpistas de janeiro, que vêm ganhando espaço no Congresso. “A impunidade gera mais agressividade, como vimos ontem.”

Conexões com o passado recente e medos para o futuro - O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, entregou a investigação do caso a Moraes, que já supervisiona o inquérito dos atos antidemocráticos. A Polícia Federal foi acionada com rapidez. Apreendeu celulares e materiais explosivos na casa e no trailer de Wanderley, em Ceilândia. De acordo com o diretor-geral da PF, Andrei Passos Rodrigues, as autoridades vão descobrir se ele agiu sozinho ou com apoio. “Não descarto novos ataques”, declarou Rodrigues, um comentário que, por si só, soa como um aviso sombrio.

Barroso, entre um discurso sobre democracia e outro, falou do perigo de se brincar com a anistia para quem desafiou a ordem. Para ele, a violência é o caminho daqueles que, sem argumentos, só encontram o confronto. “Uma causa que precisa de ódio, de mentira e de violência não pode ser uma causa boa”, disse o ministro. Num momento em que o Congresso discute perdoar os manifestantes de janeiro, a fala de Barroso é um alerta: “Querem perdoar sem antes sequer condenar”, criticou. E, no ar, ficou a mensagem: o STF está atento, e não pretende se dobrar ao clima de complacência.

Reforço de segurança e o retorno do isolamento - Na manhã desta quinta-feira, o prédio do STF estava cercado. Grades reforçadas e uma equipe de segurança multiplicada lembravam que o perigo não estava apenas nos discursos, mas podia ser físico. A última vez que as grades foram erguidas em torno da Corte foi em fevereiro, após quatro anos de ameaças e tensões. Nesta semana, voltaram para ficar por tempo indeterminado.

A sessão plenária foi mantida, mas com acesso restrito. Apenas advogados e jornalistas credenciados foram autorizados a entrar, num esquema de segurança que parecia mirar um inimigo invisível, mas palpável. Lá dentro, os ministros se revezavam em discursos. Gilmar Mendes, decano do STF, falou sobre o “discurso de ódio” que, segundo ele, ganhou força com o governo Bolsonaro e trouxe à tona “o fanatismo político e a indústria de desinformação”.

O perigo de uma era sem fim - Enquanto isso, do outro lado do mundo, na COP-29, em Baku, no Azerbaijão, o vice-presidente Geraldo Alckmin também reagia ao atentado. Em tom contido, chamou o ato de “triste” e “grave”. Mais uma vez, a violência doméstica brasileira cruzava fronteiras. Para Alckmin, é preciso apurar o caso “com extrema rapidez e extremo rigor”. Não era apenas um pedido; era um lembrete de que, mesmo longe, as chamas acesas em Brasília ainda podiam queimar.