Suzane Richthofen faz concurso para trabalhar no Tribunal de Justiça
Ela se inscreveu para disputar vaga na função de escrevente técnico judiciário; cumprimento de pena em regime aberto pela morte dos pais é previsto até 2038
REABILITAÇÃOEm um colégio no bairro Cambuí, em Campinas, Suzane von Richthofen, 41 anos, sentou-se entre quase 200 mil candidatos para prestar um concurso público. Ela agora se apresenta como Suzane Louise Magnani Muniz, nome adotado após anos de manchetes que a eternizaram como autora do assassinato brutal de seus pais, em 2002. O destino? Uma vaga de escrevente técnico judiciário no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), cargo com salário inicial de R$ 6.043, mais os benefícios básicos do funcionalismo público: auxílio-alimentação, saúde e transporte.
A prova, que ocorreu no dia 8 de setembro, faz parte do longo processo seletivo que, além de questões objetivas, exige uma etapa prática de digitação. Suzane, que passou mais de 20 anos presa e foi libertada em janeiro de 2023, agora tenta um novo começo, desta vez dentro do sistema que, por décadas, observou seu nome circular pelos corredores dos tribunais e pelas páginas dos jornais.
Uma reviravolta burocrática - O concurso público é concorrido. São 572 vagas para escrevente técnico em todo o estado de São Paulo, e mais de 180 mil candidatos inscritos. Mas para Suzane, que hoje cursa Direito em Bragança Paulista e vive sob as regras do regime aberto, onde deve permanecer em casa entre as 20h e 6h, o obstáculo vai além da concorrência. O Tribunal exige "boa conduta" para ocupar o cargo, o que implica apresentar atestado de antecedentes criminais, certidões de execução penal e uma declaração pessoal sobre eventuais envolvimentos em inquéritos policiais.
E é aqui que as coisas complicam. Seus direitos políticos estão suspensos até 2038, o que em tese a impediria de assumir qualquer cargo público. No entanto, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2023 abriu uma brecha para casos como o de Suzane. O STF decidiu que condenados podem ser nomeados em cargos públicos, desde que o crime cometido não seja incompatível com as funções e que o regime de cumprimento de pena não entre em conflito com a jornada de trabalho. Para Suzane, isso significa que, se aprovada e sua posse negada, ela ainda pode brigar por sua vaga na Justiça.
O nome por trás da manchete - Mas quem é Suzane Louise Magnani Muniz agora? A resposta, pelo menos no papel, é a de uma mulher que, ao sair da prisão, mudou de nome, casou-se e teve um filho, nascido em janeiro de 2024. A ex-detenta, que por anos carregou o sobrenome "von Richthofen" como um estigma inescapável, abriu uma loja virtual de acessórios femininos e tenta se reerguer, agora longe das luzes do crime que marcou sua juventude.
No final de 2023, Suzane já havia feito uma tentativa de concurso público para a vaga de telefonista na Câmara Municipal de Avaré, mas não apareceu no dia da prova. Neste último concurso para escrevente, a aposta parece mais séria — um esforço para construir uma nova identidade que, no entanto, ainda convive com os ecos do passado.
Entre a condenação e a reinvenção - Condenada a 39 anos e 6 meses de prisão pelo assassinato dos pais, Suzane passou duas décadas entre celas e processos antes de ser liberada no início de 2023. Desde então, sua busca por uma nova vida se mistura à vigilância constante da opinião pública, sempre atenta a qualquer movimento da mulher que chocou o país com um crime que parecia saído de um roteiro macabro.
Agora, ao disputar um cargo público em meio a milhares de outros candidatos, Suzane tenta uma reinvenção difícil, quase como alguém que busca se afastar do próprio reflexo. Se conseguirá a vaga no TJSP? O que isso representará para sua história? Essas são questões que talvez nem o mais preparado dos escreventes possa responder.