Ricardo Eugenio | 06 de setembro de 2024 - 16h11

Justiça Eleitoral defere a candidatura inédita de Juliano Varela e Márcio Ximenes em Campo Grande

A aprovação da candidatura de Juliano e Márcio desafia o modelo tradicional de política no Brasil.

ELEIÇÕES 2024
Márcio Ximenes e Juliano Varela lutam por inclusão de deficientes na política. - (Foto: Divulgação)

Na última semana, a Justiça Eleitoral de Mato Grosso do Sul tomou uma decisão sem precedentes: deferiu a candidatura coletiva de Juliano Varela, que tem Síndrome de Down, e Márcio Ximenes Ramos, cego desde os 9 anos, para disputar uma vaga na Câmara de Vereadores de Campo Grande. Em um país onde a inclusão de pessoas com deficiência ainda é um desafio constante, a aprovação desta chapa – batizada de "Coletivo Juliano Varela" – representa um marco.

O juiz F. V. de Andrade Neto, da 8ª Zona Eleitoral, foi quem assinou a decisão. Sem rodeios, ele atestou que toda a documentação estava em ordem e que não havia qualquer vício no registro da candidatura. O Ministério Público Eleitoral também deu sinal verde, confirmando que não havia motivos para impugnar o pedido. Com o deferimento em mãos, o "Coletivo Juliano Varela" pode finalmente se preparar para as eleições de 2024.

A candidatura de Juliano e Márcio rompe padrões. Não apenas porque ambos têm deficiência – Juliano com a Síndrome de Down e Márcio sendo deficiente visual –, mas também porque a Justiça Eleitoral tratou o processo com a seriedade que ele merece. A decisão, longe de ser um gesto simbólico, garante que os dois têm o direito de concorrer e representa um avanço concreto na inclusão política.

O peso de uma decisão - Quando o juiz Andrade Neto deferiu a candidatura, ele não apenas validou o esforço do coletivo, mas também deu um recado importante sobre a democracia no Brasil. Ao reconhecer a elegibilidade de Juliano e Márcio, a Justiça Eleitoral reafirmou que as barreiras físicas e cognitivas não podem ser obstáculos para a participação política. “Não se identificou qualquer vício de formação”, dizia a sentença, em um tom técnico que contrasta com o peso emocional da decisão.

Com o deferimento, a dupla avança para as eleições com o apoio do PSD e uma plataforma focada na acessibilidade e inclusão. Juliano Varela, conhecido na cidade pelo trabalho em prol das pessoas com deficiência, e Márcio, que perdeu a visão após um acidente na infância, são figuras que trazem para o centro do debate temas que, até agora, eram periféricos no cenário eleitoral de Campo Grande.

A decisão judicial, nesse contexto, vai além de um simples registro burocrático. Ela abre caminho para um novo tipo de representatividade. Para Yves Drosghic, advogado eleitoral que representa o coletivo, o deferimento foi uma vitória esperada, mas não menos significativa: “Isso é uma grande conquista”, comentou. A fala de Drosghic ecoa o sentimento de um grupo que, pela primeira vez, vê a possibilidade concreta de disputar uma eleição e levar suas demandas para o legislativo.

A Justiça Eleitoral e o futuro da inclusão - A Justiça Eleitoral brasileira tem sido testada de várias formas ao longo dos anos, mas raramente uma decisão atraiu tanto simbolismo quanto o deferimento da candidatura de Juliano e Márcio. O Brasil, um país com mais de 45 milhões de pessoas que se identificam como portadoras de algum tipo de deficiência, ainda está longe de oferecer plena inclusão. A candidatura coletiva dos dois é, ao mesmo tempo, um lembrete do que já foi conquistado e do quanto ainda precisa ser feito.

A decisão judicial destaca que, mesmo em um ambiente político dominado por figuras tradicionais, há espaço para o novo – e, neste caso, o novo significa romper com barreiras históricas que limitam a participação de pessoas com deficiência na vida pública. A aprovação do "Coletivo Juliano Varela" pode não garantir uma vitória nas urnas, mas já representa um avanço importante no reconhecimento dos direitos dessas pessoas.

Com a campanha agora oficializada, o próximo passo será conquistar o apoio popular. Embora Campo Grande já tenha experimentado candidaturas coletivas em eleições anteriores, esta será a primeira vez que uma chapa composta exclusivamente por pessoas com deficiência será submetida ao voto dos eleitores. Para Juliano e Márcio, o desafio de levar suas pautas de inclusão e acessibilidade para a política é grande, mas a oficialização da candidatura já é, por si só, uma vitória.

Inclusão além do papel - Com a candidatura oficialmente deferida, Juliano Varela e Márcio Ximenes agora podem concentrar seus esforços em apresentar suas propostas ao eleitorado. A chapa promete dar prioridade a questões que impactam diretamente a vida das pessoas com deficiência, como acessibilidade em espaços públicos, inclusão no mercado de trabalho e a melhoria dos serviços de saúde voltados para este público.

O deferimento da Justiça Eleitoral dá à dupla a oportunidade de mostrar que a participação política vai além das limitações físicas ou cognitivas. A candidatura coletiva de Juliano e Márcio é, acima de tudo, um símbolo de que a política brasileira, ainda que de forma lenta, começa a se abrir para novas vozes e novos formatos de representatividade.

O "Coletivo Juliano Varela" segue agora para a fase decisiva da campanha, com a esperança de que a decisão judicial não seja apenas um marco, mas o início de uma nova era de inclusão na política municipal.