Da Redação | 28 de agosto de 2024 - 16h40

Indígenas abandonam negociações sobre marco temporal no STF alegando desigualdade negocial

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se retira de Comissão Especial de Conciliação do STF, contestando a efetividade das discussões e a continuidade da lei do marco temporal

IMPASSE
Indígenas - (Foto: ABrasil)

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) anunciou, nesta quarta-feira (28), sua saída da Comissão Especial de Conciliação criada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para tratar da tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. A decisão foi comunicada durante a segunda reunião da comissão, ressaltando a insatisfação dos representantes indígenas com as condições desiguais de negociação.

Segundo a Apib, a manutenção da vigência da lei do marco temporal gera uma "desigualdade negocial", que inviabiliza a participação justa e equânime dos povos indígenas nas discussões da comissão. A entidade havia solicitado ao ministro Gilmar Mendes, relator das ações no STF, a suspensão cautelar da norma para assegurar condições mínimas de negociação, mas o pedido foi negado.

"A Apib requereu a suspensão da lei com intuito de garantir condições minimamente equânimes de participação dos povos indígenas na Comissão de Conciliação, já que a vigência da lei tem acarretado incremento da violência nos territórios", justificou a organização em nota.

A Apib também criticou a estrutura da Comissão de Conciliação, que, segundo a entidade, não trabalha por consenso, mas por maioria. "Foi determinado que a Comissão Especial de Conciliação não trabalharia por consenso, mas por maioria. Informou ainda que a oposição dos povos indígenas a um eventual acordo não teria o condão de interromper seu prosseguimento, ainda que dispusesse sobre direitos dos povos indígenas", destacou a Apib.

Essa dinâmica, na visão dos representantes indígenas, compromete a autonomia e a voluntariedade da participação nas negociações, princípios que a Apib considera fundamentais para qualquer acordo sobre os direitos dos povos indígenas.

O ministro Gilmar Mendes - (Foto: ABrasil)

As reuniões da Comissão de Conciliação foram convocadas pelo ministro Gilmar Mendes em um esforço para mediar a questão do marco temporal, tese que estabelece que as comunidades indígenas só teriam direito à demarcação de terras que estivessem sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O marco temporal é visto pelos povos indígenas como uma ameaça aos seus direitos territoriais e tem sido alvo de intensos debates e protestos.

Em setembro do ano passado, o STF decidiu contra a tese do marco temporal, mas o Congresso Nacional, em uma ação subsequente, derrubou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei que validou a tese. A continuidade das discussões sobre o tema no âmbito da Comissão de Conciliação, sem a participação da Apib, gera preocupações quanto à efetividade e à legitimidade das decisões que podem ser tomadas.

Próximos passos - As reuniões da Comissão estão previstas para continuar até 18 de dezembro deste ano, mesmo sem a participação da Apib. A ausência dos representantes indígenas nessas discussões pode limitar o alcance das negociações e agravar as tensões entre o governo, o STF e os povos indígenas.

Além disso, a realização das audiências impede uma nova decisão do STF sobre a questão do marco temporal, concedendo mais tempo ao Congresso para tentar aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que possa incorporar a tese do marco temporal na Carta Magna.