Da redação | 24 de julho de 2024 - 10h25

Donos de áreas invadidas em Douradina revelam que indígenas estão armados e querem mais propriedades

Desde o dia 14 de julho os Guarani-Kaiowá tomaram à força uma grande área no município

QUESTÃO AGRÁRIA
O presidente da Famasul, Marcelo Bertoni, o advogado Gustavo Passareli, a deputada estadual Gleice Jane, o deputado Coronel David, o deputado federal Rodolfo Nogueira e a senadora Tereza Cristina participaram de reunião com outras autoridades - (Foto: Leandro Holsbach)

Os produtores rurais donos de áreas no município de Douradina (MS) estão passando por uma situação que tem se tornado comum em Mato Grosso do Sul: as invasões de terras produtivas por povos indígenas. Desde o dia 14 de julho, dezenas de indígenas da etnia Guarani-Kaiowá, da comunidade Panambi Lagoa Rica, tomaram à força propriedades rurais no município e estão ameaçando ampliar a área invadida.

Segundo o produtor rural Cláudio Vieira, por meio de imagens feitas por drones dos produtores rurais, foi possível verificar que alguns indígenas estão portando armas de fogo, o que aumenta ainda mais a tensão entre produtores rurais e os invasores. O conflito ocorre em uma área de propriedades rurais privadas, que fazem limite com outras duas áreas já ocupadas pelos indígenas, denominadas Gwa’aroka e Guyra Kambiy.

Para os indígenas da etnia Guarani-Kaiowá, as propriedades rurais invadidas estariam localizadas dentro da área reivindicada como território tradicional, o que é rechaçado pelos produtores rurais.

Foi possível verificar que alguns indígenas estão portando armas de fogo e arcos

“Eu participei de uma reunião no MPF (Ministério Público Federal) em Dourados, mas não me deixaram falar. Porém, ficou claro que o MPF está dando razão aos indígenas, esquecendo que estamos nessa área desde 1943, quando o então presidente da República, Getúlio Vargas, implantou a Colônia Agrícola Federal de Dourados”, recordou Cláudio Vieira.

Ele revelou que encontrou dentro de um barraco construído pelos indígenas na área invadida uma cartolina em que desenharam um mapa com a aldeia deles e as outras propriedades que pretendem invadir. “Esses índios são desaldeados e vieram de fora para invadir as propriedades rurais. Eles nem pertencem à comunidade Panambi Lagoa Rica”, denunciou.

Vítimas

O produtor rural Gilmar Silva, que teve a sua propriedade invadida, disse que há 20 anos adquiriu a área. “É uma propriedade que é da colonização de Getúlio Vargas, com módulos de 30 hectares. Nós fomos surpreendidos por esses índios. Veio o pessoal aqui da Força Nacional, conversou com eles, conversou com a gente e disseram que iam pedir para eles permanecer dentro da aldeia, mas não adiantou nada”, lamentou.

Ele acrescentou ainda que agora os indígenas estão construindo barracos nas áreas invadidas. “Até, inclusive, a gente fez um voo de drone e tem um índio com espingarda lá, enquanto nós estamos aqui desde domingo aguardando uma decisão do Governo Federal, que se há um erro nessa situação, esse erro é da União e, portanto, ela que tem de corrigir, não somos nós. Nós somos vítimas e não criminosos, como essas ONGs (Organizações Não-Governamentais) que vêm aqui e incentivam os índios a invadirem as nossas propriedades”, reforçou.

Gilmar Silva também criticou o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), que é um organismo vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). “E quero falar também um pouquinho do Cimi, que diz que é um braço da Igreja Católica, mas eu acho que não é um braço do capeta. Porque, vejam bem, aqueles que incitam a violência não podem ter parte do Deus, acho que tem parte do demônio”, argumentou.

O produtor rural reclamou que está faltando apoio da Justiça para os donos de terra na região. “Os índios têm suporte da União, que dá carro, médico, comida, tudo de graça. A gente chegou aqui na década de 50, o meu avô trabalhou duro para criar os meus pais e juntos eles transformaram essa região no polo agrícola que é hoje. Agora, nós estamos ameaçados, somos reféns desse pessoal. Eu gostaria que as autoridades competentes tivessem um pouco mais de preocupação com a gente”, cobrou.

Para os indígenas da etnia Guarani-Kaiowá, as propriedades rurais invadidas estariam localizadas dentro da área reivindicada

Ameaças

O produtor rural Cláudio Vieira ressaltou que as ONGs internacionais incentivam as invasões. “As pessoas estão aqui aterrorizadas. Uma imagem aérea feita pelo drone mostrou que os índios estão armados. Eles invadem a propriedade particular e estão aterrorizando, provocando um verdadeiro caos”, argumentou.

Ele disse que alguns produtores rurais relataram também que os indígenas pretendem invadir as sedes das propriedades e, se tiverem mulheres dentro, eles querem violentá-las. “A gente está vivendo um caos. Teve uma outra ocasião aqui, já há alguns anos, um ex-policial militar foi morto a tiros, mas, antes, eles bateram muito”, recordou.

Cláudio Vieira disse que a situação é assustadora. “Eles são perigosos e andam armados. Quem não está de espingarda, está com facão, foice e flechas. É complicado e o cenário é bem assustador”, pontuou.

MPF

Por meio de nota oficial, o MPF disse que acompanha e monitora, por meio de diligências, a situação na região. “Conforme relatado pelos indígenas, durante o fim de semana houve uma tentativa de ocupação de parte da área reivindicada como território tradicional e, com isso, os proprietários rurais teriam se unido e formado um comboio com várias caminhonetes para realizar a reintegração de posse, portando fogos de artifícios e armas de munições letais e não-letais. Dois indígenas foram feridos, conforme verificado pelo MPF”, trouxe a nota.

Na segunda-feira (22), ainda de acordo com o MPF, foi realizada uma reunião entre as partes envolvidas no conflito e instituições com atribuição para atuação junto aos povos tradicionais e comunidades indígenas. “O encontro foi na sede do MPF em Dourados, ao longo da tarde, com o intuito de mediar uma solução para cessar o conflito armado e as violências”, informou.

Protestos pedem fim das invasões e reestabelecimento da paz no campo 

O MPF disse que participaram da mesa de diálogos representantes do Ministério dos Povos Indígenas, da AGU (Advocacia Geral da União), da Defensoria Pública da União e da Funai, bem como a senadora Tereza Cristina, os deputados federais Rodolfo Nogueira e Marcos Pollon e os deputados estaduais Gleice Jane, Coronel Davi e Renato Câmara, além do presidente da Famasul, Marcelo Bertoni. 

Também participaram representantes do Governo do Estado, do jurídico dos indígenas, por meio da Aty Guasu e da Assembleia Geral do Povo Kaiowá e Guarani, das entidades locais dos produtores rurais. Pela comunidade indígena Panambi Lagoa Rica também participaram presencialmente da reunião, contudo, sentiram-se intimidados por um ato que ocorreu em frente à sede do MPF, em que participantes portavam faixas e cartazes com os dizeres "Chega de Invasão!", entre outros, e optaram por aguardar o desfecho da sede da Funai, em Dourados.

Durante a reunião, chegou-se a uma solução provisória, na qual a comunidade indígena, composta por cerca de 100 famílias, permaneceria na área de ocupação, porém, em um perímetro delimitado a 150 hectares, e que pertence a uma produtora rural que estava presente na reunião. “Essa proprietária rural afirmou que não haveria interação com os indígenas, mas reivindicaria a posse da terra judicialmente. Esta solução provisória visa, primordialmente, a saída da comunidade da propriedade onde teve origem o conflito no domingo, e que culminou com os indígenas feridos”, revelou a nota.

Além da apresentação desta proposta, ficou acordado entre os presentes que não haverá qualquer movimento ou conflito tanto por parte dos produtores rurais, quanto por parte dos Kaiowá e Guarani, até que haja uma solução consensual entre as partes. Nova reunião foi agendada para o dia 29 de julho, também na sede do MPF, em horário a ser definido.



Deputados

O deputado federal Marcos Pollon (PL-MS) reforçou que os donos das áreas invadidas são pessoas simples e só querem trabalhar. “É só isso. Não tem nenhum bandido aqui. Ninguém quer tirar nada de ninguém. Eles só querem a tranquilidade para trabalhar. O povo está sofrendo ameaças, estão queimando as lavouras”, alertou.

O parlamentar completou que os produtores rurais estão fazendo manifestações pacíficas. “Não tem nada de violento aqui não, está todo mundo desarmado, ninguém tem intenção de nada e aqui é para deixar bem claro para todos que invasão é crime, quem invade terra é bandido. Eles querem engolir o município inteiro, já falaram. Nós pegamos o planejamento deles ali na primeira barraca. Precisamos de segurança para os produtores rurais que só querem trabalhar. A luta é pelo direito deles. Que falar mais uma vez, invasão é crime. Precisamos de paz no campo”, assegurou.

Já a deputada estadual Gleice Jane (PT) disse que foi a Douradina mais uma vez com o MPF para tentar ouvir a comunidade indígena. “Trata-se de mais uma sequência das tratativas de diálogo para ver o que a gente consegue avançar nesse processo. Ouvimos as pessoas falando muito das suas dores, dos seus sofrimentos, dos momentos passados em que houve promessas e que não foram cumpridas”, relatou.

Conforme ela, os indígenas relataram com bastante propriedade, mostrando em cada região como era, quem morava aqui, quem eram os parentes que estavam aqui, como foi esse processo de retirada da terra deles. “Neste momento, o desejo deles é retornar para os seus territórios e de ter política pública, mas, ao mesmo tempo, há um descrédito muito grande no Estado”, lamentou.

Gleice Jane completou que a situação é bastante delicada, mas que segue conversando e dialogando. “Vamos voltar lá mais algumas vezes ainda para ver o que a gente consegue avançar. O cenário ainda é esse, não tem uma proposta, não temos nada definitivo, nada concreto para apresentar, mas a gente está aqui tentando ouvir e ver o que é possível avançar ainda’, concluiu.