Carlos Ferreira | 17 de novembro de 2023 - 12h50

"O SETLOG/MS se orgulha de ter apoiado há mais de 10 anos a concepção desta rota de integração"

O diretor-presidente do sindicato falou sobre a 3ª expedição da RILA que vai contar com empresários e autoridades percorrendo os quase 2 mil km que separam Porto Murtinho dos portos chilenos

CLÁUDIO CAVOL
Cláudio Cavol - (Foto: Rafael Rodrigues)

Em entrevista concedida ao Giro Estadual de Notícias, o diretor-presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga e Logística de Mato Grosso do Sul (SETLOG/MS), Cláudio Cavol, destacou os detalhes sobre a próxima etapa da Rota de Integração Latino-Americana (RILA), que acontece no próximo dia 24 de novembro, além também do papel fundamental do SETLOG/MS na concepção da rota.

Confira a entrevita completa:

A Crítica: Como estão os preparativos para essa nova edição da Rota de Integração Latino-Americana (RILA)?

Cláudio: A expectativa para este evento é altíssima e estamos cheios de esperança por seu total sucesso. Desta vez, estamos planejando levar empresários e autoridades em caminhonetes para explorar e inspecionar toda a extensão da rodovia. Vamos avaliar o que já foi realizado e o que ainda precisa ser feito, incluindo a infraestrutura necessária. A ideia é que essa rodovia, a rota de integração, seja equipada para servir não apenas aos caminhoneiros que transportam nossas riquezas, mas também aos turistas que viajam com suas famílias para destinos como o deserto do Atacama e a Cordilheira dos Andes. É crucial que as autoridades verifiquem se ainda há pendências na nova rodovia e se ela está pronta para atender a todos os usuários.

A Crítica: Poderia nos falar sobre os desafios logísticos envolvidos na organização de uma expedição com essa magnitude?

Cláudio: A expedição é de grande escala. Estamos falando de mais de 35 caminhonetes, toneladas de equipamento e mais de 110 pessoas que nos acompanharão nesta terceira edição da Rota de Integração. O planejamento e a organização precisam ser meticulosos e impecáveis para garantir que tudo ocorra sem contratempos. Isso é especialmente importante considerando que entre os participantes teremos autoridades do governo estadual, federal, e de municípios como Campo Grande, incluindo a presença da prefeita e do vice-governador. A responsabilidade é enorme e precisamos assegurar que tudo transcorra perfeitamente. Felizmente, nos sentimos um pouco mais tranquilos, pois, assim como nas edições anteriores, esperamos ser muito bem recebidos por todos os municípios e governos locais por onde passarmos nesta terceira edição.

A Crítica: Cláudio, você mencionou anteriormente sobre a importância de identificar as principais necessidades e lacunas nesta nova via que atravessará diversos países, permitindo que as pessoas façam um verdadeiro test drive. Antes do início efetivo da terceira edição da expedição, o que vocês já observaram? Há muitos aspectos a serem abordados? Quais são os principais desafios ou obstáculos que podem surgir após a finalização desse grande projeto?

Cláudio: Em 2012, realizamos nossa primeira expedição buscando uma rota alternativa pela Bolívia, mas infelizmente não tivemos o mesmo acolhimento que recebemos de países como Paraguai, Argentina e Chile. Em parceria com o governo estadual, decidimos por esta rota, que se mostrou menos onerosa e mais viável para atender à antiga demanda dos sul-mato-grossenses por uma saída para o Pacífico. Após várias reuniões com o governo do Paraguai, e mesmo com a mudança de três presidentes desde o início de nossas negociações, o Paraguai honrou seus compromissos. Conseguiram financiamento internacional e estão seguindo o cronograma de construção da rodovia rigorosamente. A ponte sobre o Rio Paraguai, construída pela Itaipu Binacional, também está adiantada. Temos certeza de que, mesmo antes da inauguração oficial, essa rodovia já será útil. Podemos atravessar o Rio Paraguai de balsa e superar os 126 quilômetros restantes de asfalto, pois o trecho já possui uma manutenção adequada. Assim, Mato Grosso do Sul já pode começar a aproveitar os benefícios, como a redução de custos no transporte de mercadorias produzidas aqui e na importação de produtos para consumo local.

A Crítica: Qual é o significado de incluir um caminhão carregado de carne nesta expedição e como isso demonstra a viabilidade da rota?

Cláudio: Transportar carne em uma expedição como esta é um desafio significativo, especialmente porque é um produto altamente perecível que requer transporte refrigerado. Um dos principais objetivos é destacar a necessidade de alfândegas e aduanas modernas, eficientes e ágeis na liberação de mercadorias. Apesar de a estrada estar avançando rapidamente, observamos que a questão aduaneira ainda evolui lentamente. Queremos mostrar às autoridades, tanto do governo federal brasileiro quanto dos governos estadual e dos países envolvidos, a urgência de investir rapidamente em aduanas modernas. Não podemos esperar a estrada estar completa e inaugurada apenas para descobrir que não é possível utilizá-la devido a limitações aduaneiras. Nosso objetivo é expor esses desafios para que as autoridades compreendam a situação e intervenham prontamente, garantindo que as soluções sejam implementadas o mais rápido possível.

A Crítica: Esse esforço coletivo em nosso Estado e País se reflete da mesma maneira em países como Paraguai, Bolívia e Chile, que estão integrados a esse projeto conosco? Como avalia o empenho desses outros países que fazem parte desta iniciativa?

Cláudio: Com grande entusiasmo, curiosamente, o acolhimento no exterior foi ainda mais caloroso do que o que tivemos em nossa primeira edição. Quando chegamos ao Chile com cerca de 25 caminhonetes, fomos recebidos de forma emocionante pelas pessoas nas ruas, com muita admiração pelo Brasil. Foi um momento que nos arrepiou, marcado por grande emoção em nossa comitiva. Os carros locais desfilavam com bandeiras do Brasil e do Chile, e até as crianças das escolas públicas e privadas nos aguardavam nas ruas, com pequenas bandeiras dos dois países. Nos eventos que participamos no Chile, era comum ver crianças apresentando aspectos da cultura local, o que achamos incrível e bonito. Conversei com algumas dessas crianças, e todas elas entendiam a grande importância dessa rota para a economia local, especialmente para os portos do norte do Chile como Antofagasta e Arica.

Cláudio Cavol é o presidente do SETLOG/MS - (Foto: Rafael Rodrigues)

No Paraguai e na Argentina, a experiência foi similar. Lembro-me de um episódio na Argentina onde, apesar do nosso atraso de 9 horas, o prefeito de uma cidade insistiu para que parássemos, bloqueando a estrada com viaturas e nos conduzindo à praça municipal para falar com a população. Isso demonstra a grande expectativa e entusiasmo deles pela eficácia da rodovia. Esperamos que o Brasil também se junte a esse movimento de otimismo e que, juntos, possamos inaugurar esta importante via de integração.

A Crítica: E como que o SETLOG/MS vem prestando apoio?

Cláudio: O SETLOG/MS orgulha-se de ter sido o pioneiro, lá em 2011-2012, na concepção desta rota de integração como uma alternativa para o acesso ao Pacífico. Naquela época, os portos brasileiros estavam sobrecarregados, com enormes filas de caminhões e navios aguardando ao largo dos portos de Paranaguá, Santos e Rio Grande. Recordo que em Paranaguá, a fila de caminhões se estendia por 100 quilômetros, alcançando até Curitiba. Foi nesse contexto que surgiu a ideia de buscar rotas alternativas para os produtos do Mato Grosso do Sul.

Felizmente, tivemos a sorte de unir empresários, o poder público e o meio acadêmico do estado em torno dessa ideia. Essa união resultou na criação da UniRila, uma rede de universidades, atualmente composta por 17 instituições, que facilita a troca de informações e o intercâmbio de estudantes entre os países envolvidos. Outro fator crucial foi o apoio da mídia no Mato Grosso do Sul, que abraçou e divulgou a ideia de forma clara e elucidativa para a população.

O sucesso foi inevitável. Quando uma ideia é universalmente bem recebida, ela se concretiza, e foi exatamente isso que aconteceu. Parabéns a todos nós envolvidos neste projeto tão importante.

A Crítica: E isso será refletido de forma muito positiva na economia do Estado...

Cláudio: A médio prazo, Mato Grosso do Sul experimentará um surto de desenvolvimento distinto, diferindo, por exemplo, do impacto de instalar uma grande indústria em uma pequena cidade do interior. Claro, isso gera crescimento na região e no estado, mas esta rodovia trará um tipo de desenvolvimento mais sustentável e duradouro, com um alcance mais amplo e beneficiando uma parcela maior da população. Veremos um aumento significativo no dinamismo e vigor do mercado de trabalho, especialmente na área de logística, mas as oportunidades vão além.

Outra área que defendemos é o turismo. O Mato Grosso do Sul tem um potencial turístico imenso, ainda pouco explorado frente à sua riqueza natural. Com a nova rodovia, a população local poderá, por exemplo, visitar a Cordilheira dos Andes com uma distância semelhante à de Camboriú. Assim, em vez de ir à praia, por que não explorar destinos como a Cordilheira dos Andes ou o deserto do Atacama, oferecendo opções de turismo até mais acessíveis financeiramente?

As oportunidades que se abrirão são enormes. No entanto, alguns municípios por onde passa essa rota ainda precisam despertar para esse potencial e começar a preparar sua população para a ampla gama de empregos que surgirá com a abertura da rota.

A Crítica: Temos que levar em consideração que a planejamento é a palavra chave, não é?

Cláudio: Nesse contexto, surge um dever primordial para o governo estadual, em colaboração com as prefeituras desses municípios. As lideranças políticas locais devem se empenhar para preparar adequadamente suas populações, visando um atendimento de qualidade, especialmente para o turista. É importante destacar que o turista chileno, acostumado com um país que recebe um grande fluxo de turistas anualmente, possui expectativas elevadas. Se não estivermos preparados, corremos o risco de causar uma má impressão logo no início, nos primeiros anos. Se isso acontecer, poderíamos enfrentar comentários negativos dos visitantes, dizendo que não foram bem atendidos e desencorajando futuras visitas. Portanto, é uma responsabilidade dos prefeitos, eleitos pela população desses municípios, que possuem a maturidade e experiência necessárias, capacitar a população local para que possamos receber melhor esses turistas.  

A Crítica: Considerando os empresários do setor de cargas e logística de nosso Estado, como o senhor avalia a preparação deles diante da quase conclusão da rota?

Cláudio: É importante reconhecer que os transportadores do Mato Grosso do Sul ainda não estão totalmente preparados para o transporte internacional. Atualmente, temos poucas empresas de transporte do estado qualificadas e credenciadas na ANTT para operar nos quatro países: Brasil, Paraguai, Argentina e Chile. De fato, elas são tão poucas que podemos contá-las nos dedos de uma mão. Existem várias empresas que realizam transporte apenas para a Bolívia ou para o Paraguai, mas poucas abrangem todos esses quatro países. Portanto, o SETLOG/MS também tem se concentrado nessa questão, buscando preparar nossos transportadores para operar nesses países assim que a rota estiver completa. Estamos promovendo isso ao levar o primeiro caminhão na rota, demonstrando aos empresários do transporte de Mato Grosso do Sul que não é necessário esperar. Os mais audazes já começarão a usar a rota como ela está atualmente. Confira a entrevista completa: