A utilização do crowdfunding como forma de arrecadação de recursos nas eleições 2022
Vinícius Monteiro Paiva (*)
ARTIGOUma questão tormentosa, mas sempre presente nos períodos que circundam as eleições gerais, é o custo cada vez mais elevado das campanhas eleitorais. Por consequência, o financiamento das campanhas passa a ser tópico importante no cenário eleitoral, podendo, por vezes, suplantar a discussão política e ser peça determinante para a vitória (ou derrota) nas urnas daqueles inseridos na corrida eleitoral.
Ainda que não seja de grande utilização pelos candidatos e partidos, não é nenhuma novidade no Direito Eleitoral brasileiro a possibilidade de utilização do financiamento coletivo das campanhas eleitorais. Esse mecanismo, já presente em campanhas passadas, permanece autorizado para as eleições de 2022.
Também conhecido como crowdfunding ou “vaquinha virtual”, essa ferramenta permite a arrecadação de recursos por meio da utilização de sites de internet, aplicativos e assemelhados, que mobilizam apoiadores a realizarem pequenas doações em favor de pré-candidatos.
Inaugurado no sistema eleitoral brasileiro na eleição de 2018, fruto das mudanças incorporadas pela reforma política de 2017, o uso dos meios de arrecadação coletiva de fundos marca, nesta eleição, a terceira vez que será possível aos candidatos e partidos lançarem mão desse instrumento.
Segundo a essência desse sistema de captação de recursos, abre-se espaço público na internet para a divulgação das ideias de partido ou pré-candidato, visando a atrair pessoas que simpatizem com suas concepções e estejam dispostas a colaborar financeiramente com o projeto eleitoral que norteia a ação.
Importante observação cabe neste momento para lembrar que a legislação eleitoral proíbe o financiamento de campanha eleitoral por pessoas jurídicas (ADI n. 4.650/STF), o que se aplica também à hipótese, havendo, inclusive, determinação de identificação dos doadores pelo nome e número de CPF, acompanhada dos detalhes da doação realizada.
Ademais, de acordo com a Lei nº 9.504/1997, em seu art. 23, § 4º, inciso IV, é imprescindível a contratação, para administração do sistema de crowdfunding, de empresa ou entidade que esteja devidamente cadastrada e autorizada pela Justiça Eleitoral a prestar tais serviços para campanha eleitoral.
Segundo consulta no site do SPCE, realizada na data de elaboração deste escrito, até o momento, quinze empresas foram autorizadas a realizar arrecadação coletiva, havendo também um cadastro em análise.
Como se percebe claramente, a interligação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com a gestora contratada é imprescindível, visto que toda a administração dos recursos levantados ficará sob sua responsabilidade. Essa gestora detém até mesmo o poder de liberação de recursos levantados, fazendo-o somente em momento oportuno – ou seja, após o registro da candidatura, o marco temporal que permite a realização de despesas de campanha.
Evidenciado, portanto, que a reponsabilidade das plataformas de crowdfunding, evidentemente, vai além da simples arrecadação, dentre as determinações constantes das normas de regência, destaca-se ainda o dever de dar “ampla ciência a candidatos e eleitores acerca das taxas administrativas a serem cobradas pela realização do serviço” (LE, art. 23, §4º, inciso III, alínea “e”).
Da mesma forma, em que pese não conste determinação legal de informar, é salutar que as empresas administradoras de crowdfunding façam as advertências aos usuários acerca do limite estabelecido para as doações eleitorais – que não pode ultrapassar dez por cento dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano anterior à eleição (LE, art. 23, §1º), sob pena de multa –, assim como a limitação diária de doação pelo sistema de R$ 1.064,10, por pessoa física, como estabelecido pelo TSE em sua resolução n. 23.553/2017 (art. 21, §1º c/c 22, §7º).
Conclui-se, pois, que a possibilidade de arrecadação por partidos e pré-candidatos, por meio do crowdfunding, revela-se como importante instrumento de incentivo à participação democrática, seguindo as linhas traçadas pela Constituição de 1988. Afinal, esta trouxe abordagem voltada à ampliação da participação política dos cidadãos, não só pelo exercício do voto secreto direto e dotado de peso igualitário, mas pelo surgimento de mecanismos à disposição dos cidadãos para exercício da democracia[2], bem como a incorporação das instituições participativas, que se caracterizam como meios alternativos de incorporação de cidadãos e associações da sociedade civil na deliberação sobre políticas públicas[3].
Portanto, no cenário de ampliação da participação democrática dos cidadãos, o crowdfunding eleitoral se destaca como importante recurso de atração dos eleitores que apoiam e acreditam nas ideias apresentadas, aproximando-os daqueles que receberam suas doações. Assim, com esse grau de proximidade e conhecimento das plataformas apresentadas, os apoiadores têm maior condição de acompanhar seus candidatos, se eleitos, exigindo deles coerência com o que foi apresentado durante a campanha eleitoral.
*Advogado com especialização em Direito Eleitoral. Autor e coautor de obras jurídicas. Professor.