Cine Campo Grande: Bem localizado e com preços baixos, cinema fez história e deixou saudades
A algumas semanas do Dia do Cinema, a série de reportagens "Cine Lembrança" A Crítica pretende rememorar as histórias dos cinemas que marcaram época na capital. Começando pelo famoso "Cine Campo Grande"
CINE LEMBRANÇAA Rua 15 de Novembro é uma das mais importantes do Centro de Campo Grande. Com sua extensão que vai do entroncamento de frente ao Camelódromo até a Avenida Ceará, a via tem por cima de suas calçadas, locais que fazem parte da história da cultura campo-grandense, entre elas a Praça Ary Coelho, Igreja de Santo Antônio e, bem próximo dela, precisamente no número 750, o marcante “Cine Campo Grande” (ou pelo menos aquilo que resta dele).
O ambiente foi uma obra da “Cinematográfica Araújo” inaugurado na década de 80. O local era uma das principais opções de lazer para o cidadão, que na época, vivia o lançamento de vários blockbusters que vieram a ser clássicos como “O Iluminado”, “Star Wars - Episódio 5”, “Lagoa Azul”.
A jornalista e escritora, Marinete Pinheiro, em seu livro “Salas de sonhos: memórias dos cinemas de Mato Grosso do Sul”, conta que o cinema era dividido em duas salas, o Cine 1 e o Cine 2 e que ambas, até 2004, possuíam 704 lugares, tendo sido reduzido em 2006 para 490. Após isso, não houveram mais reformas, fazendo com que, nos seus anos finais, o ambiente possuísse um aspecto um pouco abandonado.
O público era extremamente variado, sendo considerado um cinema popular. Em certo período os filmes não possuíam um horário de início das sessões. Se existia uma certa expectativa pelo longa-metragem, o local abria suas portas mais cedo, no começo da tarde. Tudo dependia do filme em cartaz.
A cultura do cinema de rua era muito comum em todo mundo, e aqui não poderia ser diferente: junto com o Cine Campo Grande funcionavam outros dois cinemas, o Santa Helena e o cinema da rodoviária. Precedentes do antigo Cine Alhambra.
Adão Mathias trabalhou em vários cinemas de rua da Capital, de lanterninha a projecionista, ele passou pelos Cine Alhambra, Cine Santa Helena, Cine Plaza, Cine Campo Grande, entre outros. Sua passagem pelo Cinema da Cinematográfica Araújo foi breve, tendo trabalhado lá quando o local ainda era novidade, de março de 1988 a março de 1989.
O ex-projecionista conta que o público amava filmes de ação, e terror/thriller. Além disso, ressalta que houveram até algumas sessões “extras” em horários não convencionais para estes filmes, e o público adorava. “Houve até um caso especial onde reproduzimos o filme ‘Canibal Holocausto’, um filme muito violento, se passaram os filmes normais, e depois que as sessões deles acabaram, lá pelas 23h00, exibíamos ele durante vários dias, com sessões até às 05h00, e lotava".
Além disso, o local possuía um preço baixíssimo como ticket de entrada e de extremo fácil acesso, por estar localizado no centro da cidade, um quarteirão abaixo da Avenida Afonso Pena. Os ingressos chegaram a custar apenas R$ 8,00 nas terças e quintas e R$10,00 nas sextas, sábados e domingos, uma estratégia visada pelo próprio diretor-presidente da Cinematográfica Araújo, Marcos Arújo.
Porém, com a chegada da década de 90, alguns fatores fizeram com que, pouco a pouco, os cinemas de rua, inclusive o Cine Campo Grande, fossem perdendo a força. Para a Marinete, a chegada do Cinemark, que trazia consigo as salas ‘Cineplex’, com maior número de assentos, ambiente climatizado e maior qualidade na projeção, além de uma lanchonete com várias opções de lanches e aperitivos, fizeram com que o cinema perdesse sua força. O aumento das vídeolocadoras também. A Hélio’s Vídeo, por exemplo, chegou em Campo Grande no final dos anos 90 e se espalhou pela Capital, se tornando a maior rede de videolocadoras do Estado.
Já para Adão, a chegada do Cinemark com a permissão da entrada na cabine com latas de refrigerante pode ter influenciado na baixa procura. "Isso inclusive, o próprio Cinemark já disponibilizava (um combo), enquanto que o Cine Campo Grande só fazia pipoca".
Mesmo com certos desfalques, o local ainda permaneceu exibindo os filmes nas suas duas salas até novembro de 2012. A Cinematográfica Araújo, que até hoje possui salas na cidade de Dourados, não havia informado o motivo do encerramento das atividades em Campo Grande.
No ano seguinte, o imóvel foi adquirido pelo Sesc Cultura, que buscava investir na capital e já estava de olho em alguns locais recém-fechados no centro. No local, foram instalados biombos em frente à entrada, e para instigar a população sobre o que viria, um graffiti foi feito neles pelo artista Rafael Mareco, com cores, personagens e até o nome “Sesc Cultura” no canto da obra. Em nota sobre a compra do local, o Sesc Cultura pontua: “O Sesc MS adquiriu o Cine Campo Grande em 2013 com o objetivo de reformar o local para implantação de um espaço dedicado a apresentações culturais, artísticas, oficinas de dança e espaço de leitura, entre outros”. Porém, desde então, nenhuma outra alteração foi feita no ambiente. A empresa afirma não ter um cronograma de atividades pro local ainda.
INCÊNDIO - Em 2017, mesmo com o ambiente isolado, cercado pelos biombos, um incêndio ocorreu no local. Precisamente, no dia 17 de junho o Corpo de Bombeiros Militar foi chamado para combater um incêndio que havia começado no piso inferior do local. Segundo o Centro Integrado de Operações em Segurança de Mato Grosso do Sul (CIOPS - MS), a primeira guarnição a chegar ao local realizou uma entrada forçada com o objetivo de localizar supostas vitimas e nada foi encontrado. Após isso, os bombeiros tiveram de enfrentar as labaredas com cinco lances de mangueiras de 15 metros de comprimento e foram gastos aproximadamente 2 mil litros d’água para apagar o fogo.
Ainda em nota, o Sesc Cultura afirmou que o incêndio não chegou a abalar a infraestrutura do prédio.