Brasil é ‘raia miúda’ na luta comercial entre EUA e China, diz economista
Para o professor da USP Simão Davi Silber, o País não deve escolher um lado na disputa entre os dois gigantes
ECONOMIAA pandemia do novo coronavírus pode abrir espaço para um maior protecionismo no comércio global. Mas, para Simão Davi Silber, doutor em Economia Internacional e professor da Universidade de São Paulo (USP), o resultado pode ser negativo inclusive para as duas maiores economias do planeta: Estados Unidos e China.
Em entrevista, ele afirmou que o Brasil, nesse cenário, não deve escolher um lado na disputa dos dois gigantes.
O setor agrícola será o mais importante após a pandemia? Ele vai liderar a retomada comercial do Brasil?
Com certeza. Como haverá muita capacidade ociosa na economia, muito desemprego, a retomada será relativamente forte no ano que vem. E não tenha dúvida: a primeira necessidade é comer. E, para proteicos, o Brasil é fundamental. Agora, veja o seguinte: por que somos tão bons no agronegócio? Porque 50 anos atrás se fez a Embrapa. Foi estratégico. Isso é tecnologia. Não adianta querermos reinventar a roda. Se houver uma luta estratégica, será entre gigantes, não será com a gente. Nós somos raia miúda. Quem dominará o mundo é a China ou os EUA.
Para o presidente do BC, Roberto Campos Neto, depois da pandemia o comércio internacional será diferente do que vimos até hoje. O que o sr. Visualiza?
Desde 2017, o número de conflitos comerciais já vinha aumentando. Isso bem antes do momento atual. Quem começou foi o presidente dos EUA, Donald Trump, e as retaliações vieram da China, da Europa e do Canadá. Foi tiro para todo lado. O que a gente sabe é que, historicamente, depois de uma boa briga todo mundo se machuca e algum tipo de cooperação acaba surgindo. Como o comércio internacional vai ter uma queda significativa com a pandemia, teremos duas forças antagônicas funcionando, uma mais nacionalista e outra mais internacionalista. Mas existe um ditado popular que vale também para a economia: um péssimo acordo é melhor do que a melhor briga.
Há risco de aumento das barreiras comerciais?
Existe essa possibilidade porque os países estarão fragilizados. Você tem duas forças, antagônicas, e se ocorrer o que vimos nos anos 30, quando todo mundo se fechou ao comércio internacional, a crise mundial vai se estender por muito mais tempo. Porque o comércio é um mecanismo grande de expansão de mercado. Ainda mais hoje, com as cadeias internacionais de suprimentos. Se a China parar, você não consegue montar celular no Vale do Paraíba. Então, a interdependência é de tal ordem que o custo econômico é gigantesco, comparado com o benefício político. Agora, se houver uma brutal irracionalidade, pode haver aumento do protecionismo.