Cooperativismo contribui para autonomia das mulheres rurais
Campanha #Mulheres Rurais, Mulheres com Direitos promove 15 dias de mobilização para valorizar das trabalhadoras do campo
DESAFIOEm 2009, Ivanete de Souza, agricultora do interior de Santa Catarina, enfrentou um de seus maiores desafios: assumir a presidência da Cooperativa de Produção Agropecuária de Jaraguá do Sul, da qual é sócia-fundadora, e que foi criada em 2004 para apoiar a comercialização de leite de pequenos produtores da região. Cinco anos após a fundação da cooperativa, o maior cargo de gestão da instituição, a presidência, foi ocupado por uma mulher.
“Tivemos alguns problemas e, em 2009, o então presidente saiu. Durante as eleições alguém falou meu nome. Fui votada e fiquei na presidência por oito anos”, relembra Ivanete que, durante o primeiro mandato, era a única entre os homens. No segundo, ela conseguiu trazer para a cooperativa mais duas mulheres que assumiram o comando junto com ela. Ivanete foi buscar mais conhecimento sobre cooperativismo, filiou-se à União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), uma das afiliadas à União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias (Unicopas).
“Ser mulher foi meu principal desafio. Quando eu assumi eu ouvi de muitas pessoas: ela nem sabe o que está fazendo. Não devia nem estar lá dentro. Eu morria de medo de tudo e de todos. Tinha uns senhores grandões que me diziam: a cooperativa tem de continuar, você tem de dar conta. A responsável é você. E eu morria de medo disso. Até que um dia eu descobri que eu não precisava ter medo deles e podia enfrentá-los de igual para igual”.
Com a chegada de Ivanete à presidência, a produção começou a mudar. Do leite e da banana, a cooperativa passou a trabalhar com hortaliças. No segundo ano de mandato, 2010, começaram a atender vários municípios da região por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), e o salto foi grande.
De acordo com Ivanete, de um faturamento anual que girava em torno de R$ 90 mil, a cooperativa chegou a atingir o auge de R$ 3,5 milhões. “Hoje somos 61 cooperados, atendemos quatro municípios via PNAE, nosso carro-chefe são as hortaliças e, neste ano, nosso faturamento deve girar em torno de R$ 3 milhões”, comemora.
Mais que isso, outro motivo de orgulho é o trabalho que começou a desenvolver com as mulheres da comunidade. Em 2016, a cooperativa conseguiu montar uma unidade de processamento de hortaliças formada por um grupo de cinco mulheres que descascam, cortam, embalam e vendem os produtos. É um processo de mudança que, segundo ela, aos poucos, vem sendo construído.
“Quando começamos com a unidade de processamento comandado pelas mulheres, elas mesmas ficaram receosas, mas hoje elas têm mais força. Eu sempre digo: são vocês que decidem. Eu sempre simbolizei que o elefante é um animal bem grande, mas a lenda diz que ele tem medo de rato. E o rato era eu [risos]. Eu consegui! Quando eu perdi o medo eu enfrentei de igual para igual”.
Para Ivanete, o cooperativismo é sinônimo de elevação da alma, de evolução para as mulheres. Ela conta um caso de outra mulher do grupo em que o marido saiu da empresa e foi para a roça trabalhar junto com a esposa porque enxergou o tanto que ela estava evoluindo. “Agora ele chega e diz para ela: Oh, se na semana que vem você não vier trabalhar comigo na roça, eu vou ficar aqui sentado. Ele foi trabalhar naquilo que ela acredita, porque ela conseguiu administrar o trabalho dela, o tempo dela. Outro caso é de uma cooperada que chegava e dizia: Ai, meu Deus, preciso fazer meu marido fazer as coisas em casa. Eu sempre dizia que era para ir aos poucos. Recentemente, ela passou por uma cirurgia e o marido tomou conta de tudo dentro de casa. Ver elas ganhando essa autonomia me enche de orgulho”.
Campanha 2019 #MulheresRurais, Mulheres com Direitos
De 1º a 15 de outubro, a Campanha #Mulheres Rurais, Mulheres com Direitos promove 15 dias de mobilização para valorizar a contribuição das trabalhadoras do campo ao cumprimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável relacionados à igualdade de gênero e ao fim da pobreza rural. O tema norteador da quinzena ativista é “O futuro é junto com as mulheres rurais”, com a hashtag #JuntoComAsMulheresRurais.
O principal objetivo da campanha é destacar o trabalho promovido por pescadoras, agricultoras, extrativistas, indígenas e afrodescendentes. A campanha no Brasil é coordenada pela Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em parceria com a FAO, a ONU Mulheres, a Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do Mercosul (REAF) e a Direção-Geral do Desenvolvimento Rural do Ministério da Pecuária, Agricultura e Pesca do Uruguai.