JOÃO CAMARGO - Alfaiate dono da Alfaiataria Camargo
EntrevistaSão 19 anos de uma carreira na moda que elevou o perfil dos cortes nos ternos dos homens e até já rendeu uma cadeira na Câmara Europeia da Alta-Costura, na Itália.
Esse “tesoura de ouro” já atingiu a marca dos 8 mil ternos vendidos em todo o Brasil para as principais celebridades, a exemplo do empresário do SBT, Sílvio Santos, e do presidente da Tam, Líbano Barroso, entre outros famosos, é um homem simples, que fala bem, de bom gosto e que se tornou famoso ao vestir o público masculino, dos pés à cabeça. Em seu ateliê em São Paulo já soma quase 100 funcionários e este ano sua marca deve embolsar 12 milhões de reais em faturamento. Entre suas peças que chamaram a atenção, está o figurino que Ocimar Versolato projetou para o cantor Ney Mato Grosso na turnê “Inclassificáveis”, que João Camargo desenvolveu.
Recentemente, instalou-se no Shopping Iguatemi, em Brasília, e em São Paulo mantém duas lojas nos melhores points da pauliceia desvairada. Sua nova coleção a ser lançada no final de março vai trazer a brasilidade como tema. Mas João Camargo, 35 anos, casado com Lúcia e pai de três filhos, nem precisa entrar no campo da moda para fazer render uma boa conversa. Na entrevista, o alfaiate que odeia ser chamado de estilista, fala do sucesso da carreira, da maneira como trata os clientes famosos e até de um dos micos que já pagou.
Do apoio que o empresário sul-mato-grossense Zeca Lopes deu no início de sua carreira e até dos tecidos que trouxe do outro lado do mundo, à base de fios de ouro e fragmentos de diamantes para atender aos clientes mais exigentes. “Os brasileiros gostam de novidades na roupa, mas sem afetação. Somos mais machões do que os europeus”, diz.
João Camargo: Comecei a minha carreira, mesmo, aos 17 anos, na Minelli, que foi a maior alfaiataria que o País já teve. Depois trabalhei na Brooksfield e daí veio o Ricardo Almeida.
JC: Por coincidência ou não, hoje, antes de desembarcar em Campo Grande, fiz o terno para o filho do ex-presidente Lula. Quanto ao Ricardo, a gente se respeita bastante, eu tenho admiração pelo trabalho dele, em todas as entrevistas que faço o elogio, mas a recíproca não é verdadeira, a gente se respeita, mas não nos falamos mais.
JC: É muito claro isso. A moda nos últimos 15 anos afastou a figura “homem”, quando se fala para um homem, vamos a um desfile de moda, ele tem certo preconceito, e na minha loja tem o clube do bolinha, por lá a gente faz roupa para homem, com a imagem “homem”. Com isso, como acaba sendo um ambiente bussiness, de executivos, personalidades, eles acabam se abrindo comigo, por que sentem-se à vontade, eles percebem que é um ambiente masculino, onde acabo sugerindo de endocrinologistas a academia.
JC: Porque eu vejo assim: tem alguns estilistas que criam seus estilos, eu me acho modelista, sou entendido na engenharia da roupa. Já fiz parcerias com o estilista Ocimar Versolatto, que desenhou a roupa do Ney Mato Grosso criando o estilo e eu construí. Por isso que sou alfaiate, modelista e não só estilista.
JC: Foi um convite que tive do Luigi Gallo, em Roma, que tem uma escola e eu também tenho interesse em montar uma escola em São Paulo. Assim, devemos fazer algumas coisas juntos, pois vou trazê-lo em meu desfile dia 29 de março para sugerir parcerias. Claro que fazer parte de uma comitiva de bons nomes é sempre bom.
JC: Ainda não, mas Campo Grande é uma grande cidade onde faço muitos ternos. Tirando São Paulo e Brasília, aqui é a terceira colocada. Quem sabe daqui a dois ou três anos, a alfaiataria Camargo esteja aqui num dos shoppings da cidade?
JC: Passando ensinamentos. Um dos motivos pelos quais as grandes alfaiatarias acabaram é porque não passavam ensinamentos a seus funcionários e filhos. Talvez por falta de segurança. Eu faço isso sem medo de um funcionário meu, virar meu concorrente.
JC: Honestamente, trato como a todos os outros clientes. Estava até comentando com o Zeca Lopes, mas minha vaidade é ganhar bem na sinuca, (risos). Trato a todos igualmente, eu não me importo se o cara é dono ou presidente de uma empresa ou se está comprando um terno que é o sonho de um casamento. Eu trato os artistas assim e o único que me deu um gelo na barriga de atender foi o Sílvio Santos, que é uma pessoa que admiro desde pequeno e via minha avó só tecendo elogios. Quando ele falou boa tarde em meu ateliê, dei uma tremida. Depois, com a educação dele, a humildade dele, que é bacana, eu fui relaxando e é assim que trato a todos.
JC: Esses clientes que compraram ternos com tecidos de fios de ouro ou fragmentos de diamantes não são nomes conhecidos. Compram por gostar. Fiz um terno de fio de ouro a um senhor, de aniversário de 80 anos, que é um admirador da indústria têxtil e que é avesso em aparecer. São gostos diferentes.
JC: Varia, começa com R$ 3.500 e vai até R$ 40 mil, porque faço design contemporâneo, mas seguindo o perfil conservador da clientela. Por isso que digo que “os brasileiros gostam de novidades na roupa, mas sem afetação. Somos mais machões do que os europeus.”
JC: O que está acontecendo com o casamento é muito importante. É um baita mercado, porque às vezes o cara nunca comprou um terno sob medida, ou um terno bom, e até a noiva ou a esposa dizem-lhe para ir comprar um terno com o Camargo, e ele acaba gostando. O que os clientes procuram é ser a pessoa importante do casamento, claro que a nº 1 é sempre a noiva, mas eles têm que estar bem vestidos, mesmo sem muita vaidade, mas lógico que você, quando bate o olho, já diz: como você está elegante.
JC: Já paguei alguns, até vou contar um meio desagradável. Uma vez me chamaram na loja dos Jardins, porque minha equipe não estava acertando a roupa do noivo, e eu sou muito brincalhão, e ele queria uma calça muito justa. Eu tentei brincar com ele duas vezes e o cara sério. Como já havia percebido o problema na roupa, fiquei ajoelhado na frente dele para tirar novas medidas, até pensei que se alguém passasse pela frente da loja e me visse naquela posição, iria pensar que não existe um costureiro macho nessa terra. Na verdade, a roupa estava marcando muito as genitais do rapaz, estava dando mais efeito de um lado do que do outro, e eu virei pra ele e falei: meu jovem, você está com defeito de um lado da calça, se você pegar tudo isso, para não falar que era grande, e jogar para o outro lado, você vai ter o efeito do mesmo jeito, no outro lado. Então não tem muito o que fazer. São alguns micos que a gente paga. Finalizei dizendo: ou você coloca esse volume no meio ou, alarga a calça. (Risos).
JC: profissionalmente falando, espero que minha roupa seja reconhecida lá fora, o que graças a Deus já está sendo, e que faça a diferença. Nós brasileiro temos muito calor humano e isso faz com que consigamos transferir para a roupa. Pois todo cliente que compra tem que ter alma. Particularmente, um sonho que tenho é de ser avô, o que não vai demorar muito porque tenho uma filha de 13 anos.
JC: Estou preparando meu desfile, abrindo mais uma loja no Iguatemi Alphaville e cuidando da nova coleção, cujo tema é brasilidade, onde quero pensar na coleção outono-inverno para o mercado europeu, que é muito bonito.
JC: De jeito nenhum, até vi uma entrevista do Ney e achei que tem muito a ver com o meu começo da entrevista com você, quando disse que faço roupa pra homem, porque o Ney fala que adora ser homem, ter pelo no peito e ter pênis. Então você tem que se aceitar. Por isso que falo que fiz um dos melhores trabalhos, porque a roupa dele era na modelagem do corpo, de forma justa, e como ele é uma pessoa bem resolvida, adorou o trabalho.
JC: Eu que agradeço ter tantos clientes aqui em Mato Grosso do Sul e espero você no meu ateliê para eu provar seus ternos, seus jeans, sapatos e cintos, daqui pra frente, pois já estou com suas medidas.