Carlos Alberto Ferreira de Miranda | 29 de agosto de 2017 - 15h17

Coversão de multas ambientais: possibilidade de solução de passivos ambientais de forma sustentável, econômica e eficaz

De forma mais detalhada, o Decreto Federal nº 6.514/08 especificou as atividades que podem ser objeto da conversão de multa (art. 140)

ARTIGO
Carlos Alberto Ferreira de Miranda é advogado integrante do Escritório Miranda, Possari, Muniz & Guimarães Advogados Associados - Divulgação

Os órgãos de fiscalização ambiental (IBAMA, ICMBIO, IMASUL, PMA) possuem competência para lavrar Autos de Infração sobre condutas lesivas ao meio ambiente e, quando isto ocorre, os autuados às vezes tem dúvidas quanto à elaboração de defesas administrativas, bem como sobre providências que podem ser tomadas para sanar os passivos ambientais caracterizadores das infrações.

A Lei Federal nº 9.605/98 – Lei dos Crimes Ambientais, ao dispor sobre as sanções aplicáveis às infrações administrativas, estabeleceu, no seu artigo 72, parágrafo 4º, que a multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente. Este dispositivo legal foi regulamentado pelo artigo 60 do Decreto Federal nº 3.179/99, fazendo constar que as multas ali previstas poderiam ter sua exigibilidade suspensa, quando o infrator, por termo de compromisso aprovado pela autoridade competente, se obrigasse à adoção de medidas específicas para fazer cessar ou corrigir a degradação ambiental.

O artigo 60 acima referido foi, na realidade, a primeira modalidade legal de conversão de multa administrativa ambiental em serviços de Preservação, Melhoria e Recuperação da Qualidade do Meio Ambiente e vigorou até a publicação do Decreto Federal nº 6.514/08, que revogou o Decreto Federal nº 3.179/99 e passou a dispor, nos seus artigos 139 a 148, sobre novos procedimentos para a conversão de multas.     

De forma mais detalhada, o Decreto Federal nº 6.514/08 especificou as atividades que podem ser objeto da conversão de multa (art. 140); os casos em que não cabe a conversão (art. 141); o valor dos serviços de conversão em relação ao valor da multa aplicada (art. 143); a necessidade de apresentação de pré-projeto do serviço a ser realizado (art.144); o poder discricionário da Administração Pública, para deferir ou não o pedido de conversão (art. 145, § 1º); e as exigências para celebração do termo de compromisso (art. 146).

Destaque-se que esta modalidade de conversão de multa não é restrita à questão florestal, podendo ser aplicada as outras condutas que resultem em dano direto ao meio ambiente, como, por exemplo, nos casos de erosão do solo.

Ocorre, porém, que a aplicação da conversão de multa com base no Decreto Federal nº 6.514/08 foi obstaculizada pela Instrução Normativa/IBAMA nº 10, de 07/12/2012, a qual fez constar, no seu artigo 75, que a apreciação de pedidos de conversão de multa ficaria sujeita à regulamentação própria a ser editada no âmbito do IBAMA, além de banco de projetos de recuperação de áreas degradadas aprovado pelo Conselho Gestor, devendo tais pedidos serem indeferidos enquanto não adotadas estas providências.

Cabe aqui registrar que, passados quase de 5 anos da publicação desta Instrução Normativa, referida regulamentação ainda não foi feita pelo IBAMA.

A segunda modalidade legal de conversão de multa ambiental foi instituída pela Lei Federal nº 12.651/2012 – Novo Código Florestal, a qual fez constar, no parágrafo 4º, do artigo 59, que após a inscrição do imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural – CAR e a adesão do interessado ao Programa de Regularização Ambiental – PRA, o proprietário ou possuidor não poderá ser autuado por infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008, relativas à supressão irregular de vegetação em Áreas de Preservação Permanente – APP, de Reserva Legal e de Uso Restrito.

Consta, ainda, do parágrafo 5º, do mesmo artigo 59, que a partir da assinatura do termo de compromisso, serão suspensas as sanções decorrentes das infrações mencionadas no parágrafo 4º, e que uma vez cumpridas as obrigações assumidas no mesmo Termo, nos prazo e condições estabelecidos, as multas serão consideradas como convertidas em serviço de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.

Em Mato Grosso do Sul, o Programa de Regularização Ambiental – PRA é denominado “Programa MS Mais Sustentável” e foi regulamentado pelo Decreto Estadual nº 13.977/2014.

Esta modalidade de conversão de multas foi disciplinada pela Instrução Normativa/IBAMA nº 12/2014, a qual especifica os requisitos mínimos para assinatura do termo de compromisso, atribui a este força de título executivo extrajudicial e exige sua publicação em jornal oficial, para que tenha plena eficácia.

Após o atendimento dessas exigências, inclusive a inscrição do imóvel no CAR e a adesão ao PRA, o Autuado poderá requerer ao órgão fiscalizador que suspenda as sanções decorrentes dessas infrações.

Quanto à terceira modalidade legal de conversão de multa, consta do artigo 42 do Código Florestal que o Governo Federal implantará programa para conversão da multa prevista no art. 50 do Decreto Federal no 6.514/2008 (florestas e demais formas de vegetação nativa que tenham regime jurídico próprio e especial de conservação ou preservação definido pela lei), destinado aos imóveis rurais que sofreram autuações vinculadas aos desmatamentos em áreas onde não era vedada a supressão, promovidos sem autorização ou licença, em data anterior a 22 de julho de 2008.

Ocorre que, esta modalidade de conversão de multa também não foi regulamentada até a presente data, ainda que já tenha transcorrido mais de 5 anos da publicação do Código Florestal.

Também com relação a esta terceira modalidade de conversão de multa, o Decreto Federal nº 8.235, de 05/05/2014, que estabelece normas complementares aos Programas de Regularização Ambiental dos Estados e do Distrito Federal e institui o Programa Mais Ambiente Brasil, diz, no seu artigo 22, que...”Ato conjunto dos Ministros de Estado do Meio Ambiente, do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Advocacia-Geral da União disciplinará, no prazo de um ano, contado da data de publicação deste Decreto, o programa para conversão de multas aplicadas por desmates ocorridos em áreas onde não era vedada a supressão de vegetação referido no art. 42 da Lei nº 12.651, de 2012”.

O parágrafo único do artigo 22 acima referido diz, ainda, que... “O cumprimento das obrigações estabelecidas no programa poderá resultar, na forma prevista pelo ato conjunto previsto no caput, na conversão da multa aplicada às hipóteses previstas no art. 3º, caput, inciso l, art. 139, art. 140 e art. 141 do Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008”.

A edição do ato conjunto, previsto no Decreto Federal acima referido, deverá disciplinar não só o programa para conversão de multa de que trata o artigo 42 da Lei Federal nº 12.651/2012 (terceira modalidade legal), mas, também, as outras hipóteses de conversão previstas nos artigos 3º, 139, 140 e 141 do Decreto Federal nº 6514/2008 (primeira modalidade legal).

Esta é, com certeza, a providência que falta para dar plena efetividade às modalidades de conversão de multa previstas na legislação federal, fazendo-se necessário que o poder público edite, o mais rápido possível, a norma legal respectiva.

A excessiva demora nessa regulamentação poderá ensejar a propositura de ações judiciais contra atos da administração pública, na medida em que o particular fica impedido de gozar de benefícios legais que lhe permitam solucionar os passivos ambientais apontados nos autos de infração administrativa, da forma mais econômica, sustentável e eficaz, uma vez que os investimentos utilizados na recuperação do meio ambiente são abatidos do valor total da multa.

Para finalizar, é importante lembrar que a inscrição dos imóveis rurais no CAR e a adesão ao PRA, cujo prazo expira em 31/12/2017, constituem-se em mecanismos eficazes de implementação do Código Florestal e merecem ampla divulgação, haja vista que proporcionam diversas vantagens ao autuado, dentre elas, a suspensão das sanções após a assinatura do termo de compromisso e a regularização definitiva dos passivos ambientais do imóvel rural, após o cumprimento das obrigações assumidas naquele documento.