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OPINIÃO

Diferenças e semelhanças

20 fevereiro 2016 - 12h19Ronaldo Mota
Ilustração
Comper

Estou hoje em Londres quase três anos depois das violentas manifestações populares do verão de 2011 que atingiram alguns bairros da cidade e se espalharam pelo país naquele período.

Tudo começou em um sábado, 6 de agosto, em um protesto pela morte de Mark Duggan, morador de Tottenhan, que havia sido atingido por balas de policiais dois dias antes. A situação se agravou pela prisão de uma jovem de 16 anos, a qual segundo a polícia havia sido desrespeitosa com eles. A partir daí, foi ateado fogo em carros dos policiais, ônibus e propriedades públicas e particulares. Durante quatro dias a situação aparentou estar perto de perda de controle.

Na seqüência, o Primeiro Ministro David Cameron cancelou suas férias, bem como o fizeram todos os líderes da oposição, tendo o parlamento sido convocado extraordinariamente em 11 de agosto.

Em 15 de agosto, passados nove dias, 3.100 pessoas haviam sido presas, fruto de 3.443 crimes considerados conectados, incluindo registro de cinco mortes e 16 pessoas feridas. Em agosto de 2012, um ano após, 1.292 pessoas haviam sido condenadas a um total de mais de 1.800 anos somados de prisão, numa média de 16,8 meses cada uma.

Discussões sobre as causas dos tumultos permanecem até hoje e incluem desde crise do capitalismo e aumento da distância entre pobres e ricos até racismo e a falência do sistema educacional. É fato que o 1% da população mais rica detém riquezas individuais de mais de £ 2,6 milhões, enquanto os 10% mais pobres, menos de £ 8,8 mil, sendo que esta diferença continua a crescer.

No entanto, não houve nenhum partido político, qualquer autoridade ou órgão de imprensa que não tivesse corroborado plenamente com as punições e prestigiado, no geral, os policiais envolvidos. Tudo em nome da institucionalidade e a favor da manutenção da ordem e da paz como condições imprescindíveis ao convívio social. O resultado líquido é que as manifestações cessaram e nada semelhante ocorreu em Londres desde então.

As manifestações do último ano no Brasil guardam muitas semelhanças e enormes diferenças. Salvo casos extremos, pouquíssimos presos, muitas justificativas e condescendências com os manifestantes e nenhum apreço explícito pelas ações institucionais dos policiais. Parece que preservar, antes de mais nada, as instituições não faz parte da cultura dos brasileiros de forma tão arraigada como o é para os britânicos.

A título de exemplo, há poucos meses os sem-terra tentaram invadir o Palácio do Planalto e guardas palacianos foram feridos. No dia seguinte, a presidente Dilma recebeu os sem-terra, cumprindo o acordado por ocasião da tentativa de invasão. Teria feito igualmente bem a presidente se tivesse também visitado os guardas feridos, demonstrando assim, de forma evidente, que a defesa da institucionalidade é um bem não menor do que o direito à manifestação. Essa visita não houve, salvo engano meu. São significativas as diferenças.

(*) Ronaldo Mota é Chanceler e Diretor Corporativo de Pesquisa da Universidade Estácio de Sá

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