
Em novembro de 2025, quando os olhos do mundo se voltarem para Belém durante a COP30, uma história extraordinária será contada no coração da Amazônia. Não será apenas sobre florestas ou rios, mas sobre como um estado do Centro-Oeste brasileiro transformou-se no laboratório mais avançado de agricultura sustentável do planeta. Mato Grosso do Sul conquistou algo que parecia impossível: liderar o crescimento econômico nacional enquanto constrói o caminho para a neutralidade de carbono.

A projeção econômica comprova essa liderança: crescimento de 6,86% no PIB estadual para 2025, chegando a R$ 227,8 bilhões, conforme estimativa da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) divulgada em dezembro de 2024. Por trás desse dinamismo está o agronegócio, que registrou em 2023 o maior crescimento do país – impressionantes 32%, segundo a Resenha Regional do Banco do Brasil. Enquanto gigantes como Mato Grosso (23,5%) e Paraná (22,9%) celebravam seus resultados, MS já demonstrava que sustentabilidade e competitividade não são conceitos antagônicos, mas complementares. A safra 2024/25 consolida essa tese: 75,3 milhões de toneladas de grãos em 7,4 milhões de hectares geram riquezas que representam 17,9% do PIB estadual – o maior percentual do país, conforme dados da Semadesc.
Mas a verdadeira revolução não está apenas nos números. Está na consolidação de uma estratégia de longo prazo que posiciona Mato Grosso do Sul como protagonista da sustentabilidade global. Agora, o "MS Day" no espaço dedicado à agricultura sustentável (AgriZone) da COP30 representa a oportunidade de mostrar ao mundo como transformar ambiciosas metas de neutralidade de carbono até 2030 em realidade.
A seleção da proposta "MS Day - MS Carbono Neutro na COP30" pela Embrapa para integrar a programação do espaço dedicado à agricultura sustentável (AgriZone) representa o reconhecimento nacional de que Mato Grosso do Sul desenvolveu algo único: um modelo replicável de desenvolvimento sustentável. O ponto alto do evento será a assinatura do "Pacto MS Carbono Neutro", um documento que representa um chamamento histórico à sociedade sul-mato-grossense. O governo estadual, que já assumiu formalmente o compromisso de neutralidade de carbono, agora convida todo o ecossistema social e econômico a aderir a essa meta. A iniciativa busca transformar um compromisso governamental em pacto social abrangente.
A programação técnico científica do "MS Day" revela a sofisticação conceitual por trás da iniciativa. Oito horas de debates estruturados em quatro painéis temáticos que abordam desde saberes ancestrais até biotecnologia de ponta, demonstrando que a solução climática não está apenas no futuro, mas na síntese inteligente entre tradição e inovação em diversas áreas do conhecimento.
O primeiro painel, "Povos Originários e Agricultura Familiar", não é concessão ao politicamente correto, mas reconhecimento científico de que práticas milenares oferecem soluções para desafios contemporâneos. Lideranças indígenas, pesquisadores e especialistas em sistemas agroflorestais compartilharão conhecimentos que a ciência moderna está redescobrindo.
O Pantanal, patrimônio natural mais emblemático do estado, ganha painel dedicado às suas vulnerabilidades e potencialidades climáticas. Não por acaso: o maior bioma úmido continental do planeta é simultaneamente termômetro das mudanças climáticas e laboratório de soluções baseadas na conservação.
O terceiro painel revela onde Mato Grosso do Sul está construindo seu futuro: na bioeconomia. Executivos do setor de biocombustíveis, pesquisadores em biotecnologia, representantes de startups do agronegócio e lideranças do setor florestal debaterão como a inovação está criando cadeias produtivas de baixo carbono que atraem investimentos bilionários para o estado.
O setor florestal exemplifica essa transformação em escala impressionante. Responsável por 10,7% do PIB estadual e movimentando R$ 15,7 bilhões em 2024, MS registrou expansão de 500% na área de florestas plantadas na última década, chegando a 1,5 milhão de hectares. O estado concentra grandes players do setor: Suzano (R$ 15,9 bilhões em nova fábrica em Ribas do Rio Pardo), Arauco (R$ 25 bilhões em Inocência), Bracell (R$ 20 bilhões em Bataguassu) e Eldorado (já estabelecida em Três Lagoas). Juntos, esses investimentos superam R$ 70 bilhões até 2028, gerando mais de 26 mil empregos diretos e indiretos, segundo dados da Semadesc, e consolidando MS como o maior polo de celulose do país.
Os números justificam o otimismo. MS responde por 7,6% da agropecuária nacional em 2024, com destaque para 7,2% da soja e impressionantes 12,3% do milho brasileiro, conforme dados do IBGE. Mas o diferencial não está apenas no volume: está na capacidade de produzir mais com menor impacto ambiental, combinando produtividade com sustentabilidade que desperta interesse de outros estados.
O painel de encerramento, "Fronteiras Sustentáveis", apresentará casos concretos de descarbonização no agronegócio. Produtores rurais pioneiros, pesquisadores em agricultura de baixo carbono e especialistas em mercado de carbono compartilharão experiências que demonstram como a teoria se transforma em resultados práticos no campo.
Essa abordagem reflete uma mudança paradigmática na forma como o Brasil se posiciona nas discussões climáticas globais. Se antes éramos vistos principalmente como guardiões de florestas, agora emergimos como desenvolvedores de soluções tecnológicas que podem ser replicadas em outras regiões do mundo.
A participação no espaço dedicado à agricultura sustentável (AgriZone), na COP 30, representa mais que uma vitrine de conquistas. É a consolidação de décadas de pesquisa e desenvolvimento que colocaram a agricultura brasileira na vanguarda da sustentabilidade global. O setor agropecuário, responsável por 18% das emissões de gases de efeito estufa mundiais em 2024 segundo dados da Embrapa, precisa ser parte da solução – e Mato Grosso do Sul está demonstrando como.
A aprovação da proposta sul-mato-grossense pela Embrapa confirma algo que já suspeitávamos: MS desenvolveu um modelo de desenvolvimento sustentável que desperta interesse internacional. Não é coincidência que o estado tenha atraído investimentos bilionários nos últimos anos, posicionando-se como destino preferencial de empresas que buscam aliar competitividade com responsabilidade ambiental.
Por trás de cada conquista sustentável de Mato Grosso do Sul existe uma base científica sólida que sustenta essa transformação. As unidades da Embrapa no estado desenvolvem pesquisas em sistemas que integram agricultura, pecuária e/ou florestas numa mesma área (ILPF), sequestro de carbono, melhoramento genético e conservação de biomas que fornecem as bases técnicas para conciliar alta produtividade com sustentabilidade ambiental.
Esse ecossistema de inovação estadual é formado pela Embrapa em articulação com universidades públicas e privadas, que alimentam o setor produtivo com pesquisa aplicada, formação de recursos humanos especializados e desenvolvimento de tecnologias adaptadas às condições locais. As fundações de pesquisa estaduais completam esse sistema, conectando o conhecimento científico com a aplicação prática no campo através de suas pesquisas em variedades adaptadas e validação de insumos e práticas agropecuárias para a região, estabelecendo a ponte entre laboratórios e propriedades rurais.
Essa articulação entre instituições de pesquisa, universidades, fundações e setor privado criou um ambiente favorável à inovação que atrai startups, empresas de biotecnologia e multinacionais interessadas em soluções sustentáveis. O resultado dessa sinergia ganhou reconhecimento nacional em agosto de 2025, quando Mato Grosso do Sul avançou da 17ª para a 9ª posição no pilar Inovação do Ranking de Competitividade dos Estados, elaborado pelo Centro de Liderança Pública (CLP). O salto de oito colocações demonstra a consolidação de políticas públicas estruturantes em ciência, tecnologia e inovação que fortaleceram todo o ecossistema de pesquisa agropecuária do estado.
Esse sucesso tem raízes profundas. Desde 2016, quando definiu como meta tornar-se um Estado Carbono Neutro, MS adotou a sustentabilidade como estratégia de desenvolvimento e política pública. O marco legal veio em 2021, com a oficialização do Plano Estadual MS Carbono Neutro – PROCLIMA e o anúncio do compromisso na COP26 às autoridades de 360 governos subnacionais, conforme registros do IMASUL. Agora, quase uma década depois, os resultados práticos validam a ousadia da aposta inicial.
A estratégia estadual combina políticas públicas robustas, incentivos fiscais inteligentes e linhas de crédito sustentável do Fundo Constitucional do Centro-Oeste (FCO). Entre 2019 e 2024, a linha de crédito sustentável FCO Verde destinou R$ 360 milhões para projetos de agricultura de baixo carbono, segundo dados do IMASUL. O resultado é um ecossistema integrado que combina incentivos fiscais, linhas de crédito sustentável e base científica sólida.
O governo estadual defende que produção e sustentabilidade ambiental caminham juntas, posicionando Mato Grosso do Sul como destaque no agro sustentável com foco contínuo no avanço de infraestrutura e logística para escoar a produção de forma responsável.
O Brasil pode ser o primeiro país do G20 a alcançar a neutralidade de carbono, segundo projeções do BNDES divulgadas em 2024. Mas essa meta nacional depende de experiências regionais bem-sucedidas que comprovem a viabilidade econômica da transição energética. Mato Grosso do Sul está construindo essa prova de conceito em tempo real.
A meta de neutralidade de carbono até 2030 pode parecer ambiciosa, mas os fundamentos estão sendo construídos hoje. Técnicas de baixa emissão como plantio direto, agricultura regenerativa, Integração Lavoura-Pecuária (ILP), consórcios de culturas de entressafra e manejo florestal integrado já são realidade em propriedades sul-mato-grossenses. O que falta é escalar essas práticas e criar mecanismos de monitoramento que permitam mensurar resultados.
A participação na COP30 representa um marco, mas não o fim da jornada. É o momento em que Mato Grosso do Sul deixa de ser um caso regional para se tornar referência global, oferecendo ao mundo um modelo de como conciliar crescimento econômico com responsabilidade climática.
Quando os delegados de 195 países se reunirem em Belém, não estarão apenas discutindo o futuro do planeta. Estarão conhecendo soluções que já funcionam, tecnologias que já existem, políticas que já demonstraram resultados. Estarão vendo como um estado brasileiro transformou desafios climáticos em oportunidades econômicas.
Talvez a maior conquista de Mato Grosso do Sul seja ter provado que a revolução climática não precisa ser disruptiva para ser transformadora. Não foi necessário abandonar o agronegócio para abraçar a sustentabilidade. Foi preciso reinventá-lo.
Essa reinvenção começou nos laboratórios e campos experimentais, passou pelas políticas públicas estaduais e chegou às propriedades rurais. Agora, está pronta para ser apresentada ao mundo como prova de que o futuro sustentável não é uma utopia distante, mas uma realidade em construção no coração do Brasil.
O "MS Day" na COP30 será mais que um evento. Será o momento em que uma experiência local se transforma em inspiração global, demonstrando que a solução para os desafios climáticos pode estar mais próxima do que imaginamos – às vezes, bem no centro do continente sul-americano, onde o Pantanal encontra o Cerrado e a tradição se casa com a inovação.
A proposta do governo do estado de Mato Grosso do Sul, em parceria com a Embrapa Agropecuária Oeste, Embrapa Gado de Corte e Embrapa Pantanal, foi aprovada para integrar o espaço dedicado à agricultura sustentável (AgriZone) da COP30. A iniciativa aprovada é o "MS Day - MS Carbono Neutro na COP30", que vai levar para o cenário internacional as ações de Mato Grosso do Sul rumo à sustentabilidade e ao equilíbrio climático.
(*) Rafael Zanoni Fontes é chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agropecuária Oeste.
