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MALEFÍCIOS

De distúrbios alimentares até a disfunção erétil, conheça os malefícios do consumo da pornografia

Segundo psicóloga, esse tipo de conteúdo promove uma desinformação sobre a prática sexual segura e assertiva para mulheres e homens

9 julho 2021 - 15h20Larissa Adami
O problema é que o pornô, sempre normalizado e tratado como tabu pela sociedade, traz sérios riscos psicológicos, físicos, emocionais e sociais
O problema é que o pornô, sempre normalizado e tratado como tabu pela sociedade, traz sérios riscos psicológicos, físicos, emocionais e sociais - (Foto: iStock)
Terça da Carne

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Com a facilidade ao acesso da internet e a vantagem do anonimato on-line, o consumo de conteúdos pornográficos vem ganhando mais adesão. O problema é que o pornô, sempre normalizado e tratado como tabu pela sociedade, traz sérios riscos psicológicos, físicos, emocionais e sociais.

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Desde os 13 anos, João Vitor Mendes, conta, ao Light, que o pornô sempre esteve acessível e era consumido de forma natural. “A pornografia era conveniente por muitos motivos. O conforto de não precisar se colocar diante de alguém, evitando interações e um próprio enfrentamento social, e ainda assim ter algum ‘prazer’, é o que mais me faz ver isso como um escape. Era de fácil acesso e conveniente nesse sentido antissocial”, afirma.

A psicóloga e sexóloga, Karina Brum, informa que a curiosidade por esse material inicia-se na fase fálica, dos seis aos nove anos, podendo acelerar com a falta de restrição e controle à internet. Além disso, ela também explica o porquê da pornografia ser recorrente para o público masculino hétero.

“Os vídeos, filmes, entre outras modalidades, são elaborados para priorizar a excitação masculina, sem se preocupar com enredo ou com a saúde humana. Geralmente, são usados como gatilhos de masturbação para o prazer solo ou a dois. Os conteúdos produzidos são baseados em uma cultura machista e patriarcal, onde o homem é visto como responsável pelo ‘prazer’ daquele casal e que nunca falha”, explica.

Essa necessidade em “nunca falhar” está ligada diretamente à masculinidade tóxica que recai sobre eles quando a pornografia mostra homens incansáveis, que mantém a relação sexual por horas, com mulheres estéticamente inácessíveis e que chegam ao orgasmo com extrema rapidez e facilidade. Tudo isso gera uma ansiedade de desempenho na vida real que resulta na disfunção erétil cada vez mais precoce em adultos na casa dos 20 anos, segundo pesquisa abordada pela revista Veja.

Apesar do público masculino ser majoritário, o Brasil é o 2º país no mundo onde há mais consumo pelas mulheres. Segundo o PornHub, o maior site mundial de pornografia gratuita, as brasileiras correspondem a 39% do usuários do portal.

Carolina Valdes, também psicóloga e sexóloga, argumenta que o interesse delas parte de uma temática mais funcional. Assim como eles, há uma curiosidade por entender o que é pornô e como as relações se dão neste cenário, entretanto, “na maioria das vezes, o público feminino assiste no intuito de aprender novos hábitos, apimentar mais a relação, aquecer e inspirar uma preliminar a dois”.

“Em nossa cultura e sociedade, geralmente é mais aceito um homem ter o tipo de vício em pornografia do que a mulher. Ainda há preconceito e julgamento quando ela tem esse tipo de comportamento”, lembra Carolina. Por isso vale ressaltar que o aumento desse consumo por parte delas é resultado de um processo recente de libertação, onde as mulheres se permitem gostar e experimentar conteúdos eróticos também. No entanto, mesmo que haja novas produções que visam as demandas da categoria, grande parte do material disponível continua a ser “sobre” elas e não “para” elas.

Brasil é líder no ranking de cirurgias íntimas entre as mulheres por conta da pressão visual. (Foto: Estadão)

Dentre os problemas que envolvem as consumidoras, temos os distúrbios alimentares, como anorexia e bulimia, que podem ser desencadeados na procura de alcançar os padrões de beleza das atrizes pornôs, e as complicações diretas na auto-estima com a objetificação e desmoralização dos seus corpos. De acordo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética, o Brasil é líder no ranking de cirurgias íntimas entre as mulheres por conta dessa pressão visual.

Ademais, bem como os homens, elas também criam e perpetuam expectativas irreais contra seus(suas) parceiros(as). Esse “ciclo de idealizações” entre ambos os gêneros causa frustração, afinal, homens não deixam de serem viris e másculos ao não se parecerem com os atores pornôs de forma visual e comportamental, assim como mulheres não deixam de serem atraentes, dignas de respeito e suficientes ao não corresponderem ao perfil estético das atrizes e realizarem as performances das mesmas.

Outro fator a ser problematizado é a possibilidade de um prazer ancorado apenas no pornô, sem o estímulo da sua imaginação. A prática da masturbação com apoio do conteúdo pornográfico faz com que o indivíduo fique acostumado em ter sempre o total controle da própria experiência sexual. Dessa forma, ele não está preparado para as diversas variáveis no sexo a dois na realidade, logo também, não conseguirá mais se satisfazer e proporcionar o prazer ao outro sem a motivação do material erótico.

João Vitor lamenta como o comportamento sexual motivado nos vídeos afetou sua vida amorosa e social. “A pornografia como um todo afetou bastante minha visão sobre relacionamentos, mesmo na época da adolescência, e me colocou em muitas situações onde eu me sentia obrigado a expressar alguma sexualidade por mais que não tivesse a necessidade - nesse tempo, estava no meu primeiro relacionamento e lembro de ter algumas atitudes bastante machistas e sexistas em cima desse próprio consumo. Com o passar do tempo, vi o efeito quase que reverso, o próprio consumo de pornografia me fazia repudiar o próprio ato, isso já no fim do Ensino Médio”, esclarece.

É muito comum que mesmo repudiando a Indústria Pornográfica, alguns usuários continuem a consumir seus produtos. Isso porque, assim como outros vícios (álcool, cigarro e substâncias ilícitas), o cérebro é condicionado à compulsividade por mais conteúdos.

Em termos técnicos, a dopamina - um neurotransmissor do cérebro humano responsável, dentre outros fatores, pela sensação de prazer - é liberada em pequena quantidade quando o que apreciamos visualmente, por exemplo, nos proporciona bem-estar. Assim como na relação sexual, ao assistir as hiperestimulantes cenas pornográficas, os indivíduos têm as mesmas regiões do cérebro ativadas, liberando uma quantidade enorme de dopamina.

O contato contínuo e regular com o pornô interfere nesses neuroreceptores já que há fortes explosões anormais de prazer. Isso cria uma tolerância aos estímulos, induzindo os indivíduos a conteúdos mais agressivos. Categorias como incesto (relação afetiva entre irmãos), pedofilia, zoofilia (atos sexuais com animais) e violência durante o ato intímo, são mais buscadas devido a perda do interesse e satisfação pelo sexo convencional, influenciando padrões de comportamento na vida real.

Esse tipo de conteúdo promove uma desinformação sobre a prática sexual segura e assertiva para mulheres e homens. “Em qualquer área da educação, a pornografia que nós temos acesso está longe de gerar expectativas positivas educacionais. Enquanto psicóloga e sexóloga, acredito que o que temos hoje enquanto material pornográfico disponível, deseduca, condiciona e desestimula a sexualidade saudável. A maioria dos meus pacientes trazem a queixa sexual, pautando-se em episódios pornográficos, levando a situações de ansiedade e depressão”, reforça a profissional Karina.

“Ela corrompe de uma forma ou de outra”, certifica João Vitor atualmente sobre a Indústria Pornográfica. “É uma esfera muito fechada e muito tóxica, que suprime quase todo grito de ajuda feito no meio processo. Consigo ver o quão é destrutivo para quem está produzindo, especificamente para quem é exposto, e não quem está por trás das câmeras. É só procurar e ouvir os próprios pronunciamentos de pessoas que estiveram nesse cenário e conseguiram escapar, ou de influenciadores foras do meio e que possuem conhecimento sobre o assunto. É de clara visão que não há final feliz na indústria”, reconhece.

Tratamento

Conforme Karina, para quem busca a “desintoxicação” do vício pornográfico, a maneira mais efetiva é a terapia. “O consultório é um local seguro, onde o terapeuta oferece uma escuta de qualidade, sem julgamentos ou castrações. Conversar sobre sexo e sexualidade e entender a diferença entre eles é vital para qualquer ser humano que deseja se entender e ter capital intelectual contra comportamentos compulsivos do pornô”, orienta.

A procrastinação de outras atividades cotidianas - realizar afazeres domésticos, acadêmicos ou sociais - para assistir e consumir esse material também merece atenção. Karina ainda alerta para a transformação do vício em doença. “A classificação como doença se dá quando há prejuízo social severo, ou seja, quando a pessoa começa a ficar antissocial, presa em casa para ter acesso ao conteúdo pornográfico. Para entrar nessa classificação, o indivíduo precisa estar vivendo nesse ciclo por mais de três meses, de forma concomitante”, reitera.

Para mais informações com a profissional Karina Brum, entre em contato pelo número 9 9212-8009, ou pelo pelo perfil no Instagram @karinabrumoficial. A psicóloga Carolina Valdes também está disponível pelo telefone 9 9290-5155.

No meio artístico

Além de Terry, outros artistas como Robert Downey Jr. e Charlie Sheen também já admitiram o vício. (Foto: Reprodução)

O ator Terry Crews, famoso em produções de comédia - como o filme As Branquelas e os seriados Todo Mundo Odeia o Chris e Brooklyn Nine-nine - já admitiu publicamente seu vício em pornografia desde os 12 anos de idade.

"A pornografia atrapalhou a minha vida de várias formas", diz. "Se o dia virou noite e você ainda está assistindo, você provavelmente tem um problema. E esse era eu,” afirmou o ator durante um vídeo em 2016 em suas redes sociais.

No audiolivro “Stronger Together”, Crews e sua esposa, a cantora Rebecca King Crews, dão mais detalhes sobre como o vício em pornografia de Terry criou uma crise no casamento de 30 anos, e que quase resultou no rompimento do casal.

O ator afirmou que o sucesso é o cenário perfeito para esconder esse consumo. “Tive tantas pessoas me dizendo que eu estava ótimo e não havia problema. E sabe de uma coisa? Hollywood não se importou. Ele ainda não se importa se você perder sua família; isso acontece todos os dias”, finaliza o ator durante entrevista para a Peopole Every Day.

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