
A celebração dos 126 anos de Campo Grande, no próximo dia 26, é marcada por histórias de quem escolheu a capital sul-mato-grossense para recomeçar. Comerciantes, estudantes e imigrantes que escolheram a cidade como lar ajudam a explicar por que a capital se tornou ponto de encontro de diferentes trajetórias, onde trabalho, estudo e acolhimento moldam sua identidade multicultural.

Na virada do século 20, comerciantes imigrantes, especialmente árabes, sírio-libaneses e japoneses, chegaram à região movidos pelo desejo de iniciar uma nova vida, fortalecendo o comércio local e consolidando a cidade como polo regional de trocas e serviços. O entrelaçamento dessas tradições criou uma cultura que se manifesta na gastronomia, no artesanato e na arquitetura da Cidade Morena, em que cada época deixou marcas visíveis de sua influência.
Foi assim com a família de Eduardo Thomaz, neto de José Thomaz, fundador do Thomaz Lanches. Originários do Líbano, seus antepassados fugiram da guerra e encontraram em Campo Grande um novo lar, onde reconstruíram suas vidas. A presença da comunidade sírio-libanesa e a receptividade dos campo-grandenses foram alguns dos fatores decisivos na escolha da cidade.
"Meu avô sempre disse que foi muito bem acolhido aqui. Ele costumava dizer que a cidade era uma 'ilha de árabes cercada por japoneses'. Justamente por isso ele tinha um carinho muito grande por Campo Grande e pelo país como um todo'', contou.
(De origem libanesa, José Thomaz veio para Campo Grande e transformou seu trabalho em uma das maiores lanchonetes locais - Foto: Jamille Gomes)
A força de vontade e a dedicação ao trabalho são pontos que segundo o empresário estão tão presentes na rotina dos campo-grandenses que já se tornaram um costume regional. ''É um povo que historicamente sempre teve muito gosto por trabalhar, talvez pelas origens japonesas e árabes. Se tornaram tradicionalmente um povo muito bravo, com muita força de vontade'', explicou Eduardo.
Para além das tradições, a paisagem urbana da capital revela o ritmo acelerado do seu desenvolvimento. O traçado da cidade guarda construções em estilo Art Déco e praças com diversos traços modernistas.
Entre os marcos mais conhecidos está o relógio da Rua 14 de Julho, referência de encontro para moradores durante décadas e que, após a revitalização do centro nos anos 2000, foi realocado para o canteiro da Avenida Afonso Pena, sendo considerado até hoje como símbolo das transformações urbanas da capital.
(O monumento Relógio Público Municipal, construído no canteiro central na esquina da Avenida Afonso Pena e Calógeras, é uma réplica do antigo relógio da Rua 14 de Julho - Foto: Divulgação)
A escolha de Campo Grande como capital de Mato Grosso do Sul
Quando o antigo estado de Mato Grosso foi dividido, em 1977, Campo Grande foi designada para assumir o papel de capital da nova unidade federativa. A decisão veio após estudos iniciados dois anos antes pelo governo federal, que buscava organizar a administração da região. Com isso, a cidade passou a concentrar as funções políticas e institucionais do então recente estado.
Muito antes dessa escolha, porém, Campo Grande já havia experimentado transformações importantes, como a chegada da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que impulsionou o desenvolvimento local e ampliou sua ligação com outras regiões. Ainda assim, mesmo diante das mudanças e do crescimento acelerado, a capital manteve hábitos interioranos, preservando tradições e um ritmo mais calmo que ajudam a tornar o cotidiano campo-grandense muito mais agradável.
(Fotografia com imagem da esplanada de Campo Grande, com vários vagões nos desvios. - Foto: Museu Ferroviário Regional de Bauru)
A chegada das universidades
A expansão do ensino superior também marcou uma nova etapa para Campo Grande. Há cerca de cinco décadas, os primeiros cursos de Pedagogia e Letras começaram a funcionar na UCDB, oferecendo às novas gerações oportunidades de formação que antes não existiam na região. Pouco tempo depois, a criação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul consolidou o acesso à educação superior pública, tornando a cidade um centro de conhecimento e de pesquisa. A presença dessas instituições transformou o cotidiano urbano, influenciando desde a economia local até a vida social da população.
Para muitos estudantes, a mudança trouxe não só aprendizado, mas também novas experiências de vida. “Do meu ponto de vista, a cidade oferece oportunidades mais amplas para quem busca crescimento acadêmico e profissional. Também existe uma variedade maior de cursos especializados e a chance de conviver com pessoas de diferentes origens e formas de pensar”, conta Giovana Iora, aluna de Ciências Contábeis da UCDB e nascida em Rio Verde.
A estudante Luana Passini, do interior de São Paulo, conta que estudar em Campo Grande transformou sua vida. “Viver longe da família exigiu força de vontade e coragem, mas também me fez amadurecer e valorizar cada conquista. O maior ganho tem sido a oportunidade de estudar em uma Universidade Federal, com acesso a professores e experiências que ampliam minha visão de mundo. A saudade de casa existe, mas virou combustível para seguir firme”, disse a estudante de Jornalismo da UFMS.
(Símbolo da UFMS, o paliteiro representa a transformação social e educacional trazida pela instituição desde sua fundação - Foto: Arquivo)
Geração de empregos
Campo Grande não é apenas destino dos mais jovens: eleita a maior geradora de empregos de Mato Grosso do Sul, a cidade tornou-se sinônimo de oportunidades para profissionais. No último semestre, mais de 70 mil pessoas tiveram a carteira assinada, com destaque para a área de Serviços (comércio, transporte, turismo), responsável por mais de 58% das vagas, seguida pela Construção Civil.
O maior fluxo de turistas e novos cidadãos têm tido um impacto considerável na economia e no dia a dia dos moradores, a criação de novos empreendimentos em regiões ainda pouco exploradas abre espaço para iniciativas como a de Graça Machado, que saiu de Juiz de Fora (MG) e construiu carreira na área gastronômica, com seu trailer Tapioca da Graça. “O povo de Campo Grande é muito aberto, sempre estão dispostos a conhecer coisas novas, gostam muito de variar, e isso para quem quer empreender é maravilhoso’’ contou a cozinheira, acrescentando ‘’Ainda existem muitas áreas mal aproveitadas na cidade, o que não falta são opções de investimentos”
(A busca de Graça por oportunidades se transformou em novos sabores para a Cidade Morena. - Foto: Maria Edite Vendas)
Ascensão de carreira
Campo Grande, tem ainda, se consolidado como um polo de oportunidades para profissionais em busca de crescimento. Com a economia em expansão, a cidade vem atraindo novos setores de serviços e o mercado financeiro não ficou de fora.
Para o gerente de investimentos, Levi Costa, de 46 anos, a mudança para a capital sul-mato-grossense foi decisiva. Natural da região Norte, ele conta que buscava há anos uma chance de assumir um cargo de maior responsabilidade. “No estado onde eu morava, as oportunidades eram mais limitadas. Aqui em Campo Grande encontrei um mercado em transformação”, relata. Levi hoje ocupa uma função de gerência em uma agência bancária da região central e avalia que a cidade oferece qualidade de vida e, ao mesmo tempo, possibilidades de evolução profissional.
A capital tem atraído profissionais de diferentes áreas, justamente pelo equilíbrio entre custo de vida acessível, abertura de novas vagas em setores estratégicos e a segurança em relação a outras capitais.
Nem só de trabalhos se faz a Capital
Além das oportunidades de trabalho, Campo Grande também se destaca pelo patrimônio cultural e pelas opções de lazer que atraem moradores e visitantes. A cidade reúne reunindo tradições sul-mato-grossenses com influências indígenas, paraguaias e pantaneiras, refletidas na culinária, festas populares e música regional. Entre os principais cartões-postais estão o Parque das Nações Indígenas, o Mercadão Municipal e a Feira Central, conhecida como Feirona, que garante diversão para moradores e visitantes.
