Feira de Vinhos COMPER Itanhanga
WALDIR BEIRA JUNIOR

"Sustentabilidade precisa estar integrada ao modelo de negócio"

Para o CEO da Ypê maior legado possível da COP-30 no Brasil será o aumento da consciência ambiental da população; segundo ele, empresas já estão fazendo sua parte

21 junho 2025 - 10h45Eduardo Geraque
Segundo Beira Junior, energia eólica será a principal fonte das fábricas da Ypê, devido à parceria com a Casa dos Ventos.
Segundo Beira Junior, energia eólica será a principal fonte das fábricas da Ypê, devido à parceria com a Casa dos Ventos. - Foto: Divulgação/Helton Nobrega

Qualquer relação com a natureza, hoje, precisa ser pensada em termos de sustentabilidade. Ainda mais quando a cadeia produtiva em questão envolve fábricas que retiram e devolvem água dos rios ou precisam de uma boa quantidade de energia para funcionar. Segundo Waldir Beira Junior, CEO da Ypê, desde a fundação do grupo, em 1950, na cidade de Amparo (SP), pelo pai dele, o meio ambiente esteve entre as prioridades da empresa. Tanto que o nome do grupo é uma alusão direta à árvore homônima.

Canal WhatsApp

Nesta entrevista ao Estadão, como parte da série especial A Era do Clima — Rumo à COP-30, o executivo detalha como as questões ambientais estão sendo tratadas no dia a dia da empresa. E, mais do que isso, segundo ele, sustentabilidade não pode ser apenas um diferencial, mas também precisa fechar a conta.

Leia os principais trechos da conversa, que pode ser assistida na íntegra acima, em vídeo.

A sustentabilidade é prioridade real ou ainda uma meta em construção dentro da Ypê?

Ela é uma prioridade absoluta e vem desde a fundação da empresa. Meu pai, Waldir Beira, fundador da Ypê, era apaixonado pela natureza — o próprio nome da empresa vem do ipê, símbolo nacional e árvore nativa da Mata Atlântica. Desde o início, essa paixão se traduziu em práticas sustentáveis. Muito antes de se falar em ESG, já cuidávamos de efluentes, processos industriais mais limpos e formulações menos agressivas. Hoje, temos produtos biodegradáveis, eliminamos o fosfato das fórmulas e reduzimos ingredientes fósseis, sempre buscando inovação e eficiência.

A preocupação ambiental está restrita às fábricas ou envolve também a cadeia produtiva de uma forma mais ampla?

Ela é ampla. Dentro das fábricas, a partir do ano que vem, 100% da energia consumida será de fontes renováveis. Fora delas, buscamos embalagens recicladas, desenvolvemos a linha vegana Ypê Green e temos parcerias, como com a Fundação SOS Mata Atlântica, com quem já plantamos mais de 1,2 milhão de árvores. Também apoiamos o programa Observando Rios, que monitora 112 rios em 17 Estados, e somos um dos maiores patrocinadores do Mãos para o Futuro, com 250 cooperativas que trabalham com reciclagem de plásticos no país. E 50% daquilo que usamos em embalagens hoje vêm de plástico reciclado. Só não é mais porque ainda não temos esse suprimento — a reciclagem, no Brasil, ainda não é capaz de dar conta de toda a demanda.

A energia renovável das fábricas virá de qual fonte?

Principalmente da eólica, com um grande projeto em parceria com a Casa dos Ventos, além de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e energia solar. Toda essa energia será contratada diretamente com as geradoras e injetada na rede.

Quais são os principais gargalos que existem hoje para que ocorra a ampliação da economia circular no Brasil?

O maior entrave é a coleta seletiva. A regulação existe, mas falta estrutura prática e, principalmente, conscientização da população. Quando vemos embalagens boiando nos rios, é porque foram descartadas de forma inadequada. É preciso criar valor econômico para os resíduos — algo que já começa a acontecer. O PET reciclado, por exemplo, muitas vezes custa mais do que o virgem, tamanha a demanda. Mas ainda não há volume suficiente para abastecer totalmente a indústria. A solução está na mobilização de todos: empresas, governo e cidadãos. Hoje, 100% das nossas embalagens são recicláveis e 50% são feitas com plástico reciclado. A limitação para o aumento da quantidade é de oferta, não de tecnologia.

A inovação tecnológica dos produtos, no caso da Ypê, é feita internamente ou em parcerias?

É um esforço híbrido. Nossa equipe interna define estratégias e conecta as possibilidades, mas temos parcerias com universidades, fornecedores e centros internacionais de tecnologia. Um exemplo: substituímos o detergente derivado de petróleo nas fórmulas de lava-roupas por bioenzimas, mantendo desempenho e custo competitivo. Esse tipo de inovação exige conhecimento químico, biológico e tecnológico, mas também visão econômica, porque nossos produtos precisam funcionar tão bem quanto os convencionais e custar o mesmo. É um desafio que temos conseguido superar.

A sustentabilidade fecha a conta?

Fecha, sim. Sustentabilidade não pode ser apenas um diferencial — ela precisa estar integrada ao modelo de negócio. Se não for sustentável, não dura. E esse é o nosso compromisso: oferecer desempenho, respeitar o meio ambiente e manter preços acessíveis. Tanto que estamos em 95% dos lares brasileiros. Isso mostra que o consumidor reconhece nosso valor e confia no que entregamos.

Além da sustentabilidade, quais são os maiores desafios do setor no Brasil hoje?

Logística. Estar presente em todos os municípios do Brasil exige um sistema de distribuição complexo, e a infraestrutura do país ainda é um gargalo. Utilizamos transporte rodoviário, ferroviário e cabotagem, mas ainda há limitações nesses dois últimos modais. Outro desafio é o poder de compra do consumidor, afetado por crises econômicas. Produtos de qualidade precisam ser acessíveis, e isso exige eficiência constante.

Qual é a expectativa da Ypê, enquanto uma engrenagem do setor privado, em relação à COP-30?

Muito positiva. O Brasil sediar a COP-30 o coloca como protagonista global. Acredito que o maior legado possível é o aumento da consciência ambiental da população. As empresas já estão fazendo sua parte. Mas é fundamental que as discussões da COP cheguem ao cidadão comum. A consciência gera mudança: nas escolhas de consumo, nos hábitos diários e até no voto. Porque, se pensarmos, o simples fato de estarmos vivos, respirando, estamos causando impacto ambiental. E aí, com todas as demais atividades, isso aumenta. O ser humano, por si só, na sua vida, produz impacto.

E o cidadão Waldir Beira Junior está otimista com um possível legado da COP-30 para a sociedade como um todo?

Estou, sim. Sem otimismo, não se empreende no Brasil. Espero que a COP leve mais brasileiros a entenderem seu papel no cuidado com o planeta: separar o lixo, escolher produtos sustentáveis, usar corretamente os recursos. E essa mudança individual movimenta empresas, governos e, no fim, transforma o mundo.

Assine a Newsletter
Banner Whatsapp Desktop