
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a agenda do Ministério da Fazenda “está dada” e que “não é razoável” imaginar que será possível aprovar grandes reformas no ano que vem, de eleições presidenciais.

Em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, Haddad foi questionado sobre a disposição do governo em discutir medidas estruturantes, como a revisão dos pisos constitucionais da saúde e da educação, para reduzir a pressão das despesas obrigatórias sobre o Orçamento, mas disse que o governo não está conseguindo aprovar nem projetos mais fáceis.
“Nós temos que ter uma conversa franca, porque dependo de voto. Não adianta você mandar uma coisa para o Congresso para ficar bem perante a Faria Lima e não ter noção de como as coisas vão se processar. A Fazenda nunca se indispôs a discutir nada”, disse o ministro.
Haddad sinalizou que a equipe econômica não deve enviar novas medidas de ajuste fiscal ao Congresso e garantiu que as propostas já divulgadas sobre elevação de receitas e contenção de despesas são suficientes para fechar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2026, que será enviado ao Congresso em 31 de agosto.
Veja abaixo os principais trechos da entrevista:
Nesta quarta-feira, 16, o sr. participou da reunião do presidente Lula com os bancos públicos. Vem uma nova medida de crédito por aí?
Não, não tem previsão nenhuma. Foi uma reunião de balanço. Ele (Lula) gosta de acompanhar a evolução das linhas de crédito que foram criadas, do impacto das medidas regulatórias sobre o crédito, o marco de garantia, o (programa) Acredita, os vários Desenrola. Então, ele acompanha e provoca muito debate. Por que o juro ainda está alto? O que está faltando para cair para o tomador final? O presidente, com justa razão, considera que as taxas praticadas pelos bancos públicos (no consignado privado) ainda são altas, sobretudo comparadas ao consignado do servidor público, do aposentado. Então, ele se preocupa com isso, porque ele sabe que isso pesa.
A Fazenda disse que vai mandar em agosto uma proposta para cortar benefícios tributários. Como vai ser esse corte?
Nós estamos com R$ 800 bilhões de renúncia fiscal. Nós temos ralo para todo lado, vazando dinheiro para todo lado. O 1% mais rico não paga sua justa parte. Então, nós estamos conversando com o deputado Aguinaldo Ribeiro, que foi encarregado pelo presidente (da Câmara dos Deputados) Hugo Motta (Republicanos-PB). Tem dois projetos tramitando nessa direção de parlamentares. Um de senador, Espiridião Amin (PP-SC), e um de deputado, o Mauro Benevides (PDT-CE). E o deputado Aguinaldo Ribeiro foi designado pelo presidente Hugo Motta para interagir com a Fazenda para chegar a um desenho.
A equipe econômica precisa de R$ 118 bilhões de receitas para fechar as contas do ano que vem. Vocês pretendem enviar novas propostas?
O que está tratado fecha a peça orçamentária.
Mesmo com o IOF sem o risco sacado? Ou seja, não é uma perda que vai ter necessariamente de ser recomposta de outra forma?
Nós estamos com a agenda dada. Nossa agenda é essa até o final do ano.
Mas o sr. também já falou que sente falta de discutir e rever questões mais estruturais como o piso de saúde e educação, até pela forma como o Orçamento brasileiro está engessado. O sr acha que ainda tem espaço?
Você está mexendo com duas áreas muito sensíveis, que têm demandas muito urgentes, sobretudo a saúde que é subfinanciada – lembrando que nós temos um sistema universal. Tem tanta coisa que precisa ser revista imediatamente que nós estamos negociando. Está lá o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) negociando com a (ministra da Gestão) Esther Dweck sobre a questão da reforma administrativa. Tem uma série de medidas de saneamento dos cadastros, de programas que estão com uma trajetória explosiva de gastos, que teve uma decisão recente agora do Conselho Nacional de Justiça disciplinando a matéria. Então, tudo isso tem que ser feito. Nós, com o apoio do PT e tudo mais, revimos a política de valorização do salário mínimo, mantendo ganhos reais acima da inflação, portanto, assim como do avanço salarial.
Mas o sr. acha que isso é suficiente para discutir o engessamento do Orçamento? Por que não discutir o índice de correção dos pisos de saúde e educação para que se adequem ao do arcabouço fiscal? O arcabouço fica de pé sem esse debate?
Ele fica de pé, mas veja bem: quando você não consegue aprovar o mais fácil, qual é a expectativa de conseguir aprovar o mais difícil? Nós não estamos conseguindo aprovar o mais fácil. Nós temos que ter uma conversa franca, porque dependo de voto. Não adianta você mandar uma coisa para lá (Congresso) para ficar bem perante a Faria Lima e não ter noção de como as coisas vão se processar. A Fazenda nunca se indispôs a discutir nada. Se falava que a reforma administrativa ia salvar o Brasil; está lá o deputado Pedro Paulo, vai apresentar a proposta. Vamos ver.
Vocês vão apoiar uma proposta de reforma administrativa?
Eu não conheço a proposta.
Neste ano e meio até o fim do governo Lula, o que o sr. quer entregar a mais?
Olha, no ano que vem, imaginar que nós vamos aprovar grandes reformas não é razoável. Essa agenda de medidas, parte das quais já está no Congresso, nós estamos empurrando. Tenho tratado com o deputado Hugo (Motta) e com o senador Davi (Alcolumbre) dessa agenda: a questão do PL (projeto de lei) da inteligência artificial; a questão do Redata, que é dos data centers, que está pronto mas a gente está discutindo com o Congresso qual a melhor maneira de fazer; a questão da Lei de Falências, que voltou para a mesa de negociação e pode ter uma solução; a garantia de Pix para crédito barato, que também está pronto para votar no Senado; a questão do devedor contumaz, que foi algo da última conversa que eu tive com o senador Davi Alcolumbre.
