
Em seu segundo mandato, o vereador Mário Cesar (PMDB) elegeu-se presidente da Câmara Municipal de Campo Grande após o seu partido perder a eleição que resultou na interrupção de um ciclo de mais de duas décadas de administração peemedebista na prefeitura da Capital.

O conturbado relacionamento com o prefeito Alcides Bernal, ação de despejo contra a Câmara e o quadro eleitoral em 2014 são alguns dos temas abordados por ele na entrevista da semana.
A Crítica – O Ministério Público Estadual instaurou Inquérito Civil Público para apurar possível omissão da Câmara Municipal na questão do remanejamento do orçamento, sem aprovação legislativa, pelo prefeito Alcides Bernal. O vereador Eliseu Dionísio, da CCJ, admitiu que ocorreu o remanejamento e admite até cassação de mandato do prefeito. Mas na prática, qual foi a providência tomada pela CM?
Mário Cesar – Desde que foi publicado o decreto em janeiro, mesmo estando em recesso, a Mesa da Câmara Municipal enviou ofício ao secretário Vanderley Ben-Hur externando o entendimento de que não houve suplementação, e sim remanejamento. Essa última hipótese não está vedada, mas exige autorização legislativa. O ofício foi enviado no dia 30 de janeiro e o secretário nos respondeu em 13 de fevereiro dizendo que não houve remanejamento e sim suplementação. E anexou alguns decretos de anos anteriores, como era uma prática de outros orçamentos. Com aquela prática, não haveria a vedação que existe hoje no orçamento. Não satisfeitos com essa resposta, encaminhamos no dia 14 de fevereiro ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas as respostas e os nossos considerandos, demonstrando que houve remanejamento sem autorização legislativa. Em síntese, não houve omissão da Câmara com relação a essa questão.
A Crítica – Bem, o Ministério Público instaurou um inquérito, a pedido da Câmara Municipal, que cumpriu o seu papel ao encaminhar a questão ao MP. Independente dessas ações, o que mais o Legislativo pode fazer com relação a esse problema?
Mário Cesar – Nós aprovamos um requerimento convocando tanto o secretário de Receita quanto o de Planejamento e Finanças, que são o Ben-Hur e o Gustavo Freire, respectivamente, para que viessem à Câmara explicar efetivamente essas ações. Sendo satisfatórias, estaríamos entendendo o posicionamento e, não sendo, aí sim ocorreriam os desdobramentos que o caso requer.
A Crítica – E aí houve a convocação dos dois secretários e apenas um deles compareceu. Depois disso, como ficou a situação?
Mário Cesar – A reunião com os vereadores ficou prejudicada. Vale lembrar que não se trata de audiência pública, mas sim de reunião com os vereadores. Um dos secretários enviou ofício informando que não iria comparecer alegando que aquele assunto não era pertinente a ele. Na realidade, como ele é titular de duas pastas cumulativamente – Relações Institucionais e de Receita – ele faria parte de qualquer tipo de assunto relacionado ao Executivo Municipal. Agora nós vamos fazer uma nova convocação para dar prosseguimento ao procedimento que foi interrompido por essa ausência. Hoje, nós recebemos do secretário Gustavo Freire ofício no qual ele se retrata e se coloca a disposição para a próxima convocação.
A Crítica – Por apenas uma assinatura a proposta de criação de uma CPI para apurar desvios no Hospital do Câncer não saiu do papel. Qual é a posição do vereador Mário Cesar, e não do presidente da Casa, a respeito da proposta de criação dessa comissão?
Mário Cesar – Como já vinha sendo feita uma investigação pela Polícia Federal e Ministério Público desde o ano de 2009, entendemos que o inquérito já está bastante avançado. Quando veio à tona a possibilidade de a Câmara de Vereadores instalar uma CPI, a pergunta que fizemos foi a seguinte: qual seria a nossa contribuição nesse processo? Se instalássemos a comissão teríamos que pedir auxílio à PF e ao MP, que são os órgãos que possuem as informações. Como as investigações já estão terminando e nós não colocaríamos nem uma cereja neste bolo, entendemos que perdemos o “time” da CPI. Vislumbramos ser necessária a mobilização da Comissão de Saúde da Casa para que tomasse pé desse assunto, uma vez que as pessoas envolvidas no problema já foram afastadas da direção do Hospital do Câncer. Já foi criado um novo Conselho, que está encaminhando a questão. Caso criássemos uma CPI, iríamos inclusive atravancar os convênios, justamente no instante em que mais de 600 pessoas pararam de doar recursos ao hospital em função do escândalo. Iríamos apenas aumentar o clima de desconfiança. Dessa forma, entendemos que essa politização, nesse momento, só iria atrapalhar as investigações e, quem sabe, até atravancar os convênios federais para o Hospital do Câncer. Nesse viés de entendimento é que nós não instalamos a CPI e sim uma comissão mista para acompanhar os desdobramentos, que estão em sua fase final.
A Crítica – Essa CPI não poderia atingir outros hospitais? Ou era específica para o Hospital do Câncer?
Mário Cesar – A proposta inicial, a bandeira inicial, era o Hospital do Câncer, que ficou em voga por conta de todo o acontecido. E aí sim um desdobramento maior com relação à saúde como um todo. Mas como o requerimento foi protocolizado com o viés do Hospital do Câncer, entendemos que dentro desse sentido não iríamos acrescentar nada, mas apenas participar para ver os desdobramentos das investigações do MP e da PF.
A Crítica – De acordo com decisão judicial, em maio a Associação Beneficente de Campo Grande voltará a administrar a Santa Casa. No entanto, nenhuma comissão de transição foi ainda criada. A Câmara Municipal, devido à relevância da questão, não deveria estar discutindo essa situação?
Mário Cesar – É bem verdade que tendo em vista esse assunto relacionado ao Hospital do Câncer aqui na Câmara Municipal, vamos dizer assim, o alerta acendeu para tudo. Até porque se ventilou alguma coisa com relação ao Hospital Universitário e essa questão da Santa Casa realmente vem se alongando há algum tempo. A Comissão de Saúde já se reuniu para ver de que maneira vamos nos posicionar com relação a isso, de que maneira vamos agir, justamente para poder sair na frente para poder tomar as atitudes necessárias.
A Crítica – Até o momento o município, segundo os diretores da ABCG, dona do hospital, não procurou ninguém para discutir a transição. E a devolução, por determinação judicial, vai ocorrer em maio.
Mário Cesar – É verdade. Por isso temos que tomar conhecimento para podermos, dessa vez, sair na frente.
A Crítica – Na campanha eleitoral, tomando como base o orçamento do município, os então candidatos Reinaldo Azambuja, Vander Loubet e Alcides Bernal fizeram críticas ferrenhas ao ex-prefeito Nelson Trad Filho ao argumentarem que a saúde estava mal mesmo com recursos da ordem de R$ 2 milhões por dia para o setor. Esses mesmos 2 milhões, por dia, continuam disponíveis e a saúde continua mal na Capital. Na sua opinião, o prefeito não está sabendo administrar esse dinheiro todo?
Mário Cesar – Embora a saúde seja um problema crônico no Brasil, Campo Grande era um dos municípios menos piores nos índices nacionais com relação ao atendimento em saúde. Na minha concepção, houve uma demora do prefeito eleito de se assenhorar realmente dos problemas da saúde na época da transição. Ele deveria ter iniciado o seu mandato com toda a sua equipe formada, com toda a sua gestão preparada para os enfrentamentos. Se formos levantar a questão do vetor da dengue, por exemplo, o mosquito não nasceu no dia 1° de janeiro. A epidemia hoje verificada é o resultado de um processo. É por isso que existe equipe de transição, processo de transição, para que o novo prefeito possa se colocar a par de todos os assuntos sobre o que está programando aquele prefeito que está saindo, para que quem estiver entrando possa criar as condições para implementar o seu método administrativo já no primeiro dia de mandato. Com essa verba que nós temos na saúde, poderíamos realmente promover a diminuição desse trauma. Para resolver de forma eficaz o problema da saúde, acredito que temos um bom tempo pela frente para alcançar esse objetivo.
A Crítica – Poderíamos então concluir que aos assumir a prefeitura o prefeito se deu conta de que na prática a teoria é outra? Que ter 2 milhões por dia é diferente do que saber administrar esses 2 milhões por dia?
Mário Cesar – Sim, são coisas completamente diferentes, até porque as promessas de campanha, de acabar com o problema das consultas, que essas poderiam ser feitas nas farmácias, para acabar com as filas, não foram implementadas. Nós temos visitado algumas Unidades Básicas de Saúde e percebemos que os problemas continuam sendo os mesmos. É bem verdade que ele teve um enfrentamento com relação à dengue de maneira muito grande, mas os problemas pontuais com a saúde continuam os mesmos e o dinheiro gasto continua sendo o mesmo. Não vejo eficiência entre aquilo que se falava e na prática propriamente dita.
A Crítica – O prefeito Alcides Bernal vive dizendo que é uma vergonha o fato de a Câmara Municipal estar sob o risco de ter de abandonar o prédio onde está instalada. No entanto, de prático até o momento nenhuma providência foi tomada por ele e o tempo está passando. Já existe alguma perspectiva quanto à solução desse problema?
Mário Cesar – Olha, esse é um problema que vem se alongando desde o ano de 2000. É importante ressaltar que quem criou todo esse imbróglio foi o Ministério Público, quando achou abusivo o valor do aluguel àquela época. Naquela ocasião, a prefeitura, a Câmara e os proprietários do prédio estavam envolvidos como partes no processo. O Judiciário entendeu que como a Câmara não possui personalidade jurídica, esta foi excluída da ação movida pelo Ministério Publico. Permaneceram como réus a prefeitura e os donos do imóvel. Um tempo depois perdeu-se o objeto da ação, pois não havia nada de contrário ao contrato de aluguel firmado em 2000. Nessa ocasião, os dois (prefeitura e donos do imóvel) passaram a ser autores e réus no processo, um contra o outro, com o acompanhamento do Ministério Público. Findou-se o contrato em 2005. Não existe renovação automática de contrato com o poder público, têm de serem respeitadas as formalidades, publicar em Diário Oficial, por exemplo, e isso não houve. Sendo assim, a Câmara permaneceu no mesmo prédio. Mesmo porque esse imóvel foi construído com características de interesse público. Não era um prédio que adaptamos. Ele foi construído para ser Câmara de Vereadores. Isso já foi pensado quando foi feita a proposta, em licitação, lá atrás. Permanecemos aqui na Câmara de Vereadores. Esse imbróglio de 2005 e 2006 não foi resolvido juridicamente.
A Crítica – Nesse meio tempo, que atitude tomou a Mesa da Câmara?
Mário Cesar – A Câmara propôs uma lei para transformar esse prédio para efeitos de desapropriação por utilidade pública. Em 2008, o prefeito Nelsinho Trad sancionou a lei, elaborada em dezembro do ano anterior. No mesmo ano ele deu início ao processo administrativo para a desapropriação. E aí parou tudo. Em 2010, não havendo acordo para uma desapropriação consensual, os proprietários entraram com uma ação de despejo contra a Câmara de Vereadores. Hoje, a situação é a seguinte: o despejo foi deflagrado em fevereiro. Pedimos uma sobrevida à Justiça para tentar resolver essa situação porque tanto eu quanto o Bernal assumimos em janeiro. Ganhamos seis meses, mas já se passou um mês da decisão, restando apenas cinco, e de prático nenhuma iniciativa foi tomada com relação a isso.
A Crítica – Durante anos a Câmara devolveu à prefeitura sobras do duodécimo e nem sequer a consignação de algum valor, em juízo, foi feito, mesmo todos sabendo, de antemão, que a dívida um dia teria que ser paga. Não foi uma irresponsabilidade dos ex-presidentes?
Mário Cesar – É uma questão de entendimento. Não posso afirmar se foi irresponsabilidade ou não. O que posso dizer é que a Câmara fez a parte dela. Desde 2005 até dezembro de 2012 a Câmara vem devolvendo duodécimo ao Executivo. E esse dinheiro foi devolvido para ele poder fazer o investimento que quiser, o gasto que quiser. E como havia um imbróglio jurídico, os advogados – e é por isso que existem diversos entendimentos jurídicos – entendiam que não era necessário fazer nenhum depósito, nenhum pagamento, até porque isso seria discutido de uma outra maneira. Como estava se alongando essa discussão, se houve irresponsabilidade ela foi das duas partes. Tanto do Poder Executivo quanto dos donos do prédio. É uma tese que levantei. Eu jamais ficaria em imóvel seu um mês sem pagar aluguel. Você reclamaria. Dois meses sem pagar, você reclamaria mais ainda. Em três meses você iria me tirar de lá. Você não iria brigar comigo somente após 60 meses. Portanto, os proprietários do imóvel são coniventes com esse imbróglio todo, são coniventes com essa dívida porque depois de cinco anos é que eles entraram com a ação de despejo. Isso tem que ser deixado muito bem claro porque a irresponsabilidade foi dos dois lados. A única coisa que posso esclarecer é que a Câmara fez o seu dever de casa, devolveu dinheiro para a prefeitura e todos os vereadores eram sabedores desse imbróglio, inclusive o atual prefeito, que foi vereador de 2005 a 2008 e depois em 2009 e 2010. O prefeito atual, portanto, tem conhecimento de tudo isso e sabia que a Câmara estava fazendo a parte dela.
A Crítica – Dizendo-se injustiçados, os vereadores da base de sustentação ao prefeito abandonaram a sessão na qual foram escolhidos os membros das comissões permanentes da Casa. Foi uma decisão inteligente?
Mário Cesar – Primeiro que eles não abandonaram tão somente a sessão. Nós fizemos uma composição no dia anterior. Fiz uma reunião com os líderes dos partidos. Fizemos uma composição com as 14 comissões permanentes. Com acordo de lideranças, das 14 comissões permanentes nove foram resolvidas, restando apenas cinco a serem definidas. Destas cinco, a mais importante, a Comissão de Constituição e Justiça, com cinco vagas, tinha 11 postulantes. Das outras quatro, também com cinco vagas, havia seis postulantes, ou seja, de fácil solução. Dava para acomodar e nós poderíamos ir ao plenário para disputar o voto tão somente com relação à CCJ. No dia seguinte à reunião, o líder do prefeito entendeu, por conta própria, que essa composição, mesmo feita com todas as lideranças partidárias, não estava a contento com relação à base do prefeito. Nesse desacordo, a sua orientação foi a de que os vereadores da base saíssem das comissões. Eu solicitei que eles verbalizassem isso, pois não foi uma decisão nossa, não patrolamos ninguém, de maneira alguma. Então, se eles se sentiram prejudicados na composição, como já havia dito, bem encaminhada, das 14 nove resolvidas, quatro de fácil resolução e apenas uma a ser disputada, que era a CCJ, eles verbalizaram isso. PSDB: não quero participar das comissões. PPS: não quero participar das comissões. E assim foi com o PP, PRB e PT. Ou seja, houve verbalização em plenário.
A Crítica – A existência de terrenos baldios tomados pelo mato e abandonados pelos seus proprietários é um dos motivos que levaram à epidemia de dengue registrada nos últimos anos. Além de tentar conscientizar a população, o poder público não deveria tomar medidas mais enérgicas contra esse tipo de contribuinte que contribui coma proliferação do mosquito transmissor a doença?
Mário Cesar – Bem, nós temos os nossos mecanismos, que são as notificações e autos de infração com relação à limpeza dos terrenos. É bem verdade que as multas vão sendo lançadas mas a solução pontual, que é a limpeza dos terrenos, não é alcançada. Está tramitando na Casa um projeto de lei de minha autoria que estabelece, além das multas, que a prefeitura possa entrar nos terrenos, fazer a limpeza e cobrar os proprietários pelo serviço. É uma medida talvez drástica, mas ela tem o seu fim, que é realmente evitar a proliferação não somente do vetor da dengue como também da leishmaniose e de qualquer outro inseto transmissor de doenças. É bem verdade, também, que existem prédios públicos e áreas públicas nessa mesma concepção. Então, para que essa lei possa ter uma eficácia plena, o poder público tem de fazer o seu dever de casa. É esse o encaminhamento que estamos dando.
A Crítica – Então a Câmara tem que cobrar da prefeitura uma atitude com relação a isso.
Mário Cesar – A Câmara está cobrando da prefeitura. É que nesse sentido, nós, munícipes, somos coagidos pela sanção. Já o poder público é com pedidos, com a intervenção política. Não há sanção para o poder público.
A Crítica – O quadro eleitoral que se avizinha mostra a possibilidade de três candidatos estarem na disputa pelo governo. Na sua opinião, qual é a possibilidade mais forte: o PMDB se aliar ao PT ou voltar a caminhar junto com o PSDB?
Mário Cesar – Na minha leitura, analisando até o governo federal, a tendência é uma composição do PMDB com o PT. Essa é a tendência. Mas eu acredito, por questões regionais, como a gente trabalha sempre o Brasil como um País de proporções continentais, existem as questões regionais pontuadas. Eu acredito que o PMDB venha com candidato próprio. Acredito que devam acontecer no mínimo três candidaturas ao governo nas eleições de 2014.
A Crítica – O vereador Mário Cesar tenta alçar vôos mais altos em 2014?
Mário Cesar – Eu gostaria muito de alçar novo vôo e poder dar a minha contribuição ao Estado de Mato Grosso do Sul assim como estou dando a minha contribuição para Campo Grande.
A Crítica – Deputado estadual?
Mário Cesar – É. Um passo de cada vez, né?
