
A proposta que promete permitir que brasileiros tirem a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) sem a obrigatoriedade de frequentar autoescolas está pronta, mas ainda não foi oficialmente anunciada. O Ministério dos Transportes afirma que pretende publicar a nova regra ainda em novembro, mas o avanço depende da resolução de pontos técnicos e jurídicos considerados sensíveis pelo governo e por órgãos de trânsito.
A medida vem sendo construída com o apoio da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) e prevê mudanças importantes no processo de formação dos condutores. Com o novo modelo, o cidadão poderá se preparar para as provas por conta própria ou com a ajuda de instrutores autônomos, desde que credenciados pelos Detrans. A intenção é reduzir o custo total da CNH — hoje em média R$ 3.200 — em até 80%.
No entanto, a simplificação do processo exige ajustes legais, padronização entre os estados e definição clara sobre o que será exigido dos candidatos. A seguir, os principais obstáculos que ainda impedem o anúncio da medida.
1. Carga mínima de aulas práticas ainda indefinida
Um dos pontos mais sensíveis da proposta é a quantidade mínima de aulas práticas que continuará obrigatória. Atualmente, o Código de Trânsito Brasileiro exige 20 horas de prática em autoescola para candidatos à primeira habilitação na categoria B. O governo estuda reduzir esse número de forma significativa — cogita-se um modelo com apenas duas a cinco aulas obrigatórias —, mas ainda não há consenso técnico nem jurídico sobre qual seria a carga mínima segura.
Especialistas alertam que, sem um número mínimo bem definido, a medida pode ser questionada judicialmente por comprometer a segurança viária.
2. Falta de regulamentação para instrutores autônomos
A proposta também prevê que os candidatos possam optar por contratar instrutores autônomos, que atuariam fora dos Centros de Formação de Condutores (CFCs). No entanto, os critérios para credenciamento, fiscalização e padronização desses profissionais ainda não foram estabelecidos.
A ausência de uma regulamentação clara para os instrutores pode gerar insegurança jurídica e dificultar a implementação da medida nos estados. O governo ainda discute se a Senatran terá um papel direto na fiscalização ou se essa função ficará a cargo de cada Detran.
3. Formato do curso teórico precisa ser definido
Outra indefinição importante é o modelo de ensino teórico. A medida estuda liberar os candidatos da frequência presencial em aulas, permitindo o estudo por meio de apostilas, plataformas digitais ou ensino a distância (EAD). Porém, ainda não há definição sobre quais formatos serão aceitos oficialmente e como será feita a validação do aprendizado antes da prova teórica.
Além disso, será necessário garantir que todos os candidatos, inclusive os de regiões com baixa conectividade, tenham acesso adequado ao conteúdo e suporte educacional.
4. Avaliação e padronização do processo nos Detrans
Como a habilitação é emitida pelos Detrans de cada estado, será necessário que todos eles se adequem ao novo modelo. Isso envolve ajustes nos sistemas de inscrição, nos critérios de avaliação, na supervisão dos instrutores autônomos e na logística dos exames.
A Senatran trabalha para padronizar o processo em nível nacional, mas esse alinhamento entre os estados pode levar tempo e atrasar o anúncio formal da medida.
5. Reação das autoescolas e possível judicialização
O setor de autoescolas é contra a proposta e já articula formas de barrar a nova regra. Entidades como a Federação Nacional das Autoescolas (Feneauto) alegam que a medida enfraquece o modelo de formação estruturada e pode comprometer a segurança no trânsito. Há a possibilidade de ações judiciais caso a portaria seja publicada sem diálogo mais amplo com o setor.
Esse risco político e judicial tem feito o governo adotar cautela no anúncio da medida. Internamente, teme-se que uma judicialização logo após a publicação possa travar a implementação em vários estados.
6. Portaria ainda depende de reunião do Contran
Para que a medida entre oficialmente em vigor, ela precisa ser formalizada por meio de uma portaria do Ministério dos Transportes e referendada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran). A expectativa é que essa reunião ocorra até o final de novembro, mas ainda não há data confirmada.
Sem a aprovação do Contran, a medida não pode ser publicada, mesmo que já esteja tecnicamente pronta.
Caminho está aberto, mas falta sinal verde - O governo já tem o texto praticamente finalizado, e a intenção é facilitar o acesso à CNH para milhões de brasileiros que hoje não conseguem pagar pelos serviços tradicionais. A proposta não extingue as autoescolas, mas oferece uma alternativa mais acessível e flexível, sem abrir mão das provas obrigatórias.
Apesar do avanço, os obstáculos listados — técnicos, legais e políticos — ainda precisam ser superados para que a medida possa ser oficialmente anunciada e implementada. Se esses pontos forem resolvidos, a mudança pode representar uma das maiores transformações no processo de habilitação no Brasil nas últimas décadas.

