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15 de outubro de 2025 - 14h27
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SAÚDE

Uso de remédios para foco e memória cresce entre jovens e preocupa especialistas; conheça os riscos

Medicamentos para TDAH e narcolepsia vêm sendo usados sem prescrição por quem busca mais desempenho

15 outubro 2025 - 11h40Redação E+
Uso de smart drugs pode criar um ciclo de falsa produtividade, diz psiquiatra
Uso de smart drugs pode criar um ciclo de falsa produtividade, diz psiquiatra - Foto: Nazar/Adobe Stock

A promessa de pílulas que aumentam concentração, foco e produtividade tem atraído cada vez mais adeptos, especialmente entre estudantes e profissionais sob alta pressão. Substâncias originalmente criadas para tratar distúrbios como TDAH e narcolepsia estão sendo consumidas sem indicação médica por pessoas saudáveis que buscam melhor desempenho mental. O fenômeno é crescente e acende um alerta entre médicos e pesquisadores.

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Entre os remédios mais utilizados estão o metilfenidato (Ritalina, Concerta), a lisdexanfetamina (Venvanse) e a modafinila (Provigil). Também entram nessa lista suplementos como cafeína, ginseng e creatina, além de nootrópicos e ansiolíticos usados fora do contexto clínico.

O uso dessas chamadas smart drugs foi impulsionado durante a pandemia. Um estudo no Reino Unido com estudantes e funcionários de universidades revelou aumento de 42% no uso de modafinila e 30% no consumo de nutracêuticos em doses elevadas. No Brasil, uma pesquisa com universitários apontou que quase 6% já usaram metilfenidato para fins cognitivos, e 41% relataram o uso recente da substância.

Poucos ganhos, muitos riscos

Embora alguns usuários relatem se sentir mais produtivos, os estudos mostram que os efeitos dessas drogas em pessoas saudáveis são limitados. “Esses medicamentos podem até trazer algum benefício momentâneo, mas os efeitos são discretos e temporários”, afirma o psiquiatra Luiz Zoldan, do Hospital Albert Einstein.

A neurocientista Barbara Sahakian, da Universidade de Cambridge, chegou a testar a modafinila em estudos clínicos. Ela identificou melhora leve na flexibilidade cognitiva e no prazer em realizar tarefas, mas ressalta que os resultados ainda são modestos e longe de justificar o uso indiscriminado.

Mais preocupante são os efeitos colaterais. O uso sem prescrição pode causar insônia, ansiedade, aumento da pressão arterial, arritmias, perda de apetite e até sintomas psicóticos, especialmente em adolescentes. Em longo prazo, os riscos incluem dependência, prejuízos ao sono, piora de quadros depressivos e danos cardiovasculares.

“Em muitos casos, o que essas drogas oferecem não é mais foco, mas maior tolerância à tarefa”, explica o neurologista Fabiano Moulin, da Unifesp. Segundo ele, a dopamina liberada pelas substâncias melhora o engajamento momentâneo, mas não necessariamente o desempenho real.

Cultura da performance e falsa produtividade

O uso das smart drugs também levanta questões sociais. Há uma pressão crescente por produtividade, e as pílulas surgem como uma resposta rápida, mas insustentável, a esse cenário. Para Zoldan, vivemos na chamada sociedade do cansaço, em que o esgotamento é mascarado por soluções que prometem prolongar a eficiência.

Essa busca por mais rendimento pode camuflar sinais de burnout e comprometer a saúde mental. Os sintomas do abuso de estimulantes, como fadiga extrema, insônia e ansiedade, são facilmente confundidos com os de exaustão profissional.

Além disso, há um dilema ético em relação à equidade. Quem tem acesso às substâncias pode sair em vantagem em ambientes competitivos, como vestibulares ou processos seletivos. Sahakian alerta para a necessidade de regulamentação e debate público sobre os limites do uso cognitivo de medicamentos.

O caminho seguro ainda é o mais simples

A linha entre tratar um problema real e buscar um “upgrade” artificial é cada vez mais tênue. O mesmo remédio pode ser considerado tratamento ou aprimoramento dependendo do contexto, como ocorre com trabalhadores noturnos ou pessoas que sofrem com jet lag. Nos Estados Unidos, por exemplo, a modafinila é liberada para profissionais em turnos alternados. No Reino Unido, não.

Essa indefinição sobre o que é terapêutico e o que é melhoramento torna a regulação difícil e abre brechas para desigualdades. Enquanto isso, cresce o número de pessoas que obtêm esses medicamentos por vias alternativas, seja online ou por meio de amigos com prescrição.

Embora as smart drugs sejam tentadoras, os especialistas reforçam que os meios mais eficazes para preservar o cérebro seguem sendo os métodos clássicos: sono de qualidade, alimentação equilibrada, prática de exercícios físicos e redução do estresse.

“Se o objetivo é realmente melhorar o desempenho, é preciso apostar em hábitos sustentáveis e não em atalhos que podem cobrar um preço alto no futuro”, conclui Zoldan.

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